Desvendando a face cronista de Lygia Fagundes Telles

Lygia Fagundes Telles, também conhecida como “a primeira dama da literatura brasileira”, é considerada por acadêmicos e críticos uma das maiores escritoras brasileiras do século XX. Imagem: André Lessa/Reprodução.

Por Heloise Auer

Ao falarmos de Lygia Fagundes Telles é impossível não lembrarmos dos renomados contos e romances da autora, como Antes do baile verde e Ciranda de Pedra, caracterizados por representarem o universo urbano e por explorarem de forma intimista a psicologia feminina.

Porém, quando falamos da Lygia cronista, a situação se torna um pouco obscura, causando até mesmo uma espécie de confusão nos leitores, resultado de nosso desconhecimento de sua produção neste gênero.

Pondo os pingos nos is

O primeiro passo para entender a face cronista da autora é conhecer sua obra. Lygia possui apenas duas crônicas publicadas na imprensa; a primeira, “Não vou ceder. Até quando?”, publicada em janeiro de 1992 no jornal O Estado de S. Paulo, fala sobre o advento da internet, e a preferência da autora pela máquina de escrever.

Já a segunda, “Pindura com um anjo”, foi publicada em agosto de 1996 no Jornal da Tarde. Ambas, raros convites aceitos pela autora. O texto lygeano transita entre categorizações, adentrando áreas cinzentas e não rotuláveis.

A produção de Lygia como cronista não para por aí. Em 2011, a escritora publicou o livro Passaporte para a China: Crônicas de Viagem, onde reúne 29 crônicas de sua viagem à China, realizada em 1960, quando o governo do país convidou escritores de todo o mundo a participar das comemorações do 11º ano da revolução de Mao Tsé-Tung. Samuel Wainer, então, pediu que a escritora relatasse suas impressões de viagem ao jornal Última Hora, o que foi feito cinquenta e um anos depois.

Outro livro que traz um recorte de sua produção no mundo das crônicas é o Conspiração de Nuvens, publicado em 2007. Neste livro, a escritora reúne contos de ficção inéditos e reminiscências da infância, relatos de viagens, crônicas sobre a cidade de São Paulo e perfis de intelectuais brasileiros com quem conviveu.

Essa mistura de tantos gêneros literários dentro de uma única obra explicita a relação de Lygia Fagundes Telles com a literatura, ou seja, o texto lygeano transita entre categorizações, adentrando áreas cinzentas e não rotuláveis.

Desfazendo o nó

Para começarmos a desfazer o nó que cerca a obra de Lygia Fagundes Telles, é preciso levar em conta que suas crônicas se aproximam ao texto ficcional curto e se confundem com o conto.

Se confundem, pois sua estrutura de relato de experiência dá um caráter intimista à narração – semelhante ao conto ou ao romance – ao mesmo tempo que a história parte da rememoração de um acontecimento aparentemente banal – característica da crônica. Nesse sentido, é importante destacar que o trabalho artístico de composição de uma crônica como a de Lygia Fagundes Telles se reveste de um grande esforço de reflexão sobre a própria vida.

A verdade, entretanto, é que a passagem da autora por estes diversos modos de escrita ficcional não compromete a força poética de sua prosa, pelo contrário, contribui ainda mais para intensificar seu intimismo lírico e a abordagem despretensiosa de questões existenciais muito caras ao ser humano.

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