Por Lidiane Ramos Leal, para Desacato.info.
No domingo dia (19), o Ministério do Desenvolvimento Social e Combate á Fome – MDS divulgou nota de esclarecimento a respeito de boatos pertinentes à suspensão do Programa Bolsa Família. De imediato uma série de piadas preconceituosas contra os usuários do programa foram lançadas na internet.
O mais preocupante é perceber que grande parte desses disseminadores preconceituosos pertencem a classe média, a mesma classe explorada pela burguesia que se aproveita dessas mentalidades formadas pela mídia monopólica para perpetuarem sua posição social. A alienação política faz acreditar que todo investimento na classe trabalhadora é um gasto social e que está saindo diretamente do bolso do dito “trabalhador” para sustentar o malandro que não se esforça para “ser alguém na vida”. Nessa linha, uma apresentadora de televisão teve seus minutos de fama e de louvor na internet (através de compartilhamento do vídeo que mostra sua opinião) onde reafirmou a lógica conservadora de que os usuários do Programa Bolsa Família são vagabundos e dependentes de esmola e ainda ameaçou “um dia o poço pode secar”.
As pessoas que compartilharam críticas aos usuários do Bolsa Família taxando-os de malandros e dependentes do governo, são as mesmas que criticam o governo pela política de assistência social dizendo que é uma política assistencialista, clientelista e outros adjetivos que muitos deles, certamente, nem sabem o que significa. Bom, o mais curioso e intrigante que observei é que são exatamente as mesmas pessoas que compartilharam alegremente a notícia publicada no portal do PSDB de uma declaração do Aécio Neves em um programa de televisão alegando que “Se tivéssemos um jeito de tirar o Bolsa Família, pegar no berço e fazer o exame de DNA, veríamos que o pai dele é o PSDB”, disse o senador. Na opinião dele, “o governo Lula (2003-2010) apenas unificou programas tucanos como o Bolsa Escola e o Auxílio-Gás, entre outros e rebatizou tudo como Bolsa Família.” Bom, essa é a opinião dele, é claro.
No governo de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), a equipe de formulação do Plano Diretor da Reforma do Estado foi dirigida por Bresser Pereira, para ele a disciplina fiscal, a privatização, bem como, a liberalização comercial, são pontos fundamentais para alcançar-se um Estado social-liberal, não sem antes passar pelo Estado mínimo, Estado social-burocrático e o Estado neoliberal. Nessa linha de raciocínio Bresser Pereira defende que cabe ao Estado um papel coordenador suplementar. Sendo assim, o lugar da política social no Estado social-liberal é deslocado: os serviços de saúde, educação e a própria área social, são contratados e executados por organizações públicas não-estatais, ditas competitivas. Conforme analisa Behring (2008) esteve em curso no Brasil dos anos 1990 uma contra-reforma do Estado, e não uma “reforma”, como defendem seus idealizadores. Uma contra-reforma composta por um conjunto de mudanças estruturais de cunho regressivo no que diz respeito aos trabalhadores e a massa da população brasileira, que foram também antinacionais e antidemocráticas.
Em 1995 Fernando Henrique Cardoso cria o Programa Comunidade Solidária que é a principal proposta de ação social desse governo. Esse programa transferia a execução dos projetos sociais para a chamada sociedade civil organizada, por intermédio de organizações não governamentais. Dessa forma, o governo repassava recursos para essas organizações para que executassem políticas sociais. Uma das bases desse programa é a retomada da lógica da solidariedade, onde a presença massiva do voluntariado remetia no intuito de redução do gasto social. Para, além disso, as políticas desenvolvidas priorizavam a focalização, a pulverização no emergencial, desse modo, sendo ineficaz no sentido de combate a pauperização.
Ainda no período de Fernando Henrique Cardoso foi criado em 2001, o Programa Bolsa-Escola, com valor de R$ 15,00 com o limite de R$ 45,00. O programa era configurado como universal, no entanto, os municípios tinham cotas fixas de número de usuários que podiam acessá-lo. Em 2001, foi criado o Programa Bolsa Alimentação, atendia gestantes, e crianças até 6 anos de idade. Ainda em 2001, foi criado o Agente Jovem de Desenvolvimento Humano, para jovens entre 15 e 17 anos de idade, preferencialmente que não estivem matriculados na escola, com renda per capita de até meio salário mínimo e em situação de risco social, o valor da bolsa era de R$ 60,00. Em 2002, o governo cria o Auxílio Gás, atendia famílias consideradas pobres. O fato é que como resultado da gestão do Fernando Henrique Cardoso, com suas políticas fragmentadas e ineficientes no sentido de combate a pobreza, tivemos um salto na pauperização como reflexo da redução dos direitos sociais e a perpetuação do modelo neoliberal.
Nessa conjuntura específica de desconstrução do Estado e agudização intencional da pobreza, Luis Inácio Lula da Silva assume a presidência em 2003, e de imediato toma providências acerca da política de assistência social. O Programa Bolsa Família é a principal proposta de combate a desigualdade social que assola nosso país. É um programa que atua em todo território brasileiro, e atende um público de mais de treze milhões de famílias. O programa apresenta três eixos principais: a transferência de renda, condicionalidades e programas complementares.
Conforme explica a Política Nacional de Assistência Social – PNAS (2004), o Sistema Único de Assistência Social – SUAS define e organiza os elementos essenciais e imprescindíveis à execução da política de Assistência Social tornando possível a normatização dos padrões nos serviços, qualidade no atendimento, indicadores de avaliação e resultados, nomenclatura dos serviços e da rede socioassistencial e, ainda os eixos estruturantes e de subsistemas.
Uma vez que não há argumentos plausíveis para assemelhar um governo com o outro no que diz respeito a política de assistência social, o que devemos questionar é a disposição e o interesse dos municípios e estados através de seus gestores (muitas vezes com viés ideológicos diferentes do que é proposto pelo SUAS) de implantar uma política que de fato priorize a ruptura do legado da precarização dos serviços. De modo que trabalhem com vistas a implantar medidas de proteção socioassistencial dotado de estratégias que promovam a participação da população em espaços que definam suas demandas.
O SUAS marca a consolidação da assistência social como política pública, o cenário ainda sofre os preconceitos de uma sociedade cindida por interesses particularistas, desinformada dos termos do debate acerca da necessidade da igualdade social e do acesso a riqueza socialmente produzida. A sociedade reproduz o discurso de que é necessário que a família desempenhe com êxito as suas funções, ou seja, aos olhos da sociedade amparada pela ideologia burguesa, cabe à família tornar-se independente do Estado, que por sua vez acaba naturalizando a desigualdade social. Essa delegação de responsabilidades é um grande argumento para a perpetuação do sistema vigente, que é claramente contrário ao combate a questão social.
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