Ângela, Janaína, Cesar e Gean: os invisíveis ficaram à espera


Por Raul Fitipaldi*.

Fotos de Rosângela Bion de Assis e Lívia Monte.

Os candidatos a prefeito de Florianópolis, Gilmar Salgado do PSTU e Elson Pereira do PSoL, aceitaram o convite das comunidades carentes do Norte da Ilha, organizadas em conjunto com um grupo de lideranças populares e sindicais, que decidiram aprofundar o diálogo com os candidatos a prefeito, estabelecendo um elenco de demandas urgentes para serem tidas em conta pela nova administração municipal que se inicia em 2013. Os candidatos do PMDB, Gean Loureiro e do PSD, César Souza Junior, declinaram enviando correios eletrônicos em tempo à assessoria da organização do encontro. As candidatas Ângela Albino do PCdoB e Janaína Deitos do PPL nem responderam. O assessor de imprensa de Angela confirmou ter recebido e veiculado à coordenação de campanha o convite.

O diretor da Escola pública Jacó Anderle, depois de conversar e receber as solicitação formal da organização do encontro, que foi apresentada a Desacato.info pelos organizadores, consentiu que a reunião entre os populares e os candidatos acontecesse no ginásio do colégio. Horas antes, de forma intempestiva a direção da escola mudou de opinião, proibiu a reunião democrática no espaço público da escola, avisou aos guardas que cuidam dos portões para que anunciassem aos vizinhos que estava cancelada a reunião, e mostrou perante uma ligação da nossa reportagem, muita preocupação por saber que candidatos tinham confirmado presença, como se isto fosse determinante para a realização do evento comunitário. O diretor do centro de ensino demonstrou irritação e questionou que não poderia se fazer uma atividade político partidária, mesmo sabendo que não se tratava disso, porque se tratava (o colégio) de um espaço público, onde não podem, segundo vemos, acontecer atos públicos… Ou, ao menos, não com determinados candidatos presentes e outros também determinados, ausentes.

A reunião aconteceu na rua, aos portões da escola, e os moradores das vilas do Norte da Ilha puderam se expressar e dirigir suas reivindicações aos candidatos, fortemente vigiados por arredor de 10 viaturas policiais, agentes fortemente armados e militares à paisana fotografando os moradores. A maioria dos presentes eram mães de família, crianças e jovens, que estavam armados de panelas, faixas e apitos.


Fora do aspecto bizarro da atitude antidemocrática do diretor, mudando de ideia intempestivamente e se contradizendo com suspeita curiosidade sobre quais candidatos estariam presentes, e de um policiamento gigantesco, como se tratasse de uma fuga de reclusos de alguma prisão urbana, é necessário refletir brevemente sobre a visão dos candidatos nesta contenda eleitoral.

Temos observado no decorrer da campanha uma corrida desesperada dos candidatos para mostrar-se como o melhor administrador possível para a cidade. Esta rotina mecanicista foi imposta pelos meios de comunicação oligopólicos em combinação com a Sociedade Interamericana de Imprensa nos últimos 10 anos quando, irritados pela vitória de um operário à presidência da república, e de líderes de extração progressista na América Latina, sentiram perigar seus interesses históricos. No Brasil não correram perigo seus interesses, mas, foram perdendo a hegemonia das decisões e de imediato iniciaram as campanhas anticorrupção, aproveitando-se de que um setor dos políticos de “carreira” incorrem, de fato, em atos de corrupção. Esses políticos, longe de denunciar os maiores corruptos, os corruptores, as multinacionais, os grandes interesses da oligarquia e das corporações de todo tipo, aceitaram passivamente serem “corruptos” para não perder o aval econômico aos seus projetos pessoais, e mudaram o comportamento eleitoral somando-se ao modelo exigido de executivo tecnocrata, eficientista e acético que é exigido pela “mídia governante”.

Florianópolis não é diferente, tem candidatos desenhados para não comprar discussões severas, decisões de caráter ideológico ou posturas decisivas e claras. Há um discurso homogêneo dos três principais candidatos, onde os programas de transformação, a atenção das questões urgentes, a justiça social e a igualdade de direitos, não só não avança, salvo escassos apelos setoriais, e sim, tudo se esconde num emaranhado de louvores à beleza da cidade, a torná-la melhor do que já é por arte do discurso, e bem administrada, porque ao fim, esta cidade de péssimo nível de educação, de imobilidade urbana e de ocupação injusta do solo, contaminada e sem planejamento a longo prazo, é para ricos, e é bom que todos tenham claro isso.

É que de repente, como se observou na quinta-feira passada na reunião das comunidades carentes do Norte da Ilha, esta cidade rica têm mais pobres do que gostaria e dos que parece precisar para as tarefas de jardinagem, faxina, segurança particular e serviços gerais. Então onde more e como more essa sobrecarga social não interessa, e se não se vê, melhor, porque dessa forma não angustia o passo de turistas pela Ilha da Magia.

Os carentes do Norte querem, precisam, merecem moradia urgente. Os riscos sanitários, sociais e humanos pelos que passam os moradores das vilas, os Sem Moradia em geral, precisam de resposta. Não são pessoas invisíveis, e se fossem, haveria que dar corpo social e mostrar esta mazela horrenda pela que passam aqueles que vieram aqui em busca de um melhor destino ou aqui nasceram, já excluídos. Por isso, se houvesse sensibilidade de parte dos candidatos, nenhuma outra agenda para esse dia poderia ter sido mais importante do que aqueles que nem moradia possuem. Todos sabemos que a agenda de um candidato muda de um minuto para outro quando o interesse dele próprio e da sua coordenação assim o determina. A reunião das comunidades do Norte da Ilha não foi prioritária para Janaína Deitos, Gean Loureiro e Cesar Souza Júnior. No caso da candidata Ângela Albino o paradoxo foi fatal: no mesmo horário, a candidata do PCdoB estava cumprindo agenda com a Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (ASBEA), num debate voltado à arquitetura e urbanismo. Os Sem Moradia estavam na rua exigindo atenção e cantando: “Na Ilha da Magia Queremos Moradia”, ou seja, demandando onde arquitetar sua vida.

Enquanto os candidatos discutem com as classes profissionais e os setores A e B da sociedade, buscando apoio intelectual e econômico para suas campanhas, os invisíveis que aparecem nas fotos, esperam que os escutem e que um dia não sejam despejados como sobra de uma cidade que parece não mais precisá-los, onde os ricos não desejam que figurem em lugares públicos, e quando ousam aparecer, os vigiam como se fossem delinquentes.

* Raul Fitipaldi é jornalista e presidente da Cooperativa de Produção em Jornalismo e Comunicação – CpCC.

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