Após o massacre na escola primária de Newtown, Connecticut que exterminou as vidas de 20 crianças (de seis e sete anos) e seis adultos, (entre eles a própria mãe do atirador) tentativas surgem em prol de justificar uma sociedade doentia que crê em um diagnóstico pautado na anormalidade de um indivíduo como resposta para um fato atroz (entre outros tantos, principalmente nos Estados Unidos) que envolve muito mais que uma suposta doença mental.
Não entendo o que significa tal anormalidade descrita por diagnósticos conjuntos diversos, supervalorizado e legitimado pela descultura midiática criminosa – amiga do medo – por proliferar informações reducionistas de cunho sensacionalista. Apontar o problema do outro sempre é mais fácil do que operar no sentido de fazer apontamentos e correções em sua própria postura.
Quando o Sr. Presidente dos Estados Unidos diz que para evitar mais ataques é adotar medidas “que podem proteger tanto os nossos direitos quanto as nossas crianças”, não entendo o que ele quer dizer. Que direito é esse, que em nome de Deus se mata, em nome de justiça se mata, e em nome de segurança se mata? Segurança de quem contra quem? Se a sociedade precisa agir contra alguém, não será contra ela própria? Ao que ela criou? Se em nome de qualquer interesse mínimo se mata e se justifica, em prol da ganância e do poder então nem posso abarcar, mas entendo que por meio delas se criam estruturas desagregadoras e desigualitárias, onde vidas estão implicadas. Que jogo é esse onde as crianças somente espelham a própria estrutura de um sistema que cria sempre refugo social? Na facilidade da solução imediata procura-se agir contra o refugo, o descarte, porque ele tira a ordem do modelo que é preciso justificar e seguir. Ordem incoerente que se alimenta do que é mais incoerente e contraditório a si mesmo. Nexo sem nexo.
Não é dificultar o acesso às armas que evitará tragédias (como sugere o Sr. Presidente), é facilitar acesso às necessidades humanas de modo a criar estruturas agregadoras entre Estado e família, porque da desigualdade nasce a pior de todas as tragédias – a miséria humana. É desumanizando o homem que se justificam essas tragédias e nada se faz, pois fazer algo significa agir contra sua própria lógica, que não é lógica e sim invenção de uma lógica adequada e conveniente.
Wayne La Pierre, vice-presidente executivo do grupo NRA, afirmou que “A verdade é que nossa sociedade é habitada por um número não conhecido de genuínos monstros”. Lógica sem lógica. São os monstros que são culpados e não quem os criam? A segunda afirmação absurda do Sr. La Pierre é dizer que só uma pessoa boa armada para ir contra uma má pessoa armada. Isso que dizer que o que assegura a vida de uma criança é uma boa pessoa armada porque ela pode matar uma má pessoa armada? Depois de ler e ouvir essas “verdades-bárbaras”, ainda continuo não compreendendo quando os Homens do Poder dizem que é preciso evitar tragédias, sendo que o mais trágico é o descaso com a humanidade, ao impor como regra a desigualdade, não assegurando a própria condição “humana de humanidade”. Se nos ouvem Homens do Poder, eu lhes digo: se querem evitar tragédias, não nos roubem a dignidade – que assim fazes quando ignora-nos – e se o fazes, não venhas depois nos exigir e nos culpar.
Termino o texto sugerindo uma bela música: Bring Him Home (de Les Misérables) – interpretada por ThePianoGuys, de modo a refletirmos a necessidade de nos questionar mais sobre as atrocidades do cotidiano que nos afeta e afeta a nossa condição como seres humanos e pensantes.
Bring Him Home: http://www.youtube.com/watch?v=5mJ08-pyDLg
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