Por Salem Nasser.
Nos tempos de escola, fazíamos exercícios de compreensão de texto. Eu tendia a me sair bem. Mas, confesso, muitas vezes não fazia as leituras obrigatórias. Nesses dias, às vezes era salvo por um comentário do professor que ficava na memória ou por um resumo que alguém tivesse feito. Às vezes, nada me salvava e a nota refletia meu pouco esforço.
O que me salvava sempre, no entanto, é algo que se tornou uma regra para o resto da vida: eu me atinha ao que sabia ser certo sobre o que tinha lido ou ouvido e, se tivesse que construir algum argumento, eu me certificava de sua solidez. Assim, se alguém quisesse me criticar ou me dar uma nota baixa, teria que, ou provar que eu estava factualmente errado, ou derrubar o meu argumento com outro mais sólido.
Esta habilidade que reclamo para mim foi posta em dúvida pelo professor Michel Gherman aqui na Brasileiros.
Na verdade, ele fez mais. Em seu artigo intitulado “Duvivier passa a ser suspeito por pensar”, ele fez a defesa de Duvivier, fez uma crítica severa de um artigo meu e outra talvez ainda mais severa de um campo, corrente ou discurso de que eu faria parte ou representaria e, finalmente, teceu comentários sobre o estado do debate a respeito da questão Palestina entre nós.
De início, pensei que não era o caso de responder, por várias razões. A principal delas é o respeito que devemos aos leitores, que não precisam ser submetidos a essas esgrimas que inevitavelmente adquirem um aspecto pessoal, uma espécie de disputa de egos inflados e feridos pela crítica. Com mais razão ainda num caso como este em que um primeiro artigo é escrito por Duvivier, uma crítica por mim e a resposta à crítica, e contra-crítica, por um terceiro. Respondendo eu agora nos aproximamos de uma pequena estranha novela em que Duvivier é ao mesmo tempo o debatedor ausente e o objeto do debate, o que em alguma medida é descortês. Não penso que haveria, de modo geral, utilidade nesse tipo de exercício.
Só o que me convenceu a escrever foi a menção que o professor Gherman faz ao modo como se tem instalado o debate sobre esta questão específica no Brasil e também fora dele. Falar sobre os argumentos tecidos nos três textos é também olhar para este debate e para a sua qualidade. (Ao leitor desconfiado, que venha a acreditar que esta resposta é ainda assim um clamor do ego, eu digo que sim, é possível que eu tenha um).
Por tudo isso, quero agora liberar o leitor que se sinta cansado desse tipo de embate, especialmente porque antecipo um texto um pouco mais longo. Quem tiver interesse na questão palestina e, para além dela, no modo como são construídos e veiculados os argumentos num debate de extrema importância, pode seguir comigo pois eu farei o possível para que valha a pena.
O professor Gherman critica meu texto por coisas que estariam nele e por tantas outras que certamente estão fora dele. Entre estas últimas, para ser claro, estão coisas que eu não disse mas foram lidas, e estão representações que o professor Gherman faz da minha pessoa, de campos a que ele supõe que eu pertença e de discursos maniqueístas, de inspiração quase religiosa, de que eu seria um exemplar e representante.
Comecemos com o que está no meu artigo. Se eu tivesse tido a oportunidade, teria lembrado ao professor Gherman o desafio geral que lançava acima: demonstre a falsidade factual ou derrube o argumento com outro melhor. Sinto que o professor não consegui uma ou outra dessas coisas. A ser demonstrado, é claro.
O titulo escolhido pelo professor Gherman é a expressão de um diagnóstico feito ao longo do seu texto: Duvivier teria se convertido em suspeito, para um determinado campo da esquerda, por ter ousado pensar. Sem dizer nada sobre esse diagnóstico, por enquanto, é certo que o professor não me estava acusando de dizer que o Duvivier era agora suspeito ou de dizer que o Duvivier pensava, ainda que eu esteja convicto de que isto é algo que ele faz.
Para ser bem preciso, eu não apontei a suspeição de Duvivier, mas a sua culpa. Eu o acusei diretamente de erros causados não por excesso de pensar, mas por falta de pensar ou por um pensar de pouca qualidade. Agora vejamos se eu tinha razão ou se o professor Gherman demonstrou a minha desrazão.
