Por Elissandro Santana, para Desacato.info.
Lembro-me que na última eleição ganhou força, nas redes sociais, a notícia mentirosa de que o PT estaria providenciando uma mamadeira erótica para as crianças brasileiras. Esta informação foi não somente produzida por reacionários conservadores, alienado-alienadores, apoiadores do atual presidente, mas, também, reproduzida, ao máximo, ao longo de muito tempo, inclusive ainda hoje, tanto que alguns seguem acreditando piamente que a tal piroca só não deu certo porque conseguiram frear o Partido dos Trabalhadores.
Os mesmos reacionário-conservadores produtores e difusores de fake news como a mamadeira com genitália masculina, pornográfica ao extremo, foram se especializando em barbaridades, entendendo a capilaridade das redes sociais e se aproveitando das dificuldades de análise política e discursiva das massas brasileiras para a consolidação do projeto de ignorância que zumbificou o olhar e a mente da sociedade. Esta é uma das prováveis hipóteses para que chegássemos aonde chegamos e essas mentiras que deram o tom na última eleição continuam em efervescência, em latência, se alastrando, se remodelando, se reinventando, buscando meios de perpetuação e de proliferação pelas arquiteturas mentais insanas dadas à mentira e ao ethos da antiética, tanto que há um medo gigante em relação à penalização e tipificação das fake news como crime por parte de alguns partidos e segmentos sociais do país que apoiam políticos arvorados e consolidados a partir das posturas históricas dos senhores da Casa Grande que residem e querem avançar em seus desmandos e maldades.
Na última eleição, as caraminholas tomaram corpo na sociedade, as deepfakes ganharam terreno e muitos as compartilharam alimentando o caos e nos trazendo ao quadro político no qual nos encontramos, não somente pela incompetência em diferenciar fatos de mentiras, mas, também, por uma questão ética, e, para superarmos esta crise, temos que nos transformar como sociedade, para que, desta forma, possamos rasgar os véus dessa política do governo Bolsonaro e outros exemplos políticos históricos que se estruturam/estruturaram por meio de posturas nada éticas, ou, melhor dizendo, antiéticas.
Com relação às deepfakes, para quem ainda não conhece o termo, explicarei a partir do seguinte conceito, primário, a meu ver: “o deepfake é uma tecnologia que usa inteligência artificial (IA) para criar vídeos falsos, mas realistas, de pessoas fazendo coisas que elas nunca fizeram na vida real. A técnica que permite fazer as montagens de vídeo já gerou desde conteúdos pornográficos com celebridades até discursos fictícios de políticos influentes.”1
Quem nunca, pelo whatsapp, ou por outros meios de comunicação, nessa virtualidade da desesperança, não recebeu montagens em vídeo desconstruindo políticos como Lula ou candidatos e políticos do PSOL e de outros partidos? Isso se relaciona diretamente com deepfakes e com este modelo político de desesperança que nos vence por osmose, se não lutamos contra.
Sabemos que deepfakes, ou seja, vídeos nesta linha “não são perfeitos, mas são realistas o suficiente para enganar muita gente. Má intenção não faz parte do conceito dos deepfakes, mas está na equação. A manipulação das imagens e vozes de políticos se mostra como um alerta. Com ferramentas tão acessíveis, fica mais fácil espalhar informações falsas de acordo com interesses próprios, fundamentadas por supostas provas em vídeo. Isso pode representar um perigo para a democracia e a sociedade, inclusive ameaçando a credibilidade de tudo o que é publicado.”2. Em meio à incapacidade analítica de muitos, os senhores da mentira se aproveitam e destroem imagens modelando o pensamento da sociedade, para a desconstrução e para a construção. A mentira serve para as duas situações, tanto que temos a fake facada como a grande protagonista para o caos na vitória do atual presidente.
Atualmente, a ilusão da vez é a crença fundamentalista na hidroxicloroquina como cura para a Covid-19, mesmo diante das informações e resultados de pesquisa apresentados por grandes autoridades no assunto e com a corroboração da Organização Mundial da Saúde. Esta crença tem contribuído para a modelação-criação de heróis e de heroínas que vão contra a ciência e promovem o uso de um medicamento que, comprovadamente, pode produzir efeitos colaterais perigosíssimos.
A negação da ciência por profissionais que, em tese, sentaram nos bancos de uma universidade para a obtenção de um diploma também é resultado desse processo de abalos da ética pela mentira e deveria acionar um debate ético por autoridades do judiciário, pela mídia e pelos/as pensadores/as, mas o país está tão descontrolado que em vez de se combater discursos charlatões, estão é criando heróis da cloroquina, ainda que esta possa causar a morte de alguns, já que não existe comprovação científica de eficiência do medicamento em relação à Covid-19 e ainda pode colocar a vida de alguns pacientes em situação sanitária gravíssima.
Voltando à mamadeira de piroca, se esta foi daninha para a nação, no discurso do culto à hidroxicloroquina há uma ilusão perigosa que pode custar vidas, por isso, nós, avatares da esperança que não nos permitimos seduzir pelas mentiras, devemos, com garra e coragem, combater os discursos falaciosos que podem colocar em perigo as pessoas mais vulneráveis, os trabalhadores/as e desempregados/as extorquidos/as em todos os sentidos por esta necropolítica e seus sequazes ensandecidos em meio a esta pandemia.
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