Chuva. Por Roberto Liebgott.

Por Roberto Liebgott.

Lembro bem – desde criança – que a chuva, quando dela falávamos, ou esperávamos a sua vinda, ela representava uma dádiva divina.

E, para nosso sono, era uma cantiga de ninar, mesmo se o lugar de morar fosse nas margens de rios, nas encostas de morros, nas grandes várzeas ou nas cidades.

A chuva era bênção que caia dos céus pra regar o solo, dar de beber às pessoas, às plantas, aos animais, enchia os rios e lagos e nos fazia felizes.

Brincar na chuva, correr molhando os pés, rolar na grama encharcada, jogar futebol, tudo, por causa dela, se transformava em gritarias, gargalhadas e nos tornava, uns aos outros, mais iguais.

Na sua ausência, em poucos dias, sentíamos muito a sua falta, pois logo vinha a poeira que ficava agarrada em nossos cabelos, sujava as toalhas no varal e dava uma sensação de penúria.

Certamente, em alguns lugares do mundo deve ainda ser assim, onde há saudade pela sua ausência, mas no sul do Brasil, a chuva deixou de ser sorrisos e esperanças.

Ela, agora, se soma às dores e lágrimas de quem tudo perde, pois tudo acaba em lama e destruição e ela deixa de ser uma cantiga de ninar, tornando-se medo e desespero.

Não há mais alegria com a chuva, as pessoas fogem, precisam abandonar suas casas, correm desesperadas porque a várzea, as casas, as beiradas são inundadas com força avassaladora.

A chuva torna-se mortal, mas sabemos, eu sei, a culpa não é dela, mas da gente, já que mudamos, por cobiça e ambição, os ciclos do tempo e das estações, devastamos a mãe terra e contaminamos o ar.

Poluídos e envenenamos os rios, fizemos barragens em excesso, arrancamos todas as árvores nativas, no lugar plantamos vegetação exótica e contaminamos os ambientes de ser e viver.

A culpa não é da chuva, mas temos pânico de sua força arrebatadora e não sabemos quando a existência humana voltará à normalidade, talvez nunca.

Porto Alegre (RS), 02 de maio de 2024

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