Florianópolis vive uma situação política complexa. Milhares de pessoas votarão no segundo turno da eleição municipal por obrigação, estimuladas pela “mídia governante” e pela campanha que vários setores do poder fazem contra a abstenção e o Voto Nulo.
O baixíssimo nível dos debates, por chamá-los de algum modo, e a deflagração do pleito nacional e estadual de 2014 a partir de agora, são as molduras de um quadro reprovável, com propostas esvaziadas de sentido, uma dificuldade grande dos dois candidatos para distanciar-se de sua história política recente, e um descrédito claro da comunidade no projeto de continuidade que ambos representam.
Acordos de última hora podem colocar no tapete um leilão de secretarias, instituições, conselhos e demais órbitas municipais. Também, é claro, a seleção de quadros para a disputa de 2014. Quadros de longa trajetória ficaram de fora da Câmara de Vereadores e podem surgir em coordenações, espaços culturais, garantindo salário e nome na praça política. Dois marcos de alianças, uma em favor da reeleição de Raimundo Colombo, e outra que patrocine a candidatura de Dário Berger, ambos para o governo do Estado, mais cargos federais e estaduais, determinam um segundo turno afastado da vida real da cidade.
Pouco tem a ver o cidadão de Florianópolis com o que se conversa, negocia e decide afoitamente entre as cúpulas partidárias. O momento é particularmente difícil, pois há debates intensos na cidade com relação à reforma urbana, ao transporte público, à péssima qualidade na educação, à moradia e ao meio-ambiente. A disputa do solo e do espaço público começa a ganhar espaço na mídia independente e será impossível de ocultar pela “mídia oficial” que determina, ainda, condutas e define o que é certo ou errado. Ontem, a Marcha da Insatisfação, a primeira desse tipo, a poucas horas do segundo turno deixou bem claro esse cenário.
Na esteira dessa conjuntura municipal também ficou claro que o Voto Nulo, além de significar um voto de protesto, pode tomar o contorno de um voto de advertência. O cidadão de Florianópolis começa a tomar distância das decisões das direções partidárias e dos cantos de sereia da RBS e redes menores, e está disposto a se lançar à rua para pedir o que lhe é de direito. Quem paga o salário dos políticos profissionalizados no exercício do Executivo e do Legislativo Municipal é o morador de Florianópolis. Se ele se distanciar de um mandato de prefeito que já começará enfraquecido pelo índice de votação do próprio primeiro turno, com um alto nível de abstenções e votos nulos, pode tornar desde o início, muito dura a vida do Executivo Municipal. As demandas crescem, a população se mobilizou com intensidade neste último semestre, e ontem, surpreendeu aos núcleos do poder, com moradores, desalojados e estudantes, marchando insatisfeitos pelo Centro da cidade.
Uma declaração manifesta de insatisfação, que começou com consignas espontâneas, que não teve uma organização centralizada, que não foi patrocinada nem por partidos nem por sindicatos, significa uma advertência clara para quem assumir o governo municipal. Quem lá estava percebeu que o que começou com reclamos concretos por moradia, transporte, educação e segurança, terminou numa aclamação contundente em favor do Voto Nulo, qualificando esse voto como uma decisão política responsável, crítica e um sinal inequívoco, de que há necessidade de que o poder público atue como tal, e não como gerente dos interesses privados. Protesto e advertência são a marca deste Voto Nulo que, talvez configure a marca diferente desta eleição tão desprovida de ideias e propostas sérias.
Fotos: Eduardo Valente.