Por Vijay Prashad.
Em 15 de maio de 2023, a Berkshire Hathaway informou, em um formulário 13F apresentado à Comissão de Valores Mobiliários dos Estados Unidos, que havia concluído a venda de sua participação de 4 bilhões de dólares na Taiwan Semiconductor Manufacturing Co (TSMC). Essa venda concluiu um processo que começou em fevereiro de 2023, quando a Berkshire Hathaway anunciou que havia vendido 86% de suas participações na TSMC. Em abril, o líder da Berkshire Hathaway, Warren Buffett, disse à Nikkei que a tensão geopolítica entre os Estados Unidos e a China foi “certamente uma consideração” em sua decisão de se desfazer da TSMC. A TSMC, segundo a Nikkei, é uma “empresa bem administrada”, mas a Berkshire Hathaway encontraria outros lugares para investir seu capital. Em sua reunião matinal de 6 de maio, Buffett disse que a TSMC “é uma das empresas mais bem administradas e importantes do mundo, e você poderá dizer a mesma coisa daqui a cinco, dez ou vinte anos. Não gosto de sua localização e reavaliei isso”. Por “localização”, Buffett se referia a Taiwan, no contexto das ameaças feitas pelos Estados Unidos contra a China. Ele decidiu reduzir seu investimento na TSMC “à luz de certas coisas que estavam acontecendo”. Buffett anunciou que transferiria parte desse capital para a construção de um incipiente setor nacional de semicondutores nos EUA.
A TSMC, com sede em Hsinchu, em Taiwan, é a maior fabricante de semicondutores do mundo. Em 2022, ela foi responsável por 56% da participação no mercado global e mais de 90% da fabricação de chips avançados. O investimento de Warren Buffett na TSMC baseou-se no imenso controle da empresa taiwanesa sobre o mercado mundial de semicondutores. Em agosto de 2022, o presidente dos EUA, Biden, sancionou a lei CHIPS and Science Act, que fornecerá 280 bilhões de dólares para financiar a fabricação de semicondutores nos Estados Unidos. Em 6 de dezembro de 2022, Biden juntou-se ao presidente da TSMC, Dr. Mark Liu, na expansão, no valor de 40 bilhões de dólares, das fábricas de semicondutores da TSMC em North Phoenix, no Arizona. O Dr. Liu disse no anúncio do projeto que a segunda fábrica da TSMC é “um testemunho de que a TSMC também está dando um passo gigantesco para ajudar a construir um ecossistema vibrante de semicondutores nos Estados Unidos”.
A primeira planta da TSMC nos EUA será inaugurada em 2024 e a segunda, que foi anunciada em dezembro, será inaugurada em 2026. Em 22 de fevereiro de 2023, o New York Times publicou um longo artigo (“Inside Taiwanese Chip Giant, a U.S. Expansion Stokes Tensions” – “Dentro da gigante taiwanesa de chips, uma divisão nos EUA provoca tensões”, em tradução livre), que apontou, com base em entrevistas com funcionários da TSMC, que “os altos custos e os desafios gerenciais” mostram “como é difícil transplantar um dos processos de fabricação mais complicados conhecidos pelo homem para o outro lado do mundo”. No anúncio de 6 de dezembro, Biden disse que “a manufatura americana está de volta”, mas só está de volta a um custo muito mais alto (o custo de construção da fábrica é dez vezes maior do que teria sido em Taiwan). “O mais difícil na fabricação de wafer não é a tecnologia”, disse Wayne Chiu, um engenheiro que deixou a TSMC em 2022, ao New York Times. “O mais difícil é o gerenciamento de pessoal. Os americanos são os piores nisso porque são os mais difíceis de gerenciar”.
