Por Gabriel Valery
São Paulo – O presidente Jair Bolsonaro chegou a publicar um decreto, no início do ano, que autorizava a exploração de cavernas no Brasil. Os locais ficariam reféns de interesses de mineradoras. As perdas culturais e ambientais seriam inestimáveis. Além disso, a devastação de tais sítios poderia colocar humanos em contato com patógenos perigosos. Diante disso, a comunidade científica e mesmo setores políticos se mobilizaram em oposição.
Em 25 de janeiro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Ricardo Lewandowski suspendeu parcialmente o decreto do presidente. Ele atendeu a um pedido do senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). O parlamentar alegou que a destruição dos ambientes colocaria a população em risco pelo contato com novos vírus, que poderiam provocar novas pandemias.
“Sabemos que as cavernas são abrigos naturais dos morcegos, sabemos que em decorrência disso os morcegos são portadores de vírus como o coronavírus. A irresponsabilidade para com a ciência e para com os brasileiros é gritante. A decisão do ministro Ricardo Lewandowski repara e restabelece a ordem jurídica necessária para proteger a todos, que hoje vivem sua maior ameaça sob a era de Jair Bolsonaro”, disse Randolfe na ocasião.
Denúncia internacional
Agora, mais de 80 cientistas publicaram uma carta na revista internacional Science sobre o tema. O texto “Patrimônio de Cavernas Brasileiras sob Cerco” faz duras críticas à postura devastadora bolsonarista. “Sob o presidente Jair Bolsonaro, o Brasil negligenciou a proteção ambiental (…) O novo decreto ignora o insubstituível valor científico das cavernas brasileiras. Pesquisadores documentaram centenas de espécies endêmicas de cavernas obrigatórias, incluindo animais com adaptações únicas”, afirma.
Os cientistas cobram a revogação imediata do decreto. “Pelo menos 72 espécies de morcegos empoleiram-se em cavernas brasileiras e fornecem serviços ecossistêmicos críticos, como controle de pragas. A geodiversidade dessas cavernas também é excepcional, com muitos locais abrigando minerais raros e formações geológicas que não são encontradas em nenhum outro lugar. Finalmente, a infinidade de sítios arqueológicos e paleontológicos em todo o país fornece um registro único do passado do Brasil”.
Em defesa das cavernas
Por fim, o texto afirma que os ecossistemas brasileiros estão sob risco de serem “obliterados por decretos míopes”. Ele ainda argumenta pela ilegalidade do conteúdo defendido pelo presidente. “O decreto de Bolsonaro aumenta o risco de extinção de espécies únicas. Ao ignorar os valores intrínsecos e utilitários das cavernas brasileiras, a política negligencia as estratégias globais de conservação para salvaguardar o bioma subterrâneo, viola os princípios tanto da Política Federal de Biodiversidade quanto da Convenção sobre Diversidade Biológica e não se alinha com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável. As perdas potenciais de espécies únicas, serviços ecossistêmicos e novos produtos químicos industriais (que podem ser derivados dos micróbios encontrados nas cavernas) são imprevisíveis.”