Eu disse basicamente que: i) Duvivier foi incapaz de enxergar a tragédia palestina pelo que ela é, daí a cegueira; ii) Duvivier se deixou arregimentar para a defesa de Israel, talvez sem perceber; iii) ao fazer o discurso padrão de condenar igualmente os extremistas dos dois lados, Duvivier deixou de diferenciar entre ocupante e ocupado, entre opressor e oprimido, e assim falseia a natureza do problema, da tragédia; iv) que Duvivier esteve no coração da injustiça e da ocupação e não as viu, daí aquela mesma cegueira; v) que Duvivier dava um dado estatístico genérico sobre os palestinos (que seriam raros!) a apoiar o boicote a Israel e (mais raros ainda!!) os que apóiam o Hamas, um dado que não é apenas sabidamente falso, mas é também absurdamente falso.
Comecemos com esta última, que é o coração mesmo da minha crítica. Derrube este argumento e derrubará meu artigo inteiro. Professor Gherman, é correto dizer que são raros os palestinos que apóiam o boicote e mais raros ainda os que apóiam o Hamas? Se excede em arrogância quem diz que essas afirmações são falsas e que quem as faz não entendeu nada sobre a Palestina e não parece ter muito a contribuir para o debate?
Na verdade, a arrogância está do outro lado, porque Duvivier não se satisfaz com afirmar para si a posse dessas verdades, ele acusa os defensores do boicote no Brasil de não saberem o que ele sabe ou de fazerem de conta que não sabem. Ou seja, ele desqualifica o boicote e sua militância não apenas por duvidar dos méritos da política, mas também por considerar que essas pessoas que pensam bastante (apesar do professor Gherman sugerir que o pensamento é apanágio apenas do que ele mesmo chamou de outro lado) sobre a questão da Palestina, ou são ignorantes ou estão de má fé.
Duvivier fez mais do que pensar, ou fez algo diferente de pensar. Ele entrou em cheio no debate sobre o boicote e escolheu um lado, armado com esta “verdade”. É esta a qualidade de pensamento que deve comandar o meu respeito, professor Gherman?
O professor Gherman me acusa de operar um exercício assustador, o de “desqualificar o interlocutor por discordância sobre os métodos”. Não entendi bem onde o meu desencontro com Duvivier seria sobre métodos, mas, por falar em método, vejamos qual foi aquele usado por Duvivier para chegar à verdade que nós outros ignoramos ou escondemos.
Duvivier não diz nada sobre isto, mas o professor Gherman nos explica: Duvivier esteve numa conferência em que estavam acadêmicos palestinos e membros da Autoridade Palestina e estes eram contra a ocupação e contra o boicote total a Israel; depois, um guia palestino que lhe mostrou um campo de refugiados, de palestinos expulsos de suas casas em 1948(!) e lhe mostrou o muro de separação (!) disse que não achava o boicote acadêmico adequado; finalmente um outro palestino, diretor de uma ONG, denunciou as tentativas de judaização de Jerusalém (logo, mais sobre o que isto pode querer dizer) e também se disse contrário ao boicote acadêmico e político.
Ora, impecável rigor metodológico! Impressionante amostra! O professor Gherman avaliaria como uma tese que estivesse montada sobre esse tipo de pesquisa de campo? Sim, Duvivier não é um acadêmico e talvez não esteja sujeito aos rigores da pesquisa científica. Mas Duvivier usou da sua voz, potente, para entrar no debate público, para influenciar a opinião dos seus leitores, fez afirmações fortes, falsas, e desautorizou as vozes, acusadas de ignorantes ou de mentirosas, que diriam ser falso o que era, de fato, falso! Será que, por estar no campo de batalha, enfrentando o extremismo religioso (segundo o professor Gherman), está especialmente autorizado a montar seus argumentos sobre dados falsos e a tê-los aceitos por legítimos? Ou será que está autorizado a intuir ou inventaruma verdade que estaria para além da verdade dos fatos?
E de onde terão saído, professor, os números de Duvivier sobre o Hamas? Então, o Duvivier esteve com ministros e ex-ministros da Autoridade Palestina, na Universidade Hebraica de Jerusalém, e não havia ali muita gente que apoiasse o Hamas, uhum… Não sou eu o especialista em comédia, mas há algo de risível aqui, para quem entende algo do assunto, é claro.