Explodir Taiwan
O embaixador dos EUA, Robert O’Brien, ex-conselheiro de segurança nacional de Donald Trump, disse a Steve Clemons, editor da Semafor, durante o Fórum de Segurança Global em Doha, no Qatar, em 13 de março de 2023: “Os Estados Unidos e seus aliados nunca deixarão que essas fábricas [de semicondutores] caiam nas mãos dos chineses”. A China, disse O’Brien, poderia construir “a nova OPEP [Organização dos Países Exportadores de Petróleo] de chips de silício” e, assim, “controlar a economia mundial”. Os Estados Unidos evitarão essa possibilidade, disse ele, mesmo que isso envolva um ataque militar. Em 2 de maio de 2023, em um evento do Milken Institute, o congressista estadunidense Seth Moulton disse que, se as forças chinesas entrarem em Taiwan, “explodiremos a TSMC. […] É claro que os taiwaneses realmente não gostam dessa ideia”.
Essas declarações esdrúxulas de O’Brien e Moulton têm base em um artigo de ampla circulação da Escola de Guerra do Exército dos EUA, publicado em novembro de 2021, por Jared M. McKinney e Peter Harris (“Broken Nest: Deterring China from Invading Taiwan” – “Ninho quebrado: impedindo a China de invadir Taiwan”, em tradução livre). “Os Estados Unidos e Taiwan devem traçar planos para uma estratégia de terra arrasada direcionada que tornaria Taiwan não apenas pouco atraente, se alguma vez tomada pela força, mas positivamente cara de manter. Isso poderia ser feito de forma eficaz, ameaçando destruir as instalações pertencentes à Taiwan Semiconductor Manufacturing Company”, escreveram eles.
Logo depois que Moulton fez essas observações incendiárias, a ex-subsecretária de Defesa dos EUA, Michèle Flournoy, disse que se tratava de uma “ideia terrível” e que um ataque desse tipo teria um “impacto de 2 trilhões de dólares na economia global no primeiro ano, e paralisaria a produção em todo o mundo”.
As autoridades de Taiwan responderam rapidamente a Moulton, com o ministro da Defesa, Chiu Kuo-cheng, perguntando: “Como nosso exército nacional pode tolerar essa situação se ele diz que quer bombardear isso e aquilo?” Embora Chiu tenha respondido à declaração de Moulton sobre um ataque militar à TSMC, na verdade, o governo dos EUA já tem atacado a capacidade dessa empresa taiwanesa de permanecer em Taiwan.
O vice-ministro da economia de Taiwan, Lin Chuan-neng, disse, em resposta a essas ameaças e à venda da TSMC por Buffett, que seu governo “fará o máximo para que o mundo saiba que Taiwan é estável e segura”. Esses comentários incendiários direcionados à China agora ameaçam o colapso da economia de Taiwan.
Made in Japan
Em sua reunião de 6 de maio, Warren Buffett disse algo que dá uma pista sobre para onde a fabricação de semicondutores pode ser desviada. “Sinto-me melhor com relação ao capital que temos investido no Japão do que em Taiwan”, disse ele. Em 1988, 51% dos semicondutores do mundo eram fabricados no Japão, mas, em 2022, esse número será de apenas 9%. Em junho de 2022, o Ministério da Economia, Comércio e Indústria (METI) do Japão anunciou que investiria 40% dos 8,6 bilhões de dólares planejados para uma fábrica de semicondutores da TSMC em Kumamoto. O METI disse em novembro que selecionou a Rapidus Corporation – que conta com participações da NTT, SoftBank, Sony e Toyota – para fabricar chips de 2 nanômetros de última geração. É provável que a Berkshire Hathaway também invista nesse novo negócio.
Este artigo foi produzido para a Globetrotter e traduzido por Pedro Marin para a Revista Opera. Vijay Prashad é um historiador, editor e jornalista indiano. É membro da redação e correspondente-chefe da Globetrotter. É editor-chefe da LeftWord Books e diretor do Instituto Tricontinental de Investigação Social. Também é membro sênior não-residente do Instituto Chongyang de Estudos Financeiros da Universidade Renmin da China. É autor de mais de 20 livros, entre eles The Darker Nations e The Poorer Nations. Seus últimos livros são Struggle Makes Us Human: Learning from Movements for Socialism e The Withdrawal: Iraq, Libya, Afghanistan, and the Fragility of U.S. Power (com Noam Chomsky).
A opinião do/a/s autor/a/s não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.