Textos e foto: Rosângela Bion, com Marcela Cornelli e Clarissa Peixoto, para Desacato.info
O economista e coordenador nacional da Auditoria da Dívida Pública, Rodrigo Vieira de Ávila, falou sobre as consequências para os trabalhadores da Dívida Pública, na manhã de hoje, dia 30 de maio, durante o 8º Congresso Estadual do Sindprevs/SC. Rodrigo alertou que o pagamento da dívida interna e externa é o motivo para o não atendimento das reivindicações dos servidores públicos.
O palestrante relembrou que, em junho de 2013, as pessoas foram às ruas reivindicando melhores serviços públicos em centenas cidades, em manifestações inéditas, por mais e melhores serviços públicos. “Para que isso aconteça são necessários mais recursos para contratar e valorizar os servidores. Inclusive, a campanha salarial dos servidores desse ano pede serviços públicos padrão Fifa.’’ A maioria da população não sabe que, enquanto reivindicações básicas não são atendidas, o Orçamento Geral da União (OGU) de 2013, destinou 718 bilhões, ou 40,30% do total, para a amortização da dívida pública.
Rodrigo citou que 595 estádios do Maracanã poderiam ser construídos com os recursos gastos em 2013 com o pagamento da dívida. “Esses dados não são divulgados. O Governo oculta, que a previsão em 2014 é aumentar o gasto do OGU para 42,04%. Segundo o dividômetro da Auditoria Cidadã da Dívida, até 14 de maio de 2014, 460 bilhões foram gastos com o pagamento dos juros das dívidas interna e externa.
O economista mostrou o gráfico da série histórica com os gastos públicos, em que aparece disparado, em primeiro lugar, o crescimento dos gastos com os juros e amortização da dívida, em seguida vem o gasto com a Previdência Social e, três vezes menor, em terceiro lugar, o gasto com o pagamento dos salários e encargos sociais dos servidores públicos. Enquanto isso, os gastos com pessoal em relação a receita corrente do governo, vem caindo bastante desde 1995. Também comparando o gasto do pessoal com o PIB (Produto Interno Bruto) aponta a mesma queda nos gastos com o pagamento dos trabalhadores públicos.
Quem perde quem ganha
“Para os servidores públicos, o governo não garante nem a reposição da inflação anual, mas para os aplicadores ele paga a atualização pela taxa Selic em 11% ao ano, com alguns títulos vendidos à taxa de 13% ao ano. Enquanto a tabela do imposto de renda acumula uma defasagem de 61,42%, para os banqueiros são oferecidas isenções fiscais e anistias de dívidas,” declarou o palestrante.
A lei de responsabilidade fiscal determina que ocorram cortes no orçamento social se não estiverem garantidos recursos para o pagamento da dívida. Ou seja, o sistema da dívida opera baseado em privilégios financeiros. Rodrigo ainda destacou o papel nefasto da grande mídia, mostrando um editorial da Folha que cita que ‘ordem e contenção nos gastos são medidas que o governo deveria adotar a fim de interromper ciclo de expectativas negativas.’.
O palestrante destacou a mensagem entregue pela presidente Dilma, no início de 2014, ao Congresso Nacional apontando que manteria a política de profundo compromisso com a responsabilidade fiscal e valorizando a queda dos gastos com a Previdência Social e com o pagamento dos servidores públicos.
A Auditoria Cidadã da Dívida questiona a origem da dívida pública brasileira e se ela já não foi paga. A Constituição de 1988 previu a realização de uma auditoria que nunca foi realizada. Em 2000, a Auditoria com, o apoio de diversas entidades, realizou um plebiscito que teve mais de seis milhões de votos pedindo a auditoria da dívida.
“É preciso desmistificar que uma auditoria criaria o caos”. Rodrigo falou do precedente criado pelo Equador, que realizou uma auditoria, abriu os arquivos e verificou muitas irregularidades. 95% dos detentores de títulos da dívida aceitaram a anulação de 70% da dívida com bancos privados internacionais. Devido às provas levantadas, só 30% da dívida continua sendo paga, aumentando os recursos que podem ser destinados para educação e saúde. E os banqueiros aceitaram a decisão da auditoria.
Surgimento da dívida
Na década de 70, ditadores brasileiros e empresas privadas que não tinham legitimidade pra isso, pegaram empréstimos no exterior a juros flutuantes. A dívida externa foi se multiplicando. Uma grande parte da dívida privada foi estatizada e paga com recursos públicos. Para o economista se propagandeou uma mentira, que a dívida externa estava paga, quando na verdade foi realizado um pagamento antecipado ao FMI. Essa antecipação só foi possível porque o governo aumentou a dívida interna para pagar uma parte pequena da dívida externa. Para Rodrigo, foi um péssimo negócio pois o governo paga juros muito altos para os aplicadores da dívida interna, enquanto é quase zero o rendimento que o Banco Central consegue com as aplicações nas reservas internacionais.
“O governo mantém os juros altos para atrair a moeda estrangeira, fazer cair a cotação e para captar dólares para o pagamento da dívida externa. O Banco Central emite títulos da dívida interna, sem limites, e os juros que o Brasil paga são os maiores do mundo.” Esse mecanismo, citado pelo economista, fez a dívida interna explodir.
A cada três meses, o Banco Central reúne aplicadores e banqueiros do setor privado para definir a taxa de juros, para a Autoria Cidadã da Dívida isso implica em conflito de interesses. Outro mito citado pelo palestrante é que o não pagamento da dívida interna vai prejudicar a classe média, o povo brasileiro, que aplica na renda fixa. Dados do Tesouro Nacional mostram que só bancos nacionais e internacionais constam da relação das instituições credenciadas a comprar títulos da dívida.
Beneficiários da dívida
Rodrigo mostrou que quase metade dos beneficiários dos rendimentos das aplicações da dívida interna são bancos públicos e privados, 11% vão para investidores estrangeiros, 17% para fundos de investimento e 13% para fundos de pensão. Para ele “o endividamento público deveria ser um instrumento do Estado para conseguir recursos para investir nas áreas de interesse da população, mas esse instrumento foi usurpado pelo setor financeiro.”
O palestrante destacou a importância de democratizar o conhecimento sobre a realidade financeira do país. Os núcleos estaduais da Auditoria da Dívida estão realizando esse trabalho. Um deles foi recentemente criado em Santa Catarina e funcionará no Sindprevs/SC com o objetivo de divulgar que o pagamento das dívidas interna e externa é o maior problema do endividamento do país.