Aqui não há escapatória, professor Gherman: ou é preciso dizer que os dados estavam corretos e/ou que Duvivier estava autorizado a dizer o que disse, ou se deve reconhecer que os dados estavam errados e que Duvivier errou. Não sei porque o senhor não respondeu claramente a esta crítica central. De modo indireto, apenas, tentou justificar as afirmações nos contanto de onde Duvivier tirou as suas impressões, sim, meras impressões. Digo com firmeza aos dois: não é suficiente.
Sobre o boicote ainda e sobre o lugar de onde Duvivier tirou o que considerou serem certezas, vejam que o professor Gherman faz uma distinção entre boicotes qualificados de modos diversos. Ele diz que Duvivier “se colocou contra o boicote a tudo o que for israelense” (as palavras exatas deste na Folha), que os acadêmicos e políticos palestinos da conferência eram “contrários ao boicote total a Israel”, que o guia “não achava que o boicote acadêmico era adequado”, que o diretor da ONG era “contrário ao boicote acadêmico e político”.
A pergunta, de repente, se impõe: quem é contra o boicote total é favorável a algum tipo de boicote, parcial talvez?; quem é contra o boicote acadêmico é favorável a algum outro tipo, político, econômico?; quem é contra o acadêmico e político, acredita no econômico, naquele restrito aos assentamentos?
E mais importante, Duvivier e professor Gherman, para além de dirigirem sua condenação e sua desqualificação dos que defendem o boicote “a tudo que for israelense”, têm alguma posição sobre alguma outra modalidade de boicote, ainda que seja apenas a dos assentamentos? Silêncio.
Agora, por que será que alguém contempla a ideia de boicote a Israel e que as pessoas se sentem compelidas e serem a favor ou contra? O que estará Israel fazendo para que alguns tantos, no mundo inteiro, sintam que o boicote é necessário e legítimo?
Eu tenho uma resposta direta para isso, mas divirtamo-nos buscando as pistas no artigo do professor Gherman (não as há infelizmente no texto do Duvivier).
Os acadêmicos e políticos palestinos “rechaçaram a ocupação”. O guia palestino mostrou um campo de refugiados, “expulsos de Israel em 1948”, mostrou o muro de separação, onde se pôde observar “as dificuldades diárias que um palestino enfrenta diante das barreiras policiais israelenses”. O diretor da ONG denunciou “as tentativas de judaização de Jerusalém”.
Todas essas pessoas apontaram para a existência de um povo sob ocupação e de um território sob ocupação, apontaram para o fato de que centenas de milhares de pessoas foram expulsas de suas casas em 48 e outras tantas em 67, que essas pessoas e seus descendentes contam hoje milhões vivendo no exílio ou em campos de refugiados, que há um muro de separação vergonhoso, que os palestinos vivem a discriminação e a humilhação diárias, e mais, que os palestinos ainda hoje vão tendo as suas casas destruídas e expropriadas e vão sendo expulsos de sua terra (“judaização de Jerusalém” é o eufemismo que o professor Gherman usa para falar deste fenômeno que, por sinal, não está circunscrito àquela cidade).
Duvivier, no entanto, não viu nem ouviu, não registrou nada disso, ou achou que não valia a pena mencionar essas coisas! Só o que ele ouviu e considerou digno de nota é que esse pessoal era contra o boicote total a Israel, ou seja, ele só sentiu o simbólico tapinha no ombro e pensou ouvir: “Obrigado por ter vindo, apreciamos a sua visita, todo esse pessoal no Brasil que critica a sua viagem não sabe de nada”.
Eu chamei a isto de cegueira, termo que se aplica, acredito, quando alguém não enxerga as coisas, sejam elas todas as coisas ou apenas algumas específicas. Essa acusação que eu faço é posta pelo professor Gherman na conta de uma arrogância de quem não admite que alguém discorde ou veja as coisas diferentemente. Ora, é simples, como foi que o Duvivier viu a ocupação, os assentamentos, o muro, os desterrados, os humilhados, o que eu chamo de apartheid? Lendo o Duvivier, eu não sei, porque ele não deu um pio sobre essas coisas.
