Relatório do MP Federal aponta elos entre RBS e João Augusto Nardes

Por Marco Weissheimer

O relatório sobre investigações da operação Zelotes, que apura fraudes tributárias que teriam sido cometidas por grandes empresas do país, encaminhado pelo Ministério Público Federal ao Supremo Tribunal Federal (STF) aponta uma teia de relações entre o grupo RBS, empresas de consultoria no setor tributário e João Augusto Nardes, ex-deputado federal pelo PP-RS e atual ministro do Tribunal de Contas da União (TCU). Trechos desse relatório, divulgados na tarde desta terça-feira (11) pelo jornalista Juremir Machado da Silva, em seu blog no Correio do Povo, apresentam um mapa das relações entre alvos investigados na Operação Zelotes “relativamente à negociação e contratação de supostos serviços de consultoria visando a extinção do crédito tributário lançado no processo administrativo nº 11080.008088/2001-71”.

A origem desse processo remonta a 2001, quando a Receita Federal acusou a RBS de praticar uma operação batizada de “casa e separa”, uma associação momentânea com o objetivo de eliminar ou diminuir o pagamento de determinados tributos. Em 1999, a RBS vendeu o controle acionário do antigo portal de internet ZAZ, o segundo maior do país naquele período, para a empresa Telefônica. A Receita Federal entendeu que a sociedade firmada entre a RBS e a Telefônica foi uma operação “casa e separa” e que cerca e R$ 286 milhões teriam deixado de ser tributados em função da mesma. Teve início aí uma guerra de recursos entre o grupo RBS e a Receita Federal, com a empresa conquistando a última vitória em 2011. O palco dessas disputas foi o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), objeto de investigação da Operação Zelotes.

As investigações envolvendo a RBS

A RBS foi citada na Zelotes como uma das empresas que teriam sido beneficiadas com o esquema de tráfico de influências e venda de decisões em processos administrativos-tributários perante o CARF. Segundo o relatório do MP Federal, em virtude da vitória no CARF em 2011, a RBS pagou à Dias de Souza Advogados Associados o valor bruto de R$ 7.062.129,64. No entanto, assinala o MP, apesar de já ter contratado escritório de advocacia para a execução de assessoria jurídica no processo em questão, a RBS celebrou, em 2005, um contrato de consultoria com a SGR Consultoria Empresarial Ltda, tendo por objeto a atuação da mesma com vista a destituição dos débitos do processo administrativo contra a RBS.

As investigações, porém, não encontraram nenhum material técnico ou registro de atuação formal da SGR junto ao processo administrativo. Mesmo assim, a RBS realizou pagamentos líquidos de R$ 11.970.567,48 em quatro parcelas efetuadas entre setembro de 2011 e janeiro de 2012. A SGR, por sua vez, assinalam ainda as investigações, 19 dias depois de firmar contrato com a RBS, firmou uma parceria com a empresa N&P Consultoria e Assessoria Empresarial (atualmente Planalto Soluções e Negócios). Em razão dessa parceria, essa empresa recebeu R$ 2.556,974,00. “A SGR não efetuou os pagamentos por vias normais, preferindo utilizar-se de mecanismos de ocultação para os referidos valores”, assinala o relatório do MP Federal.

“Os elos que ligam os atores mostrados passam pela localização geográfica (naturalidade) e as ligações políticas entre eles”, aponta gráfico elaborado pelos investigadores.

“Os elos que ligam os atores mostrados passam pela localização geográfica (naturalidade) e as ligações políticas entre eles”, aponta gráfico elaborado pelos investigadores.

Como surgiu o nome de Nardes

Em março de 2005, aponta ainda a investigação, constavam no quadro de administradores da N&P Clorimar Piva, Carlos Osório Ribeiro Nardes e João Augusto Ribeiro Nardes, estes últimos irmãos. Deputado estadual duas vezes, deputado federal por três legislaturas e vice-presidente nacional do PP de 2003 até sua desfiliação, Nardes foi nomeado em 2005 para o Tribunal de Contas da União. Demonstrados os passos de contratação da consultoria (SGR) e da subsequente parceria com a empresa dos irmãos Nardes, o relatório detalha o que chama de “processo de cooptação da RBS”. “Os elos que ligam os atores mostrados passam pela localização geográfica (naturalidade) e as ligações políticas entre eles”, diz o documento.

