Poucas horas depois de assinado o acordo de 3 mil milhões para conter fluxo de refugiados, centenas de sírios, iraquianos, afegãos e iranianos foram detidos pela guarda costeira da Turquia, quando se preparavam para viajar para a Grécia. Amnistia Internacional considera operação desta segunda-feira “ilegal e inconsciente” e “uma mancha na consciência da UE”.
A detenção de 1300 pessoas que ocorreu em Ayvac?k, na costa da Turquia, esta segunda-feira, é já considerada a maior captura em massa de refugiados dos últimos meses, indica o jornal inglês The Guardian. A operação resulta do acordo firmado no domingo passado, em Bruxelas, entre o Governo turco e os chefes de Estado e de Governo da União Europeia. Entre promessas de um acordo abrangente e de um novo fôlego para o processo de adesão da Turquia à UE, o principal objectivo é claro e de curto prazo: dar três mil milhões de euros ao Governo de Ahmet Davutoglu em troca de um plano que possa “conter” refugiados em território turco e reforçar o controlo das fronteiras do país com a Grécia e com a Bulgária.
Segundo a agência turca Anadolu, citada pelo Público, a guarda costeira turca capturou e deteve centenas de sírios e iraquianos, a quem a União Europeia reconhece estatuto de refugiado na esmagadora maioria dos casos, assim como afegãos e iranianos. Para além deles, a guarda costeira turca capturou três alegados traficantes, quatro barcos e seis motores. As pessoas serão agora enviadas para um centro de repatriamento e avaliados os seus pedidos de asilo, embora parte dos detidos arrisque a deportação.
A operação aconteceu em Ayvacik, um dos principais pontos de partida para a Europa desde a Turquia, dada a proximidade com a ilha grega de Lesbos, onde, só neste ano, já entraram mais de 400 mil refugiados.
Segundo uma reportagem do The Guardian, fechar os olhos ao tráfico de pessoas pelo Mediterrâneo é prática corrente das autoridades na Turquia. Há até registo de gabinetes de traficantes a apenas alguns metros de esquadras da polícia turca. Porém, a operação de segunda-feira, não acontece por acaso e parece ser a resposta rápida ao acordo assinado com a UE. Os líderes europeus comprometeram-se a também eliminar os vistos de turismo para cidadãos turcos em 2016 e a relançar o processo de integração da Turquia na comunidade europeia. Em troca, o Governo de Ancara prometeu reduzir a chegada de refugiados à Europa e ser mais vigilante na proteção das suas fronteiras.
As organizações humanitárias consideram a detenção em Ayvac?k um reflexo preocupante do acordo com a Europa. A Amnistia Internacional considera a operação “ilegal e inconsciente” e “uma mancha na consciência da UE”, cita o Público, e encara cepticamente o acordo, em conjunto com outras organizações humanitárias. O perigo é que o acordo venha então colocar em perigo as vidas de milhares de refugiados que terão de recorrer a métodos mais arriscados para chegar à Europa.
Em declarações ao The Guardian, Melanie Ward, uma das diretoras do Comité Internacional de Resgate, do Reino Unido, afirmou que o acordo entre a Turquia e a EU “é profundamente preocupante, porque está concebido acima de tudo para obstruir o movimento dos que procuram asilo na União Europeia e porque contraria os princípios fundadores da União”. Além disto, “este acordo só vai fazer com que fique mais caro e perigoso para os que estão determinados a prosseguir a sua viagem para a Europa”, concluiu.
Segundo o jornal inglês, a Turquia é o principal local de asilo para refugiados sírios e estima-se que abrigue já entre 1,8 milhões e 2,2 milhões. A maioria deles não têm o direito a trabalhar legalmente, um fator citado por muitos refugiados como a razão para sair e procurar outros países na Europa. Muitos sírios trabalham ilegalmente para sustentar as suas famílias e acabam explorados pelos seus empregadores. “Eu trabalhei por três meses e nunca fui pago uma única vez”, declarou um refugiado sírio ao Guardian, que pediu para não ser identificado. “Por isso, eu quero sair, para que eu possa viver com dignidade”.
Mais de 880 mil pessoas chegaram à Europa pelo Mediterrâneo neste ano, segundo estimativa do Alto-Comissariado para os Refugiados da ONU. Mais de 730 mil chegam à Grécia vindos da Turquia e sabe-se que mais de 3500 pessoas já morreram a fazerem esta travessia.
Fonte: Esquerda.net.