Ex- presos em Guantánamo rezam frente a embaixada EUA em Montevidéu.
Por Fernando Moyano.*
No final de 2014, terminando sua presidência, José “Pepe” Mujica anuncia sua decisão de receber no Uruguai seis prisioneiros de Guantánamo. Eles tinham estado lá doze ou treze anos, mais ou menos o tempo que Mujica e muitos outros uruguaios (alguns agora no governo) estiveram nas prisões da ditadura militar de 1973-1985.
Em plena campanha eleitoral em que a Frente Ampla lutava por seu terceiro governo, a medida foi violentamente rejeitada pelos partidos da oposição, mesmo dizendo que era “prestação de serviço para os Estados Unidos”. Em seu estilo pessoal, Mujica os chamou de “almas podres”. Desta vez estava certo.
Um acordo com a administração de Obama pode levantar suspeitas, mas a solidariedade vem primeiro, ainda mais em um país formado com imigrantes expulsos de todos os continentes.
Ficou perfeitamente claro que nenhum dos seis estavam sendo acusados de nada. Foram sequestrados, detidos e torturados por mais de uma década. Hoje os EUA não aceita qualquer responsabilidade ou obrigação de reparar; as Nações Unidas lava as mãos.
A recepção no Uruguai foi mal implementada pelo governo que saiu, deixando os ex-prisioneiros em situação precária. E quem o substituiu – Tabaré Vázquez, também da FA, ambos pró-capitalistas, mas este último muito mais preocupado em não incomodar os Yankees – decidiu corrigir jogando a criança com a água suja do banho: “Uruguai não vai receber mais refugiados de Guantánamo”. Isso desestimula outros governos e ajuda a manter a prisão de Guantánamo.
Foi a central sindical nacional, o PIT-CNT, que resolveu e contribuiu com moradia para os refugiados, mas problemas com o idioma, cuidados médicos, adaptação, dificuldades em encontrar trabalho e estabelecer-se, excede suas possibilidades.
Três semanas estiveram os ex-presos acampados em protesto na frente da embaixada dos Estados Unidos em Montevidéu. Eles receberam a solidariedade dos vizinhos da área e as organizações sociais. O governo condicionou a ajuda à assinatura de um acordo em um idioma desconhecido dos refugiados e sem sequer contar com um advogado assessor. Os ex-presos recusaram.
Depois de três semanas de negociações em que algumas destas deficiências e omissões foram levantadas, foi assinado um acordo. Uruguai assume os custos e os refugiados encerraram seu protesto, embora eles vão continuar com a sua reclamação com os EUA.
Depois de superar a situação, permanecem na história inacabada dois sabores contrastantes. A solidariedade internacional deve continuar. A mesquinharia pode chegar a extremos vergonhosos.
*De Montevidéu especial para desacato.info