Ontem, 17 de agosto, dia em que encerrou a consulta pública que analisou a proposta de privatização do setor elétrico nacional, elaborada pelo Ministério das Minas e Energia, trabalhadores e trabalhadoras da Eletrosul realizaram uma roda de conversa sobre o assunto na Sede da empresa. Em princípio a proposta é rejeitada por todos pela sua ótica mercantilista, que destrói as empresas públicas e a soberania nacional, uma vez que trata da questão energética.
No início do bate papo os trabalhadores assistiram a um vídeo que circula nas redes sociais em que o ex-presidente da república, Fernando Henrique Cardoso, fala ao atual presidente da Eletrobras, Wilson Pinto Jr, sobre a privatização da Eletrosul, promovida por ele na década de 1990. Segundo FHC, a privatização da Eletrosul só foi possível porque, na região Sul do Brasil à época, as forças políticas não estavam incrustadas na empresa a ponto de evitar o processo. “Foi impossível fazer a privatização em outras empresas do setor, pois os condomínios políticos eram muito fortes. Os interesses políticos e a burocracia estatal eram muito forte. Basta lembrar que na campanha seguinte para presidente o candidato do meu partido tinha um discurso não privatista. Esta é uma luta permanente na sociedade e estamos num momento de mobilização forte: o que puder privatiza, privatiza tudo, não tem mais jeito”, disse FHC.
A fala privatista de FHC vai ao encontro de seu interlocutor naquele momento, Pinto Jr., que já havia dito em outra oportunidade que a Eletrobras precisa de um grande “enxugamento”, já que os salários estão muito altos, há muitos vagabundos e, portanto, a privatização é necessária.
A conversa entre os trabalhadores da Eletrosul iniciou com a lembrança de que energia é uma questão de soberania. Dados de como se comporta o setor em outros países asseguram isto. Nos Estados Unidos, 73% das hidrelétricas são estatais, com tarifa determinada pelo custo e não pelo mercado. Destas 21% pertencem ao Exército, cerca de 20% é gerida por uma agência de águas e o restante é estatal federal. Os norte-americanos não permitem que a gestão de rios seja entregue à iniciativa privada. Na França o exemplo se repete, todas hidrelétricas são estatais e as empresas são responsáveis também pela gestão dos rios.
Um trabalhador que estava na Eletrosul na época da privatização lembrou a todos os tempos difíceis: “A empresa foi comprada por R$ 945 milhões. Éramos 6 mil trabalhadores e fomos reduzidos a 900 funcionários, outros 800 migraram para a Tractebel e 2 mil foram contratados por empresas terceirizadas. Destes, a maioria foi para a rua passado um tempo. Encontrei colega vendendo bilhete de loteria no centro de Florianópolis. Prestem muita atenção! Vão comprar a preço de banana, com dinheiro do BNDES, e depois remetem os lucros para o exterior. Os nossos políticos catarinenses, na época, voltaram as costas para a Eletrosul”.
Outro trabalhador lembrou que o prejuízo ou endividamento que a Eletrosul atravessa neste momento é muito menor do que as remessas de lucro que empresas como a Engie enviam para fora do Brasil. “Existe uma forma de corrupção legal também nesses processos de privatização, onde governantes entregam nossas riquezas para satisfazer as necessidades de outros países”.
Um último trabalhador, antes ainda dos encaminhamentos finais, demonstrou a consciência necessária neste momento: “Sou engenheiro e tive uma criação neoliberal, mas meu pai sempre incentivou a mim e meus irmãos a fazermos concurso público”.
Os trabalhadores concordaram que a negação (achar que a privatização não vai acontecer ou não vai afetá-lo) não leva a lugar nenhum. O trabalho de conscientização deve ser diário e constante no sentido de que energia deve ser considerada um bem público, assim como a educação, a saúde, a segurança e a justiça, que são serviços públicos essenciais à sociedade. Assim, uma empresa pública de energia como a Eletrosul não deve estar sujeita a somente dar lucro, e o preço da energia deve ser regulado. Os espaços de disputa são variados e os trabalhadores devem atuar em todos eles, ajudando a multiplicar e conscientizar demais trabalhadores, familiares e a população em geral a respeito das consequências devastadoras, que adviriam da privatização de ativos de energia e de empresas como a Eletrosul, para a soberania do país e para uma futura sociedade de bem-estar social.
Dentre os encaminhamentos finais, os trabalhadores propuseram uma aproximação do Sinergia com a Fundação Elos e a Associação de Aposentados e Pensionistas da Eletrosul com a finalidade de demonstrar a redução de recursos no Plano CD e a própria inviabilidade do Plano BD frente a um processo de privatização da Eletrosul. Foram propostas também formas de mostrar à sociedade a eficiência da empresa pública e seus trabalhadores como forma de combater o discurso propagado na mídia televisiva de que empregado público é privilegiado. O representante da Intersindical no encontro se comprometeu a reunir-se com o Sinergia para discutir estratégias a fim de barrar um processo de privatização.
Houve ainda uma proposta de uso de meios de comunicação para estampar publicamente os rostos e nomes dos políticos que estão votando e atuando contra os trabalhadores e a manutenção da empresa pública.
Ao final, todos consideraram o encontro positivo e propositivo, com debates de elevado nível, e que só a união dos trabalhadores e da sociedade por uma causa comum poderá salvar a Eletrosul e demais empresas da Eletrobras do ataque privatista comandado por um governo de baixíssima popularidade.
Nas próximas semanas deverão ocorrer outros encontros sobre o tema. Fique atento!
Fonte: Sinergia