Por Urda Alice Klueger. (texto e foto)
– Quando está aqui, ele não descansa o suficiente – me conta Rosiani. Cada pessoa da família dela tem um horário diferente para sair ou para chegar do trabalho ou da escola, e a cada um que chega ou que sai Atahualpa tem que ir encontrar a pessoa, pular, lamber, fazer festa – quando se acomoda para descansar de novo, de novo há alguém para chegar ou para sair, e a atividade dele recomeça. Pelo tanto que ele gosta de todos de lá, penso que não pode haver um lugar melhor para um cachorrinho ficar. Já me aconteceu de viajar por três semanas seguidas para fora do Brasil e meu cachorro ficou na casa da Rosiani, e eu telefonava de muito longe e pedia para falar com ele, e ficava dizendo coisas assim:
– Meu amor, estás aí? Atahualpa, estás me ouvindo? É a tua Urda! Tu estás bem? – e outras coisas assim que a gente fala para grandes amores, e quem pegava o telefone, depois, me contava como ele abanava o rabo enquanto me ouvia – mas depois ia brincar sem trauma.
Foi a viagem mais longa que fiz depois que o tenho, e estava em Cochabamba, na Bolívia, quando Hana me mandou algumas fotos do meu bichinho. Num café cibernético de um país estranho eu chorei desconsoladamente, de tanta saudade dele!
No final da viagem, quando peguei o último avião para voltar ao Brasil, e fiquei olhando, lá embaixo, as belezas deste meu continente tão amado, de repente me veio uma indagação: e se quando eu chegasse de volta Atahualpa tivesse me esquecido? Se ele não me quisesse mais?
Aí meu coração pareceu parar, e todas as belezas e coisas boas vistas e acontecidas durante a viagem deixaram de ter sentido, e naquele avião onde a luz do por do sol entrava pelas janelinhas eu me pus a chorar doloridamente, muito doloridamente, temendo o nosso reencontro. O que seria de mim se Atahualpa já não me quisesse?
Esquecia-me de que há amores que são eternos, não importa o que aconteça. Pessoas vieram e foram da minha vida; outras virão e talvez também partirão, mas o amor de um cachorrinho é algo que não muda, que fica para sempre.
Neste momento em que escrevo isto é um final de tarde de chuva e estou sentada na varanda da nossa casinha rosa e branca. Ao meu lado, Atahualpa dorme e vela, pois o sentido da vida dele é este de estar comigo e cuidar para que tudo esteja a contento ao redor. Nada me assombra, me assusta ou me dá medo quando estou com Atahualpa, e penso que com ele a coisa deve ser um pouco parecida.
Quando peguei Atahualpa naquela agropecuária, pequenino e doentinho, fiz as contas de quanto vive um cachorro: ele morreria mais ou menos na época em que eu deveria ir para um ancionato, e acho que vai ser assim mesmo. Não terei mais tempo de ter um outro cachorro depois dele. Sei que há sempre tantos cachorrinhos precisando de um lar, filhotes e adultos abandonados por gente sem coração, mas quando Atahualpa se for, já será muito tarde para eu começar outra história de amor. Pela lógica da natureza ele partirá antes de mim, e eu desejo muito que seja assim, pois não sei o que seria dele se eu o deixasse para trás. Não sei como poderei viver sem ele, mas já tive tantas perdas dolorosas na vida que penso que saberei suportar. Ele, no entanto, só tem a mim como seu grande amor.
O que espero? Espero que as crianças que estão crescendo hoje tenham muito amor no coração, e no futuro peguem para si aqueles cachorrinhos abandonados que eu já não poderei pegar, e que dêem a eles o mesmo tanto de amor que eu dou a Atahualpa.
Daqui a seis dias, no dia 02 de outubro de 2010, meu cachorro Atahualpa completará três anos. Feliz aniversário, meu bichinho querido! Fica este livro como o presente que sei lhe dar!
Blumenau, 26 de Setembro de 2010, 18:14 horas.
(Excerto do livro “Meu cachorro Atahualpa, publicado em 2010)