Por Régis Tadeu.*
É óbvio que você sabe da história do “jornalista dinamarquês” que resolveu ir embora do Brasil e deixar de cobrir a Copa do Mundo por se sentir chocado com a infinidade de problemas e injustiças sociais deste Brasil cada vez mais podre. A história deste sujeito e seu depoimento em texto foram reproduzidos por quase todos os portais de notícias e se disseminou pelas redes sociais com uma velocidade espantosa – aliás, como quase tudo que não presta nestes tempos. Sua foto rodou por todos os cantos da internet, todos os comentários foram todos solidários a ele…
Só que o tio Regis vai lhe contar uma coisinha: esta história é um farsa!
Sim. É isto mesmo o que você leu. Uma farsa. Cascata. Mentira. Outra lorota em tempos de internet.
Como cheguei a esta conclusão? Fácil. Fiz o que todo jornalista sério deveria fazer: fui atrás da história!
Fiz isto porque, logo de cara, senti um cheiro de trapaça no ar. Não sei explicar – chame isto de “sexto sentido”, se quiser -, mas meu instinto jornalístico sempre disse que um profissional do ramo nunca “abandona” uma boa história. E foi justamente isto que este pateta fez. Deixou para trás tudo o que ele disse que presenciou em Fortaleza – a remoção de pessoas paupérrimas para ‘maquiar’ a cidade, o assassinato de crianças de rua quando flagradas dormindo em locais tradicionalmente frequentados por turistas, o encerramento de atividades de uma série de projetos sociais em favelas e muito mais – e voltou para a sua civilizada Dinamarca. E sem fazer uma única matéria a respeito disto? Sem publicar nada, sem dar qualquer satisfação para seus patrões? O cara ouve relatos de uma espécie de “limpeza social” e não vai apurar isto? Que raio de jornalista é este?
Foi então que descobri que não existe o “jornalista Mikkel Jensen”. Basta uma simples pesquisa na internet para verificar que o único dinamarquês com este nome é um ex-jogador de futebol que jogou por um time profissional daquele país, o Brøndby IF, e que terminou a sua carreira em 2011 jogando pelo IF Brommapojkarna. Não vejo problema em um jornalista usar algum pseudônimo a não ser a covardia de não dar a cara para bater em seu trabalho, mas porque alguém usaria este tipo de artifício para… não escrever nada? Em lugar algum. Não há qualquer artigo do ‘jornalista Mikkel Jensen’ em qualquer publicação física ou digital.
Descobri então que o nome verdadeiro deste cidadão é Mikkel Keldorf. O relato de seu desencanto com o Brasil foi publicado apenas em um único local: o site do diário dinamarquês Politken (se souber ler em dinamarquês, veja aqui). Procuro outras matérias com o seu verdadeiro nome e só encontro uma outra matéria, desta vez a respeito de uma ação policial na favela da Maré, no Rio de Janeiro (tente ler aqui). Mais nada. Nem no You Tube. Tudo o que você leu a respeito deste cidadão foi retirado do próprio perfil deste sujeito – veja aqui).
Entendeu onde quero chegar?
Armou-se um estardalhaço absurdo nos meios jornalísticos digitais e nas redes sociais baseado unicamente em um troço sem qualquer tipo de comprovação! Ninguém teve sequer a decência de conversar com este sujeito antes de sair publicando por aí um monte de coisas que até acredito que sejam verdadeiras – governos de qualquer partido têm uma reputação tão manchada de lama que não duvido destas atrocidades -, mas que precisam ser provadas! E provadas por um jornalista de verdade e não por um aparente zé-mané que plantou uma história mentirosa na qual todo mundo caiu como pato otário.
O jornalismo e a capacidade de raciocínio da Humanidade já estiveram em um estágio mais elevado. Hoje, é esta desgraça que vemos a todo instante. Putz…
Todo mundo se preocupando com o maldito jornalista e ninguém preocupado com a possível limpeza social. Mas afinal, quem lembra da chacina da candelária?