Por Plinio Teodoro.
A carga com 2.750 toneladas de nitrato de amônia que explodiu deixando pelo menos 100 mortos, 4 mil feridos e 300 mil desabrigados chegou ao porto de Beirute em 2013. O carregamento é de uma empresa russa e estava em um navio com bandeira da Moldávia, no trajeto entre a Geórgia e Moçambique, na África, que foi forçado a atracar devido a problemas técnicos no mar. As informações são da rede de notícias árabe Al-Jazeera.
Usado na fabricação de bombas e também na produção de agrotóxicos, o nitrato de amônia foi abandonado pela tripulação do navio e estava armazenado no Hangar 12 do porto na capital do Líbano.
Em entrevista ao Fórum Café, a professora Arlene Elizabeth Clemesha, do Departamento de Letras Orientais da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP), especialista em países árabes, afirma que o entrave em relação à carga se deu, muito provavelmente, à burocracia das autoridades libanesas.
“Se isso for verdade – e aparentemente é – esse material que é sabidamente perigoso é conhecido desde 2014 e o governo foi solicitado a dar uma resposta e nada foi feito. Ou seja, uma total inoperância, uma total incapacidade do governo de lidar com o problema. Isso não elimina o fato de que o material possa ter sido usado para se cometer um atentado”, diz Arlene (assista a entrevista a partir do minuto 33 do vídeo abaixo)
Alertas
O carregamento foi retirado do navio Rhosus após a embarcação ser impedida de navegar por autoridades libanesas. Em junho de 2014, o então diretor da Alfândega Libanesa, Shafik Merhi, enviou uma carta endereçada a um “juiz de assuntos urgentes”, pedindo uma solução para a carga, segundo a Al Jazeera.
Os funcionários aduaneiros enviaram pelo menos mais cinco cartas nos próximos três anos – em 5 de dezembro de 2014, 6 de maio de 2015, 20 de maio de 2016, 13 de outubro de 2016 e 27 de outubro de 2017 – pedindo orientação. Eles propuseram três opções: exportar o nitrato de amônio, entregá-lo ao exército libanês ou vendê-lo à empresa libanesa de explosivos de propriedade privada.
Uma carta enviada em 2016, no entanto, mostra que “os juízes não responderam” a pedidos anteriores.
No texto, os responsáveis pela guarda do material dizem que “em vista do sério risco de manter esses produtos no hangar em condições climáticas inadequadas, reafirmamos nosso pedido de solicitar à agência marítima que reexporte esses produtos imediatamente para preservar a segurança do porto e daqueles que trabalham em ou concordar em vender esse valor para a Lebanese Explosives Company”. Novamente, os estivadores não tiveram resposta do governo libanês.
Em 2017, Badri Daher, o novo diretor da Administração Aduaneira do Líbano, escreveu a um juiz mais uma vez pedindo urgência na decisão sobre o assunto em vista do “perigo de deixar esses produtos no local em que estão e para aqueles que trabalham lá”. Foi o último alerta feito sobre o material.
Nesta terça, o primeiro-ministro do Líbano, Hassan Diab, classificou a explosão no porto como “um grande desastre nacional” e prometeu que “todos os responsáveis ??por essa catástrofe pagarão o preço”.
O presidente libanês Michel Aoun chamou o fracasso em lidar com o nitrato de amônio como “inaceitável” e prometeu a “punição mais severa” aos responsáveis. Uma investigação foi iniciada e o comitê deve encaminhar suas conclusões ao judiciário dentro de cinco dias.