Atos contra o fascismo e o nazismo em SC mobilizam lideranças nacionais e artistas

Foto: Thiago Skárnio

Por Raul Fitipaldi, para Desacato.info.

A última sexta-feira e o sábado mobilizaram lideranças nacionais e locais na defesa dos valores democráticos, tanto na política como no ambiente cultural. O primeiro, na sexta-feira (10), foi um ato com lideranças políticas e movimentos sociais. Houve um encontro virtual realizado pelo Comitê Popular de Luta do Campeche (sul da capital catarinense) e pela Cooperativa Comunicacional Sul, com o Apoio do Movimento Humaniza Santa Catarina, transmitido pelo Portal Desacato na edição de sexta do JTT (assistir vídeo abaixo do texto). O segundo ato, sábado (11), aconteceu no Largo da Catedral, centro de Florianópolis, e reuniu artistas, produtores e produtoras culturais do estado.

Os dois atos são consequência das ideias retrógradas, excludentes e violentas que instalou o bolsonarismo no Brasil e das quais será muito difícil se livrar em um futuro próximo. O ato com as lideranças políticas e sociais foi um evento de desagravo à vereadora Maria Tereza Capra (PT), cassada de forma sumária pela câmara conservadora de vereadores da cidade de São Miguel do Oeste, no extremo oeste catarinense, assunto já muito noticiado neste espaço e na imprensa nacional. O ato com os protagonistas da cultura de Santa Catarina, representou o repúdio da classe artística à escolha de Rafael Nogueira como presidente da Fundação Catarinense de Cultura.

De ambos atos se desprendem alguns conceitos que vamos dividir com vocês, começando pelo evento virtual de desagravo. Como ficou claro através das intervenções, não só houve firme apoio à vereadora Capra pela cassação absurda, mas também de apoio a outras parlamentares ameaçadas por elementos reacionários: Carla Ayres (PT) de Florianópolis, Giovana Mondardo (PCdoB) de Criciúma, Marlina Oliveira (PT) de Brusque e Ana Lúcia Martins (PT) de Joinville, e ao presidente estadual do PDT, Manoel Dias.

Há uma convicção, expressada pelos participantes, de que estamos diante de uma luta que travam a democracia e os direitos humanos contra o nazifascismo crescente no estado e no Brasil, como documentou a pesquisadora Adriana Dias, falecida dias atrás vítima de câncer no cérebro. E não é uma convicção ligeira. De fato, o governo de Bolsonaro, mesmo derrotado nas urnas, tem milhares de seguidores espalhados, especialmente pelo centro-oeste e o sul do país, muito enfaticamente em Santa Catarina. Nem todos escondidos no anonimato, nas sombras dos CACs, universidades, fazendas, empresas de transporte. Boa parte deles ocupam cargos públicos em governos estaduais, federais e municipais. E essa parte não faz questão de ocultar seu ideário violento, antidemocrático e perverso.

O Brasil tem um problema histórico que, de um modo ou outro, já foi resolvido nos países vizinhos: a não punição aos agentes da ditadura. A anistia oferecida no Brasil permitiu que os protagonistas dos crimes mais atrozes, tanto contra a pessoa física quanto contra a democracia, ficassem impunes, mais ainda, que as ideias permanecessem vigentes nos armários mais tenebrosos da sociedade. O Bolsonarismo deu bandeira verde ao mais sórdido da sociedade e isso pululou por todas as esferas da engrenagem pública e privada do país. Acrescido a isso, um mundo de fantasias violentas se espalhou pela internet e por espaços dominados pela caterva fascista. É por isso que tantas pessoas são contrárias a qualquer tipo de anistia para o criminosos que atuaram contra a democracia em 8 de janeiro e contra os covardes que ameaçam às vereadoras, com as formas mais repugnantes de ódio, machismo, racismo e lgbtfobia. Os contrários à anistia querem, razoavelmente, produzir o escarmento necessário e amparado na lei que desanime às aventuras contra o país e as pessoas que pensam diferente.

Não é raro, no caso das ameaças às vereadoras e da cassação sumária a Maria Tereza Capra, que as agressões, com exceção de uma, ao presidente estadual do PDT, sejam dirigidas a mulheres, negras, e uma delas, do movimento LGBTIQ+. A violência fascista tem na mira esses segmentos. Não suporta mulheres com algum poder, mesmo que seja o resultado do processo eleitoral. O processo democrático não tem nenhum valor para o fascismo, o que vale é a imposição nua e crua, especialmente encima do diferente e mais vulnerável, que está fora do seu âmbito de privilégio, majoritariamente branco, machista, patriarcal e violento.