O professor Gherman diz, com razão, algumas coisas que o Duvivier não fez: ele não defendeu as políticas do governo israelense, não apoiou a ocupação e nem sequer foi contra pressões políticas para o fim dos assentamentos que o professor qualifica como injustificáveis. Isto tudo é verdade, mas também é verdade que Duvivier não condenou a ocupação, porque simplesmente não falou no assunto, não disse ser favorável a pressões políticas para por fim aos assentamentos, porque ele não menciona os assentamentos e, fora uma referencia crítica a Netanyahu, ele não tem uma palavra de censura às políticas israelenses.
Eu censurei o Duvivier (no sentido de criticar, porque não está em meu poder ou na minha intenção calá-lo) não por discordar de mim, mas por não ter visto a injustiça que estava diante de seus olhos e por falar da Palestina sem ter entendido a natureza real da sua tragédia. Eu estava errado? Basta me mostrar onde foi que ele mencionou, no artigo que eu critiquei, a indicação da injustiça e a percepção da tragédia.
É claro, eu posso estar errado também caso essas coisas não existam e não tenham sido vistas porque não havia o que ver. Simples também, façam a prova de que não há ocupação, assentamentos, discriminação, limpeza étnica, ou façam o bom argumento que demonstrará que essas coisas não constituem injustiças ou tragédias e, portanto, não há por que apontar para elas.
Eu disse que Duvivier se deixara arregimentar, talvez sem saber, para a defesa das causas de Israel. Digo agora, com mais ênfase: Netanyahu em pessoa não poderia esperar um melhor serviço de Duvivier se tivesse pago por ele! Afinal, um expoente da esquerda progressista foi até a Palestina, a histórica de onde milhões foram expulsos e onde hoje os não judeus têm status jurídico inferior, e a atual, ocupada, gradualmente expropriada e de onde os palestinos continuam sendo expulsos, voltou ao Brasil, resolveu escrever exatas dezoito linhas sobre o assunto e o que tinha de mais importante a dizer era a condenação do boicote!? E além disso, apenas a protocolar condenação do extremismo dos dois lados e a comparação do Hamas com o Narcotráfico?!
E mais, a essência do artigo, suportada por afirmações contidas no parágrafo final:
Fui esperando encontrar um país em guerra. Mas nem Israel nem a Palestina são menos seguros que o Brasil. Nossa polícia mata mais que a israelense. O narcotráfico mata mais que o Hamas. Nossa guerra mata numa lógica ainda mais perversa: as vítimas de ambos os lados –bandidos e policiais– são todos pobres.
é a de que não há nada demais em Israel e na Palestina, nada de tão pior do que aqui, pelo contrário… Será que Netanyahu tem algum sonho mais doce do que o de não ter ninguém olhando para o que acontece na Palestina e que aqueles que estiverem olhando digam que ali não se passa nada de estranho?
Penso estar autorizado a dizer que quem faz assim retira força da própria voz quando esta for usada para denunciar as injustiças, os extremismos, as intolerâncias. Isto por duas razões: já não posso saber se essa pessoa é capaz de ver a injustiça quando aquelas tão flagrantes da Palestina lhe escaparam aos sentidos, ou escorregaram por entre os dedos de sua tão preocupada consciência; e, pensando nos métodos que usou para fundar as suas afirmações sobre a Palestina, pergunto-me se os caminhos que percorre em direção a outras verdades são tão desprovidos de rigor.
Foi o que eu disse sobre Gregório Duvivier, que a sua voz, antes vista por mim como arguta e inteligente, tinha perdido força. Não posso dizer isso? Quem é o censor de quem, professor?
Eu não disse, contrariamente ao que diz o professor Gherman, que as opiniões de Duvivier sobre a Palestina o desqualificavam para falar de outras injustiças. Ele que fale à vontade, mas eu recomendaria mais rigor.
Eu tampouco interditei o Duvivier (não tenho poderes para isso nem tenho, como disse, a intenção), “justamente em um momento que o campo progressista mais precisa de gente como ele”. Mas, perdão, como é?! Quer dizer que o Duvivier pode dizer a bobagem que quiser sobre a Palestina, servir numa bandeja o argumento dos sonhos de Israel, e escapar à crítica porque o campo progressista precisa dele? O que exatamente esse campo progressista tem a dizer sobre a Palestina? Apenas que ele é contra a única coisa que parece colocar alguma pressão sobre a empresa colonial de Israel?! É com isto que Duvivier se faz “mais necessário hoje do que ontem”.
