Por Clara Averbuck.
A operação da PM em baile funk de Paraisópolis, no final de 2019, que resultou em nove mortos, teve uma espécie de apagão tecnológico, com GPS de carros desligados, desconexão com a Central de Operações e contato entre policiais através de celular, diz relatório da Corregedoria.
De acordo com a Folha de São Paulo, que teve acesso ao o documento, as viaturas que participaram da operação em Paraisópolis estavam com o GPS desligado.
O acionamento do sistema acontece quando o policial faz o login do tablet no início do turno e o desliga no fim da jornada. Os policiais e os oficiais responsáveis pela fiscalização do patrulhamentos podem ser punidos se terminais estiverem deslogados.
No meio policial, o entendimento é que um PM só desliga (ou não liga) o sistema de rastreamento quando planeja realizar alguma ação ilegal.
O relatório aponta também que houve casos de “erro dos GPS”. O policial informou ter levado uma das vítimas para o hospital, mas o sistema informa que a viatura nem se moveu.
Indagada a respeito das falhas listadas no relatório da Corregedoria, a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo afirmou que o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) está apurando as circunstâncias.
“Os laudos periciais já concluídos, de acordo com a autoridade policial, demonstram que as vítimas têm traumas compatíveis com pisoteamento. O conjunto probatório pericial é analisado pelo DHPP”, disse a Corregedoria em nota.
“A Corregedoria da PM esclarece que, após o pedido de cota ministerial, novas apurações relativas ao referido inquérito policial militar estão em andamento e elas seguem em sigilo […] Após a conclusão dessas diligências, o IPM [inquérito] será remetido à Justiça Militar e ao Ministério Público, órgãos competentes para a análise.”
Ainda de acordo com o texto, os policiais da Rocam (motos) estavam atrás de bandidos em uma moto XT 660 até o fluxo do baile.
Gravações do Copom confirmam que houve a perseguição, o que virou uma das evidências favoráveis aos PMs.
Outra informação é que a responsável pela ação usou o telefone celular, e não o rádio, para dar as ordens.
“Após alguns minutos, a 2ª tenente PM Aline ligou no celular do declarante, pedindo um QSO [contato pessoal] na viela da rua Ernest Renan, onde havia nove pessoas feridas aparentemente por pisoteamento” diz o documento.
Consta também no relatório que o teste para as armas de fogo deu positivo para disparo recente, diferente do que haviam declarado os PMs. A Corregedoria diz que os policiais usaram as armas em treinos entre fevereiro e o novembro de 2019.
Foi também levantada a questão do uso de morteiros para atacar os frequentadores do baile. “Morteiros não fazem parte dos equipamentos de dotação da Polícia Militar do Estado São Paulo e se confirmado seu uso em uma ação desta magnitude, configuraria flagrante imprudência daqueles que a utilizaram.”
Porém, as imagens foram tidas como de baixa qualidade e o laudo pericial foi inconclusivo. “Pela insuficiência de provas, não se pode imputar a nenhum policial militar tal ação que ora seria imprudente”, diz o texto.
A Corregedoria também não chegou a conclusão alguma. “Não foi possível identificar todas as ocasiões falta de elementos característicos do tipo data/hora/local, por isso algumas inconclusivas e aquelas que foram possíveis suas identificações, instaurou-se inquérito policial”, afirma o relatório, que traz muitos depoimentos de testemunhas relatando agressões mas não solicita a responsabilização dos policiais. A única questão disciplinar concreta, de acordo com o relatório, foi o fato dos terminais estarem deslogados durante a ocorrência.