Nardes, acrescenta, “possuía bom trânsito perante a RBS, inclusive se utilizando dos microfones das emissoras do grupo quando almejava aparecer na mídia”. Ainda segundo o MP Federal, as evidências mostram que, pela intermediação do contrato com a SGR, Nardes receberia parte do valor do contrato. “A participação na divisão dos valores se cristalizou na formalização da parceria com a empresa familiar de Nardes”, afirma o relatório, que acrescenta: “A participação de João Augusto Nardes é confirmada pela informação de entrega de altos valores ao ministro após o julgamento definitivo da lide”.

Quando o seu nome veio à tona no contexto das investigações da Operação Zelotes, Nardes negou qualquer envolvimento no caso investigado, sustentando que, no período em questão, o sobrinho, o advogado Carlos Juliano Ribeiro Nardes, era sócio da empresa citada, da qual ele teria se desligado formalmente em 2005, antes de tomar posse no TCU. O MP Federal, por sua vez, afirma, citando o Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), que Carlos Juliano Nardes só ingressou no quadro da empresa em setembro de 2008.

Como nasceu a Operação Zelotes

A Operação Zelotes foi desencadeada no dia 28 de março por diversos órgãos federais para desbaratar um esquema de fraudes tributárias envolvendo grandes empresas brasileiras e multinacionais. As investigações foram conduzidas por uma força-tarefa formada pela Receita Federal, Polícia Federal, Ministério Público Federal e Corregedoria do Ministério da Fazenda. O Grupo RBS, a Gerdau, os bancos Bradesco, Santander, Safra, Pontual e Bank Boston, as montadoras Ford e Mitsubishi e um grupo de outras grandes empresas estão sendo investigados pela suspeita de pagamento de propina a integrantes do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais para anular multas tributárias milionárias.

A Polícia Federal teria encontrado fortes indícios de que ao menos 12 empresas negociaram ou pagaram propina para reduzir e, em alguns casos, zerar completamente dívidas com a Receita Federal. Entre os crimes investigados na Zelotes, estão advocacia administrativa, tráfico de influência, corrupção, associação criminosa e lavagem de dinheiro. Segundo o Ministério da Fazenda, o esquema envolveria a contratação de empresas de consultoria que, mediante trânsito facilitado junto ao Conselho, conseguiam controlar o resultado do julgamento de forma a favorecer o contribuinte autuado. Constatou-se que muitas dessas consultorias tinham como sócios conselheiros ou ex-conselheiros do CARF. Segundo as investigações feitas até aqui, mais de 70 processos tributários podem ter sido fraudados, com um prejuízo superior a R$ 19 bilhões aos cofres públicos. Os casos que estão sob investigação teriam ocorrido entre os anos de 2005 e 2015.

A transmutação da Zelotes

Após um período de silêncio midiático, a operação ressurgiu com força nas manchetes no final de outubro, com uma curiosa transmutação: os nomes dessas empresas saíram do noticiário e a Zelotes passou a investigar Luis Cláudio Lula da Silva, filho do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. No dia 26 de outubro, a Polícia Federal, a Receita Federal e o Ministério Público Federal deflagraram a terceira fase da Zelotes, com uma pauta diferente da denúncia de pagamento de propinas para integrantes do CARF para abater dívidas de grandes empresas com a Receita Federal.

A ação da Polícia Federal junto à empresa do filho de Lula fez a Zelotes voltar para os holofotes do Jornal Nacional. Com uma diferença. O nome das até então denunciadas RBS, Gerdau, Banco Safra, etc. saiu de cena, dando espaço para “o filho de Lula”.

Fonte: Sul21

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