Apelo às Nações Unidas: PL 2903 ameaça os territórios, destrói os direitos fundamentais e humanos dos povos indígenas, no Brasil. Por Adi Spezia

O apelo realizado por organizações indígenas e indigenistas, é pelo veto integral do texto do Projeto de Lei

Imagem: Adi Spezia (CIMI).
Por Adi Spezia* 

Organizações indígenas e indigenistas, entres elas a Articulação dos Povos indígenas no Brasil (Apib), Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Greenpeace Brasil e Comissão Arns, enviaram um “Apelo Urgente” a Organização das Nações Unidas (ONU), com o objetivo de apresentar o risco de séria violação de direitos humanos dos povos indígenas do Brasil devido à aprovação do Projeto de Lei (PL) nº2903, de 2023, pelo Congresso Nacional brasileiro.

O PL 2903, antigo PL 490 da Câmara dos Deputados, aprovado no Plenário do Senado, no último dia 27 de setembro “é incompatível com padrões internacionais de direitos humanos”, assegura o documento enviado ao Relator Especial sobre os direitos dos povos indígenas, José Francisco Cali Tzay, e a Relatora Especial sobre a situação dos defensores dos direitos humanos, Mary Lawlor, em 3 de outubro deste ano.

O PL2903, antigo PL490, é incompatível com padrões internacionais de direitos humanos”

Na avaliação das organizações o PL 2903 “institui a tese do marco temporal para a demarcação de terras indígenas, ou seja, condiciona o direito a seus territórios ancestrais apenas para os povos que neles se encontravam em 5 de outubro de 1988, data da promulgação da Constituição”.

O Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou por 9 votos a 2 a aplicação de tese do marco temporal. No mesmo dia (27/09), em paralelo à votação do PL 2903/2023 pelo Senado, a Corte concluiu o julgamento pela inconstitucionalidade do marco temporal, além de reafirmar a constitucionalidade de outros direitos indígenas que são diretamente atacados pelo PL2903.

“O STF rejeitou por 9 votos a 2 a aplicação de tese do marco temporal e concluiu o julgamento pela inconstitucionalidade do marco temporal”

Além disso, o projeto de lei autoriza a construção de estradas, barragens e outras obras em terras indígenas sem consulta prévia, livre e informada. Permite o cultivo de soja, a criação de gado, e em terras indígenas. Cria regras para tornar o processo de demarcação infindável, de modo que seja impossível a sua conclusão. Impede que invasores de terras indígenas possam ser retirados enquanto o processo de demarcação não for finalizado, viabilizando invasões e facilitando a ação do crime organizado. Acaba com a política de não-contato com povos indígenas em isolamento e reformula conceitos constitucionais da política indigenista, como a tradicionalidade da ocupação, os direitos originários e o uso exclusivo dos territórios pelos povos indígenas, lista o documento.

Nicolas Nascimento, advogado e assessor jurídico do Cimi, explica que o PL 2903, por constituir graves e encenáveis vícios tanto formais como materiais. “Primeiro, porque é um Projeto de Lei Ordinária e que busca alterar a forma e a expressão e a interpretação de artigos da Constituição Federal, que são os 231 e 232 que trata do Estatuto Jurídico Constitucional Indígena, portanto não pode ser alterado por meio de Lei Ordinária”, destaca Nicolas.

“É um Projeto de Lei Ordinária e que busca alterar a forma e a expressão e a interpretação de artigos da Constituição Federal, que são os 231 e 232”

Por ser cláusulas pétreas, os artigos 231 e 232 da Constituição, não podem ser alterados por uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC). São direitos individuais, garantias individuais dos indígenas que são sempre exercidos de forma coletiva.

O assessor jurídico do Cimi, explica ainda que o PL2903 “é altamente reacionário e ataca os direitos dos povos indígenas, além de infringir a determinação dos povos, trazer uma ideia racista do que são os povos indígenas, ao instituir que traços culturais ou étnicos são ou não de determinado povo, sendo que estes povos são autônomos para decidir quem que é indígena ou quem não é, não cabendo ao Estado, à União, à sociedade envolvente, quem quer que seja, dizer quem é indígena ou não, ainda mais para se perder o direito às suas terras”, esclarece.

“O PL2903 é altamente reacionário e ataca os direitos dos povos, além de infringir a determinação dos povos, trazer uma ideia racista do que são os povos indígenas”

Por essas razões, as organizações signatárias solicitam aos procedimentos especiais da ONU que “instem o Estado brasileiro, em especial o Ministério da Justiça, o Ministério dos Povos Indígenas, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e a Casa Civil a reconhecer que o PL 2903/2023 apresenta patentes vícios de constitucionalidade e convencionalidade, bem como configuram inconteste retrocesso social, de forma a encaminharem pelo veto integral da proposta”.

Além de emitir um comunicado de imprensa conjunto chamando a atenção para a gravidade da situação e expressando a opinião dos relatores sobre a incompatibilidade desta legislação com padrões internacionais de direitos humanos. E, que cada mandato faça uma declaração nas redes sociais e nos canais de comunicação disponíveis o mais rápido possível, para que possamos aumentar a conscientização globalmente, conta o apelo.

Confira o apelo na integra, aqui.

Adi Spezia e jornalista e pertence à assessoria de comunicação do CIMI

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