Por respeito à democracia, decisão sobre terceirização não pode ficar nas mãos do Supremo Tribunal

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Fonte: Luiz Carvalho e Vanessa Ramos. 

Em 2006, o Ministério Público do Trabalho de Minas Gerais e o Sindicato dos Trabalhadores na Indústria de Extração Vegetal, Carvoejamento, Reflorestamento e Similares de Minas Gerais (Sindex-MG) moveram uma ação civil pública contra a empresa Celulose Nipo-Brasileira (Cenibra).

Denunciavam que a companhia terceirizava a sua área de atuação principal, a chamada atividade fim, situação proibida pela legislação trabalhista brasileira.

Após constatar o problema, o Tribunal Regional do Trabalho de Minas (TRT-MG) condenou a empresa a pagar uma multa de R$ 2 milhões por danos morais coletivos, determinou a contratação direta e atestou na sentença os prejuízos que a terceirização traz para a saúde e segurança dos trabalhadores. A empresa recorreu, mas a decisão foi confirmada pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST).

Em uma decisão que jogou a favor das condições decentes de trabalho, as instâncias ainda reconheceram a existência de prática antissindical por conta da perseguição aos dirigentes do Sindex e ao impedimento da organização no local de trabalho.

Diante desse cenário, a Cenibra resolveu agregar aos seus quadros mais três mil trabalhadores, mesmo enxugando o máximo que pode o pessoal com a mecanização da colheita, algo que custou ainda dois mil postos de trabalho.

“A admissão desse pessoal desmente o argumento da empresa de que não tinha recursos para contratar sem que fosse terceirizando. Faltaram com a verdade para induzir os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) ao erro, falando que a empresa poderia até quebrar, se acatarem a sentença”, ressaltou o presidente do Sindex, José Maria Soares.

O dirigente refere-se ao Supremo porque foi justamente nessa instância que o processo tomou outro rumo. Apesar de reconhecida a ilegalidade da Cenibra no TRT-MG e no TST, e mesmo com uma primeira avaliação do próprio STF de que a matéria não caberia à sua avaliação, a empresa conseguiu com que a corte máxima voltasse atrás e o caso fosse julgado como de Repercussão Geral.

Isso significa que não é mais a questão específica da empresa que está em pauta, mas sim se a terceirização da atividade-fim deve ser permitida no país. E, assim, a decisão passará a referendar os demais julgamentos no país.

Golpe na democracia

Em encontro que a CUT promoveu na tarde de terça (3) com dirigentes sindicais e assessores jurídicos, o secretário-Geral da Central, Sérgio Nobre, avaliou que lançar a decisão para as mãos do Supremo foi a única saída encontrada pelos empresários para tentar implementar um modelo de relação trabalhista semelhante ao que defende o Projeto de Lei (PL)  4330/2004.

De autoria do deputado federal Sandro Mabel (PMDB-GO), o texto permite a terceirização para todos os setores das empresas, inclusive a atividade-fim. Porém, por conta da mobilização da Central e de suas entidades ao longo de 2013, a votação do PL foi suspensa.

O debate, contudo, ocorreu na Câmara dos Deputados, em audiências públicas e comissões tripartites, com a presença de trabalhadores, empresários e governo, como prevê qualquer processo democrático.

“Os empresários não conseguiram nos derrotar no Congresso pela ação muito forte da CUT e agora vão jogar no campo onde também têm muita governabilidade, que é o STF. Cabe à classe trabalhadora tirar uma estratégia para que o Supremo não arbitre sobre esse tema sem que aja um novo processo de negociação. Uma questão tão importante como essa, que pode determinar a qualidade de vida dos trabalhadores, deve ser fruto de um debate intenso e de um acordo entre trabalhadores, empresários e governo”, afirmou Nobre.

Afinar o discurso

Para o advogado Antônio Carlos de Carvalho, mais uma vez o Supremo exerce um papel que não lhe cabe. “É preciso que o STF pare de judicializar os conflitos políticos no Brasil. Mais uma vez ele utiliza o argumento de que há um embate não resolvido entre Capital e trabalho para justificar porque deve decidir uma questão polêmica”, critica.

Nobre acrescenta, porém, que o argumento do impasse não se sustenta. “Por conta da negociação ter sido feita no afogadilho, não tivemos uma conclusão, mas não é uma questão encerrada. Nós dissemos isso na ocasião e acreditamos que é preciso retomar em outro patamar, não a partir do PL 4330, que é um projeto muito ruim, mas do respeito aos trabalhadores”, explica.

CUT quer audiência com Fux

Secretária de Relações de Trabalho, Maria das Graças Costa, lembrou que a CUT mantém há 10 anos um grupo que estuda e subsidia a direção sobre o tema e relatou que a resistência contra o projeto de lei da terceirização de Sandro Mabel é uma grande vitória até aqui. “Ano passado todas as entidades que tratavam do direito trabalhista e os trabalhadores estiveram juntas falando a mesma língua para lutar pelo mesmo motivo. Temos de manter essa unidade”, defendeu.

A dirigente adiantou que o presidente da CUT, Vagner Freitas, também já solicitou uma audiência com o ministro do STF Luiz Fux, relator da matéria sobre terceirização na corte superior.

Diretor Executivo da Central Roni Barbosa ressaltou que a falta de regras para determinar os parâmetros de contratação dos terceirizados afeta a organização dos trabalhadores e, consequentemente, a capacidade de luta. “O problema política que precisamos resolver é como avançar na defesa da categoria que fica para sindicatos pouco representativos. Junto com a questão da terceirização precisamos tratar da representatividade.”

Sem regras, vale tudo

Os assessores jurídicos apontaram a necessidade de os ramos prepararem dossiês para mostrar aos ministros do STF os impactos negativos da terceirização às condições de trabalho. A ideia da CUT é fazer uma radiografia da precarização, dos baixos salários, jornadas exaustivas, entre outros pontos, recuperando também estudos já realizados pelo Dieese e pelo Instituto Observatório Social.

Os advogados apontaram ainda que a falta de regras para a terceirização cria uma brecha para que os empregadores possam terceirizar inclusive na atividade-fim, enquanto não há a definição do Supremo. Outra certeza sobre a corte é que não basta discutir a tese jurídica, é preciso debater Direito e política ao mesmo tempo e organizar as massas para que reverberem no Judiciário.

O encontro também definiu que a Central coordenará um grupo de trabalho para articular e orientar a estratégia jurídica de atuação e apontará na próxima reunião da Executiva Nacional as primeiras definições de como mobilizará as categorias em defesa das condições dignas de trabalho.

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