TSE nega cassação da chapa de Bolsonaro, mesmo com ‘fake news’. Mas Moraes garante que isso dará prisão em 2022

Futuro presidente do tribunal afirma que Judiciário não pode permitir ódio e ataques à democracia. “Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado e as pessoas que assim o fizerem irão pra cadeia”

Foto: Isac Nóbrega/PR em Fotos Públicas

Por Vitor Nuzzi.

Na conclusão do julgamento, nesta quinta-feira (28), o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) negou por unanimidade o pedido de cassação da chapa vencedora nas eleições presidenciais de 2018 (Jair Bolsonaro e Hamilton Mourão). Prevaleceu o entendimento de que se houve disparo de mensagens em massa pelo WhatsApp, não se provou a gravidade do fato. A coligação que reuniu PT, PCdoB e Pros apresentou duas ações, apontando uso indevido dos meios de comunicação e abuso de poder econômico. A conclusão do julgamento foi usada para transmitir “recados” que essa prática não será tolerada na próxima eleição. Sem dar nomes, dois ministros atribuíram à extrema direita os constantes ataques virtuais.

O julgamento começou na terça-feira, com o voto do relator, Luis Felipe Salomão, em relação às Ações de Investigação Judicial Eleitoral (Aijes) 0601968-80 e 0601771-28. Mesmo reconhecendo a ilicitude do uso de disparo em massa naquela eleição, o também corregedor da Justiça Eleitoral entendeu que não havia provas suficientes para comprovar a gravidade dos fatos. Com alguma diferença entre os votos, o posicionamento dos ministros foi unânime pela improcedência das ações. Salomão propôs uma tese para regular o tema, aprovada por maioria.

Justiça cega, não tola

Contudo, o ministro Alexandre de Moraes foi mais explicito e contundente no seu voto, ao afirmar que o mesmo procedimento resultará em cassação e prisão nas eleições do ano que vem. “Se houver repetição do que foi feito em 2018, o registro será cassado. E as pessoas que assim o fizerem irão pra cadeia. Por atentar contra as eleições e a democracia”, afirmou Moraes, que será o presidente do TSE nas eleições de 2022.

“A Justiça é cega, mas não é tola. Não podemos criar, de forma alguma, um precedente avestruz. Todo mundo sabe o que ocorreu, o mecanismo utilizado nas eleições e depois das eleições”, disse ainda Moraes ao votar, acompanhando o relator. Ele também defendeu a jornalista Patrícia Campos Mello, da Folha de S.Paulo, atacada nas redes por publicar reportagens sobre o disparo de mensagens em massa. Referiu-se ao que chamou de “milícias digitais covardes”.

“Nós sabemos o que ocorreu”

“Há gabinete do ódio, sim. Não podemos confundir a neutralidade da Justiça com tolice. Podemos absolver aqui por falta de provas, mas nós sabemos o que ocorreu, nós sabemos o que vem ocorrendo, e não vamos permitir que isso ocorra”, prosseguiu, observando que essas milícias digitais, “grupos treinados pela extrema direita fascista”, continuam se preparando para espalhar ódio e minar a democracia. “Houve uma política de subestimar as redes”, avaliou o magistrado. “Temos de olhar a vida como ela é. Somos bombardeados de informações no nosso WhatsApp sem que tenhamos pedido. Vamos continuar tratando as plataformas que veiculam nas rede sociais como empresas de tecnologia? É a mesma política do avestruz. O WhatsApp é empresa de comunicação. Ganha dinheiro com isso.”

Moraes: ‘Podemos absolver por falta de provas, mas nós sabemos o que ocorreu, nós sabemos o que vem ocorrendo, e não vamos permitir que isso ocorra’
Decisão para o futuro

O presidente do TSE, Luís Roberto Barroso, disse que a decisão proferida hoje é “para o futuro”. “E nós aqui estamos procurando demarcar os contornos que vão pautar a democracia brasileira e as eleições do próximo ano”, acrescentou. Segundo ele, a Justiça eleitoral está “determinada” a combater essa prática. Ainda que a acusação não tenha sido provada, no entendimento do tribunal, o ministro disse que “todo mundo sabe o que aconteceu” em 2018. As redes, lembrou, foram “inundadas” com disparos em massa com um conteúdo de desinformação, calúnias, teorias conspiratórias. “As pessoas perderam a capacidade de discutir com inteligência”, disse ainda Barroso, propondo um “choque de civilidade” no processo eleitoral.

Assim, disse Barroso, é preciso que as mídias sociais também colaborem. “Não podem se transformar num coliseu romano de barbaridades. Precisamos de legislação, de atuação judicial e da atuação voluntária das próprias mídias sociais para que elas sejam um espaço construtivo e não destrutivo.”

Debate em vez de ódio

Hoje, segundo ele, as redes têm servido para desqualificação do adversário e teorias conspiratórias, em vez de debate. E a Justiça precisa buscar o “equilíbrio necessário entre a liberdade de expressão e preservação de espaço público que não seja dominado pelo ódio, pela criminalidade e pela desinformação”. Sem robôs, perfis falsos, contas duplicadas e trolls, “pessoas contratadas para multiplicar as calúnias”.

Assim, daqui em diante, como propôs o relator, o uso de disparo em massa com desinformação e inverdades, em prejuízo de adversários e benefício de algum candidato, poderá configurar abuso de poder econômico e uso indevido dos meios e comunicação. Barroso afirmou que a Justiça “não vai tolerar distorções que contaminem o processo eleitoral”.

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