Duvivier não poderia ter sido mais útil a Israel se tivesse feito a sua tradicional e completa defesa. Se ele tivesse feito esse discurso, eu não teria respondido com a minha crítica, porque, justamente, não haveria o risco de alguém confundi-lo com um progressista.
Ainda sobre o que eu disse ou não disse. Eu não disse que Duvivier era autocentrado e incapaz de entender fenômenos que se passam longe dele; o professor Gherman pôs palavras na minha boca de modo injustificado.
Eu não disse que Duvivierdevia calar sobre o que não conhecia; eu disse que era sábio fazê-lo. Não é uma verdade revelada. Além de ser uma frase de efeito, é a minha opinião. Quem quiser, pode discordar. Eu o digo por uma razão simples: todos nós, quando falamos, revelamos o pouco que sabemos e o muito que ignoramos, e, assim, nos expomos à crítica. Duvivier falou mal sobre o que não conhecia suficientemente. Está autorizado a isso? Mas é claro! E está sujeito à critica? Certamente espero que sim!
Pois bem, eu o critico, por ter dito bobagem e, mais grave, por ter colocado sua voz poderosa, com a qual vem uma certa responsabilidade, a serviço de uma injustiça.
Não o faço, professor Gherman, em nome dos “filhos da luz”, seita que não conheço e à qual não pertenço.Não o faço no registro sectário e menos ainda no religioso (é excessiva a interpretação que o professor faz do meu uso de “pecado maior”).Não o faço como representante de “nós”, do “bem” e seguramente não o faço como um dos “pios”. Não o faço em nome de algum setor da esquerda ou do que chama de “suposta” esquerda. Não o faço em nome dos progressistas.
Eu não externei em qualquer momento minhas preferências políticas, minha identidade religiosa, minha crença – se alguma -, minha etnia. O senhor as adivinha por sua própria conta e risco. Essas coisas não fizeram parte dos argumentos que construí. Eu nem sequer fiz a defesa explícita do boicote, de qualquer tipo. Não o canonizei, portanto, como diz, nem chamei os professores, políticos e demais de traidores. Tampouco fiz a defesa do Hamas.
Foi o professor quem estabeleceu a separação entre o nós e o eles: eu estaria entre aqueles que se vêem sentados na “montanha da ética e da bem-aventurança… puros e … bons de espírito” e tanto o professor quanto o Duvivier estariam entre os que, injustamente acusados por nós outros de cegueira, buscam “refletir sobre a situação”. Não sei se preciso explicitar isso, mas percebam que o professor me acusa, junto com os “meus”, de não pensar. Falando, então, em arrogância…
De fato, percebo agora, toda a minha resposta talvez não precisasse conter mais do que isto: quem me acusa de dividir o mundo em dois se satisfaz com afirmar que eu não penso, e que considero o Duvivier suspeito porque ele sim pensa. Não demonstra como o meu texto faria a prova da ausência de neurônios e sinapses nesta minha cabeça, nem demonstra como o texto do Duvivier faria a prova deste pensamento superior que tanto nos assustaria.
Eu dialoguei com o texto do Duvivier, primeiro, e com o seu agora, professor, seguindo aquela regra básica que trouxe da infância. Eu tenho certeza da precisão do que digo sobre os três textos, sobre o que eles dizem e sobre o que deixam de dizer, tenho certeza da precisão do que digo sobre a ocupação e sobre as demais injustiças que aponto, e estou seguro de que as críticas que faço estão suportadas por argumentos sólidos. Penso ter demonstrado isso nestas agora sete páginas. Sete páginas de oportunidades para quem quiser quebrar a crista deste arrogante.
O senhor considera que o debate sobre a Palestina no Brasil não é saudável? Concordo. O que aconteceu com Duvivier é um tipo de abscesso que revela a doença. E eu afirmo que a minha pequena regra tem o poder de saná-lo, em parte.
Como? Esqueça a bobagem sobre os filhos da luz e os filhos da escuridão, dos pios ignorantes e dos pensadores injustiçados, dos campos e das seitas. Quer dizer que estou errado? Diga, e logo prove. Prove a falsidade do que digo ou supere a solidez dos meus argumentos com aquela dos seus. Faça isso apontando para o que eu digo e não para o que pensa de mim. Aquilo é responsabilidade minha, isto não.
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Fonte: Brasileiros.