Por Clara Fernandez e Paulo Silva da Redação do UàE.
Essa é a pergunta que deve pairar na cabeça da maioria dos estudantes que presenciaram ou escutaram sobre as reuniões do Conselho de Entidades de Base (CEB)¹ dessa semana que tratou do regimento eleitoral para as eleições do Diretório Central dos Estudantes (DCE), ou seja das regras nas quais transcorrerá a eleição deste ano para a direção da entidade.
Nesta segunda-feira (08/05) aconteceu a primeira reunião do conselho destinado a discutir o regimento eleitoral de 2017 na qual foram levantados alguns destaques no documento para posteriormente discutir efetivamente cada uma das propostas. Naquele momento, o conselho decidiu por marcar mais duas reuniões para a mesma semana, na quarta (10) e na sexta (12) para tratar das polêmicas.
Porém, antes do início da reunião de ontem, quarta-feira, a atual direção do DCE publicou em um grupo no facebook do Conselho de Entidades de Base uma defesa de troca na metodologia de votação, adiantando sua posição nas reuniões desta semana do Conselho e tentando desde já atropelar o debate. A publicação defendia que a votação para a eleição do DCE fosse feita através do voto virtual, utilizando-se da plataforma institucional da reitoria, o Sistema de Controle Acadêmico da Graduação – CAGR.
Nesta quarta, dia 10, ocorreu a segunda reunião do CEB, no qual os destaques realizados na reunião anterior, dentre os quais aquele sobre a forma de votação, como o voto on-line proposto pela atual direção da entidade via Facebook, começariam a ser discutidos. No entanto, toda a reunião girou em torno de uma tentativa esdrúxula da atual direção de golpear o conselho: apresentando sem qualquer debate prévio, votos por procuração de 16 centros acadêmicos sobre a alteração no modo de votação.
O oportunismo golpista da direção do DCE reside precisamente em utilizar como argumento o existente afastamento dos movimentos estudantis dos campi com o DCE para tentar impor o voto por procuração. Entretanto se esse afastamento hoje existe, não seria responsabilidade também da própria direção do DCE e do grupo político que a ocupa nos últimos 4 anos? O próprio voto por procuração significa o afastamento dos campi das discussões que se faz no campus sede, ou seja, não resolve em nada o problema. O esforço da direção do DCE não estava, e nunca esteve, em ampliar a participação dos campi do interior na política universitária da UFSC, mas pelo contrário, está voltado para a consolidação de um projeto de poder. Não houve esforço para inseri-los nas reuniões do CEB, seja com videoconferência ou de qualquer outra forma para que possam participar dos debates, mas o esforço estava centrado na articulação esdrúxula, única e exclusivamente, para a modificação da forma como se daria as eleições para o DCE, através de enquete on-line, mas não todas as outras proposições de alterações no regimento propostas pelos próprios Centros Acadêmicos.
É claro que a direção do DCE, e o grupo político que a compõe, fará uso da rejeição do voto por procuração por parte da maioria dos Centros Acadêmicos naquele CEB. O discurso oportunista e mentiroso de que o movimento estudantil do campus sede é contra a maior participação dos estudantes correrá por toda universidade, e a única forma de desmascará-lo é desmascarando a própria direção atual do DCE: intimamente ligada à reitoria, que inclusive fez campanha para Cancellier, que atravancou a resistência contra os cortes de verbas das universidades desde 2015, que apoia a cobrança de mensalidades na universidade, que apoia a privatização do centro de convivência, prédio onde fecham a sede do DCE para os estudantes, que viu todos os espaços culturais da universidade serem fechados e não fez nada, como a concha acústica, o palco no bosque do CFH, a galeria de arte no Centro de Convivência e os Happy Hours, que apoiou a expulsão de estudantes sem teto que ocuparam quartos vagos na moradia estudantil, que ignora completamente a falta de permanência estudantil na universidade, etc. Enfim, trata-se de uma direção estudantil que tem como função a proteção da governabilidade conservadora na UFSC e que escamoteia os problemas deixando todos os estudantes impotentes na defesa de seus próprios interesses.
Por fim, a própria ideia de que as eleições possam ser realizadas através de enquete on-line é uma forma de manutenção e aprofundamento do isolamento entre os estudantes e suas direções políticas, como também das demandas dos demais campis, visto que as eleições do Diretório é um dos poucos momentos onde esses estudantes conseguem se aproximar dos de Florianópolis e colocar suas pautas em evidência. Só com uma enorme dose de ingenuidade ou má-fé é possível defender que processos online dão conta de elevar e qualificar o debate dessas demandas.
Para não deixar espaço para qualquer ilusão ou desculpa, é preciso que seja dito de forma explícita e sem ressalvas: transformar o processo eleitoral do DCE em uma enquete online é um projeto de destruição definitiva da entidade e da sua capacidade de ser um instrumento de encontro, organização, construção e defesa dos dilemas com os quais os estudantes se deparam na Universidade. Consequentemente destruindo também a possibilidade de que esta entidade contribua com o rompimento dos muros da Universidade, articulando junto às questões da nossa cidade.
Há um exemplo explícito na história desta Universidade, sobre os efeitos devastadores de sistemas de decisão online no desmonte do papel das entidades de mobilização: A APUFSC – Associação dos Professores da UFSC. Hoje esta entidade não consegue reunir um mínimo de professores para debater o desmanche que os direitos e serviços públicos, inclusive a Universidade, e consequentemente as próprias carreiras estão sofrendo. Há uma outra série de fatores que contribuem para esta desorganização da categoria, como a desfiliação do sindicato nacional e mesmo as características de precarização que se apresentam na formação e exigências de produtivismo docente, além das formas de corporativismo específicos desta categoria. Mas a impossibilidade de que a sua entidade servisse para mobilizar e organizar os professores intensificou estes fatores e está diretamente relacionada com a virtualização dos processos decisórios. Fazendo com que nenhuma ação de fato ocorra sem o interesse e controle da direção extremamente conservadora da associação. Não há nenhum espaço aí para controle social e disputa do destino dos processos. A entidade trata-se somente de mais uma ferramenta de gestão, gestão da imobilidade e morbidez de grande parcela da categoria docente.
Por fim, um apelo, os estudantes não podem deixar mais que esse processo de destruição da capacidade de organização, da destruição da própria entidade estudantil siga livre. Não podemos deixar que o Diretório Central dos Estudantes se torne apenas mais um apêndice da reitoria para o controle do movimento estudantil. O Diretório Central dos Estudantes não pode se tornar inútil para os estudantes como a APUFSC é para os professores. Um outro movimento estudantil é possível e devemos construí-lo desde já.
1 Instância do Movimento Estudantil da UFSC hierarquicamente superior a direção do Diretório Central dos Estudantes, que reúne o conjunto dos centros acadêmicos dos cursos de graduação e o grêmio do colégio de aplicação.
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Fonte: UFscàEsquerda.