As declarações de todos e todas as participantes no evento de desagravo a Maria T. Capra deixaram muito claro que se faz necessário dar dura luta a esse miasma que, lamentavelmente, tinge nosso estado de sangue e terror. Impossível esquecer que em um clima desses o feminicídio cresce assustadoramente em Santa Catarina. Também as agressões de diversos tipos à comunidade quilombola, indígena e LGBTQI+, e à própria natureza, sua fauna e sua flora. O surto nazi-fascista é produto de um vírus ideológico que deve ser desativado, seja onde for que ele estiver inoculado, na esfera pública ou privada. O nazismo e o fascismo alteram a vida da sociedade de forma determinante e, pela sua infecção, matam.

Nesse cenário, o papel da educação e da cultura é arma fundamental nessa guerra cotidiana contra a violência, a desigualdade e o maltrato social ao qual estão expostos, especialmente, os segmentos da sociedade já mencionados. Mas, o governo bolsonarista de Jorginho Mello começou mal, muito mal, nomeando alguém que não só não conhece a cultura local, quanto que zomba dela e das expressões culturais populares do Brasil. Trata-se de Rafael Nogueira, presidente nomeado por Mello para conduzir a Fundação Catarinense de Cultura. A resposta não se fez esperar, o setor rejeitou de imediato a nomeação e foi para a rua.

Sobre esse ato do último sábado recuperamos umas linhas do escritor, dramaturgo e apresentador, Marco Vasques, cujo artigo na íntegra se acessa no link: https://desacato.info/cultura-catarinense-manifesta-contra-rafael-nogueira/. Afirma Vasques:

Rafael Nogueira não é apenas um nome. Rafael Nogueira não está sendo combatido porque não pertence ao nosso território. Isso cairia numa xenofobia grosseira e sem sentido. Num momento em que o mundo vive em trânsito triste e desesperador, usar de xenofobia, como alguns jornalistas do estado têm feito para questionar a nomeação de Rafael Nogueira à presidência da Fundação Catarinense de Cultura, é, no mínimo, se igualar às ideias torturadoras do nosso oponente. Então, afinal, por que estamos contra Rafael Nogueira?

Porque ele é discípulo de Olavo de Carvalho e bolsonarista ardoroso, portanto, mais um fascista confesso. Ele carrega consigo o hálito podre dos fascistas. E na esteira desse cheiro pútrido traz consigo o ódio ao setor cultural (já manifesto publicamente em suas mídias sociais), a misoginia, a homofobia, a gordofobia, o racismo e o trator da perseguição ideológica em seus mais variados matizes. O setor cultural vem sendo massacrado e criminalizado nos últimos anos. Assim que se instaurou o golpe jurídico-parlamentar, em 2016, nossas vidas e nossas profissões foram atacadas, massacradas, saqueadas e difamadas ao ponto de aquele tiozinho da esquina, que nunca leu uma linha sobre políticas públicas, se alçar ao direito de difamar artistas, chamando-os de bandidos e “mamadores” da Lei Rouanet. Aliás, lei criada por um governo de direita e neoliberal.

Além de demostrar, tal como em São Paulo, para citar um governo de visibilidade nacional, que é necessário manter o emprego bem remunerado dos serviçais ao governo Bolsonaro, e para isso todos os cabides se meneiam disciplinadamente nos governos subordinados ao capitão, Jorginho Mello teve requintes de crueldade na sua imposição. Juntou o que há de pior na incubadora bolsonarista: olavismo de primeira magnitude, asco pelo popular, exclusão como sistema e também ignorância do que acontece na área cultural catarinense.

O conveniente para o próprio governador, estreante nas lides de conduzir o estado, seria ligar para a deputada Ana Caroline Campagnolo (PL) e dizer que seu indicado, Rafael Nogueira, ficou travado no funil do setor e que não passa pelo crivo. Acontece que Campagnolo é Bolsonaro na província. Com apenas 32 anos, um segundo mandato consecutivo e sendo a deputada mais votada, de longe, no estado, Campagnolo faz o que ela bem entender, como seu mandato deixa bem claro. É uma questão ideológica e da arquitetura bolsonarista, não de cunho técnico ou profissional. Nogueira é amigo do rei, e a consulesa do bolsonarismo será difícil que abra mão. Os argumentos infaustos de boa parte da mídia, contrária à sua nomeação, inclusive, tendem a tornar Nogueira vítima da xenofobia tal qual salienta Vasques.

Se observamos com detalhe o caso das vereadoras e especialmente a cassação de Capra, é paralelo ao caso da FCC. Os bolsonaristas, como se diz no jargão popular, chegam chegando, mostrando a que vieram e o que estão dispostos a fazer. É melhor que os setores democráticos, dos direitos humanos e da cultura arregacem as mangas e se preparem para uma dura luta que, eleitoralmente, tem os próximos rounds em 2024 e 2026. Ou vence a democracia ou vence o nazi-fazismo, os dois não entram na mesma embalagem. E que ninguém diga de novo que não foi avisado.

Edição e Publicação: Tali Feld Gleiser

Raul Fitipaldi é jornalista e cofundador do Portal Desacato e da Cooperativa Comunicacional Sul.

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