A democracia representativa burguesa

    Por Nelson A. Garcia Santos.

    Reflexões acerca das eleições municipais, sob a ótica da Sociologia e da Filosofia.

    Vários são os aspectos que poderiam ser abordados ao refletirmos sobre as eleições deste ano em Santa Catarina e em Blumenau, especificamente. Poder-se-ia, quem sabe, tecer  considerações sobre o caráter conservador do eleitorado que elegeu, para o governo estadual e  municipal, duas lideranças oriundas dos posicionamentos político e partidário que representam o conservadorismo, o antigo coronelismo e o atraso político próprios do Partido Democratas. O caráter conservador do eleitorado catarinense e blumenauense fica evidenciado na maioria dos votos dados ao então candidato José Serra na última eleição para presidente da república. Mas esta é uma discussão longa e que poderia irritar muita gente. Por isso, vou me deter em alguns aspectos qualitativos e quantitativos da nossa aldeia (como diz o amigo e professor Ivo Theis) obtidos no Tribunal Superior Eleitoral, para demonstrar que a democracia vivida ainda está longe de ser ampla, participativa e de alta intensidade e que, na realidade, vive-se uma democracia representativa classista, machista, de baixa participação e representação e, portanto, de baixíssima intensidade.

    Em Santa Catarina, nestas eleições municipais de 2012, 16.743 seres humanos, estão aptos a concorrer ao cargo de vereador/a, sendo 67,47% homens e 32,53% mulheres. Para o cargo de prefeito 618 candidatos estão aptos para a disputa e para o de vice-prefeito 596 candidatos se encontram em condições para participar do pleito. Entre os que concorrem ao cargo de prefeito 90,88% são homens e 9,12% mulheres. Já ao cargo de vice-prefeito 87,51% são do gênero masculino e 12,49% feminino. Além da pouca participação das mulheres na democracia representativa burguesa, outra característica do processo eleitoral é o baixo número de participantes como candidatos aos respectivos cargos. A população estadual total está estimada em 6.138.320 habitantes. Desta, 77,20% podem votar e serem votados, porém, apenas 0,35% está participando como candidato/a a vereança. Para o cargo de prefeito, o percentual é 0,013% da população eleitora de Santa Catarina.

    Em Blumenau, cerca de 230.064 pessoas podem participar do processo eleitoral. Entretanto, menos de 0,1% está participando como candidato/a ao cargo de vereador/a. A quantidade cadeiras na Câmara Legislativa é 15 e isso significa que apenas 0,0065% dos cidadãos/ãs da nossa aldeia serão os efetivos representantes e estarão decidindo sobre o nosso presente e futuro no âmbito da vereança. Assim, nesta relação entre os 212 candidatos a uma das 15 cadeiras na Câmara, temos uma disputa de 13,53 candidatos por vaga, mas que só é aparentemente alta, devido ao baixíssimo número da representação no poder legislativo.

    Baixo número de representantes e de representação são características da democracia de baixa intensidade. Nesta disputa, 69,12% são homens e 30,88% são mulheres, Para os cargos de prefeito e vice-prefeito de Blumenau, oito pessoas se candidataram, sendo que apenas uma é mulher, corroborando, assim o baixo índice de mulheres no processo democrático atual.

    A baixa representatividade e a baixa representação nos cargos eletivos ficam manifestas, também, ao observarmos a disputa por vagas que se torna aparentemente alta devido ao baixo número de cadeiras na Câmara de vereadores, nos outros dois maiores colégios eleitorais de Santa Catarina e também em alguns municípios da nossa região do médio Vale do Itajaí. Em Florianópolis, a disputa

    é de 16 candidatos por vaga e em Joinville é de 18,5. Já na região do médio Vale do Itajaí, o município que tem mais candidatos por vaga, depois de Blumenau, é Itajaí com 12,7 candidatos. Subindo o rio, tem-se Ilhota com 4,6 candidatos por vaga, Gaspar com 9,5, Indaial com 8,5 e Pomerode com 8,0 candidatos por vaga. Esse fato caracteriza uma grande contradição da democracia representativa, já que esta se fundamenta na participação e na representação, ou seja, quanto mais representantes se tem e quanto maior o número de pessoas que buscam ser representantes, maior a intensidade da democracia.

    Outro aspecto que corrobora o caráter de uma democracia de baixa intensidade no processo eleitoral, diz respeito ao tempo de mídia que os candidatos têm. A disparidade é enorme, onde uns tem tempo demais e outros quase não têm tempo algum. Além disso, o domínio econômico da classe dominante prevalece no processo eleitoral e deixa evidente o caráter de classe no nosso modelo burguês de democracia representativa de baixa intensidade.

    Quanto aos conteúdos dos programas eleitorais, vemos situações que politicamente são incorretas na medida em que as propostas dos candidatos ficam em segundo plano; a identificação partidária e suas respectivas coligações não são apresentadas e muito menos justificadas, não permitindo, assim, que os eleitores façam relações entre os partidos e seus candidatos. Nos programas, não se relaciona seres humanos com partidos políticos e, ao não mencionar os partidos, não se conhece as propostas dos partidos. Assim, a base partidária da democracia representativa fica enfraquecida, pois, não se discute a quem e quais os interesses que o partido representa.

    Entretanto, em se tratando de marketing e publicidade, os programas são fascinantes. Com imagens áreas dos principais pontos da cidade, com entrevistas externas e com efeitos gráficos especiais – recursos nada baratos -, as campanhas mais ricas transformam os reais problemas da cidade em sonhos que serão realizados com a vitória do/a candidato/a, cujo conteúdo não vai além de velhos clichês da política local e nacional. Pelo programa da coligação cujo slogan é “Blumenau quer seguir em frente”, a tradição, a família e a propriedade – símbolos do conservadorismo brasileiro – são agora apresentados como elementos do progressismo expressos nas mensagens. Por sua vez o velho populismo da política brasileira é modernizado pelo slogan “quem ama cuida”, no qual, além de mexer com a afetividade e emoção dos eleitores, transforma a candidata em mãe de todos/as e não em prefeita da cidade. Já a lógica do mais capitalista se torna sustentável nas mensagens exibidas pelos programas da coligação “Blumenau quer mais”. Todos estes programas abordam muito mais o sonho do que a realidade de fato.

    Finalmente, a campanha cujo slogan é “Blumenau para os trabalhadores”, não consegue, pelo pouco tempo, falta de recursos e de criatividade, mostrar a realidade concreta da situação dos trabalhadores de Blumenau e nem efetivas propostas do campo da esquerda para o município. Assim, segue-se nos caminhos da democracia representativa burguesa em nossa aldeia, na qual o conservadorismo, o machismo e o domínio de classe perpetuam a democracia de baixíssima intensidade. Cabe então, a cada um/a refletir sobre a continuidade ou não deste modelo de democracia representativa, aceitando-a ou negando- a e, a partir de então, efetivar ações que concretizem sua opção.

    Fonte: Revista Expressão Universitária da FURB 

    Imagem: DC.

    DEIXE UMA RESPOSTA

    Please enter your comment!
    Please enter your name here

    Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.