A Câmara dos Vereadores de Campinas, cidade do interior de São Paulo, aprovou em primeiro turno de votações o projeto “Escola sem Partido”, que impõe uma série de regras e restrições aos professores em sala de aula. A proposta foi apresentada pelo vereador Tenente Santini (PSD), que é ex-policial militar, e obteve 25 votos favoráveis contra cinco. Foram mais de três horas de discussões sobre o tema na noite de segunda-feira (4).
Agora, como tramita em regime de urgência, a proposta deve passar por nova votação já na segunda-feira (11). Para a oposição, o projeto é ilegal e atenta contra a liberdade de cátedra do professor. De acordo com o texto, os professores ficam proibidos de expressar opiniões e até mesmo de abordar certos temas. “Os viúvos da ditadura militar precisam entender que essa Constituição valoriza o estado democrático de direito”, disse o vereador oposicionista Gustavo Petta (PCdoB).
Outro projeto, chamado de “Escola sem Censura”, de autoria da vereadora Mariana Conti (Psol), chegou a ser discutido na pauta da Casa, entretanto, foi arquivado. A proposta antagônica, que pretendia “vedar qualquer tipo de censura de natureza política, ideológica, filosófica, artística, religiosa e cultural a estudantes e professores” não obteve parecer de legalidade da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, por “já existir matéria correlata”, no caso o “Escola sem Partido”.
O professor de sociologia da rede estadual de ensino Danilo Magrão esteve na Câmara durante a votação e relata como seguiu o debate. “Toda a aprovação foi um completo absurdo. Primeiro, porque entrou com regime de urgência, mostrando que essa Casa está pouco se importando para os problemas da população e muito mais interessada em atacar a educação. Segundo, porque foi um show de ódio destilado”, disse.
“O vereador Campos Filho (DEM) chegou a chamar a Simone de Beauvoir (filosofa e escritora feminista do início do século 20) de ‘devassa’. Essa é a misoginia e o machismo desses vereadores de uma cidade que, infelizmente, é conhecida por casos de feminicídio. Além disso, esses vereadores trouxeram de São Paulo integrantes de setores abertamente fascistas que provocaram, agrediram e ameaçaram diversos professores e estudantes que estiveram lá”, completou o professor.
Entre os grupos que estiveram lá para defender o projeto que censura os professores está o Movimento Brasil Livre (MBL) e o Endireita São Paulo, que defende os ditadores do regime militar(1964-1985). “Chegando lá, encontramos os dois grupos da extrema direita, que falaram vários absurdos para nós, como acusaram militantes negros de serem bandidos. Eles ainda tiveram apoio de alguns vereadores dessa Câmara ultrarreacionária”, afirmou a estudante da Unicamp Flávia Telles, que também esteve presente.
“O autor da proposta, o Tenente Santini, utiliza a falácia de um discurso de neutralidade, mas sabemos de suas mentiras. O fim de sua fala, ele chegou até a bater continência. Esse projeto quer censurar professores e estudantes para que não tenhamos pensamento crítico nem debates de gênero ou de questões raciais e sociais. Ainda estamos sendo expostos na página do MBL com vários comentários absurdos”, completou a estudante.
Os defensores da proposta afirmam que os professores não devem interferir na formação do aluno, além da passagem simples do conteúdo. “A escola é lugar de aprender, de preparar o aluno para o mercado de trabalho. Os pais e avós não podem perder o direito de educar seus filhos conforme os preceitos de suas famílias”, disse o Tenente, que trabalhou na Rota da capital e foi um dos fundadores de um comando similar de Campinas, o Baep.
“Todos os professores de Campinas, junto com alunos de escolas públicas e privadas, alunos de universidades, trabalhadores, precisamos nos unir contra esse projeto absurdo. Escola do debate é escola sem tenente, escola com livre discussão e, por isso, vamos com todas as forças lutar contra esse projeto absurdo que além de tudo é inconstitucional por atacar uma série de direitos nossos”, finalizou o professor Magrão.
Fonte: RBA