(Texto do livro “Meu cachorro Atahualpa”, publicado em 2010).
Agora é o tempo da Alegria. Já fez 13 meses que estamos morando neste condomínio que é como que um pequeno paraíso, e onde a vida segue com tal suavidade que fica até difícil explicar.
No começo, ainda havia três casinhas em construção aqui bem perto, mas agora elas ficaram prontas e só há um único terreno vazio, ainda, esperando por uma construção. Como em qualquer comunidade do mundo há aqui gente diversificada e com gostos e hábitos diferentes, mas no geral, há uma grande harmonia envolvendo tudo. Aqui é a parte alta de um vale onde a gente pode avistar muito longe, vendo morros verdes e morros azuis, lá na distância, e quando Atahualpa e eu chegamos aqui, nossa varanda não tinha cerca nem portão, nosso jardinzinho abandonado era cheio de brita e nossa casinha era pintada de um verde bem escuro.
O primeiro passo era cercar nossa varanda e jardim para que Atahualpa pudesse ficar solto; depois, havia que tirar a brita e fazer o jardim, o que fiz com as plantas que sempre tinham agradado ao meu cachorrinho: macia grama pelo de urso para ele se deitar; certas plantas de finas folhas altas esbranquiçadas para ele fazer xixi, e um carreirinho de flores para mim. Atahualpa sempre gostara tanto daqueles canteirinhos de grama pelo de urso que houvera no nosso passado, e sempre quisera tanto poder deitar e rolar em cima daquela grama, e sempre levara tantas broncas de síndicos e outras pessoas por tal motivo, que eu não via a hora em que ele tivesse o seu gramado particular. Também sempre gostara tanto de fazer xixi naquelas folhas finas e esbranquiçadas que encontrara no passado, e também levara tantas broncas por tal causa, que quando plantei aquelas plantas fi-lo na certeza de que estava construindo um pequeno paraíso para o meu cachorro. Mas o que tinham feito com ele, no entanto! Tantas broncas levou por querer ser feliz com as plantinhas de que gostava, que agora que tem, realmente, o jardinzinho que lhe prometi, nunca pisa nele, tão condicionado está de que aquelas plantas são proibidas. Quem realmente usufrui daquele jardim é o Preto, o cachorro da Monique e da família da casa vizinha, que tinha apenas 3 meses quando viemos morar aqui.
Preto é um caso à parte, neste condomínio onde vivem muuuuitos cachorros. Ele me foi apresentado como Preto, mas, naquela altura, seu nome ainda estava indefinido, e sua família também o chamava de Cusco. Acabou tendo o impressionante nome de Cusco Preto.
Assim como Atahualpa é um cachorrinho atarracado, forte e musculoso, Preto é um cachorro alto e de corpo fino, mas que cria tal quantidade de pelos, de vez em quando, que mais parece um assustador leão, e a gente pensa que ele é enorme. No entanto, até hoje, já em idade adulta, passa sem esforço pelas grades da nossa varanda e está sempre a roubar a comida do Atahualpa e na nossa casa ele se sente como se estivesse na casa dele. Quando meu cachorro ouve o portão da varanda tremendo por causa da velocidade com que o Preto o atravessa, sai em disparada para salvar seu osso preferido naquele dia – e o Preto aproveita e rouba a outra comida disponível que há! Penso que nossa vida, no entanto, não seria tão divertida sem a existência do Preto na casa da família Schörner, ao lado da nossa, e sem as brincadeiras, estrepolias e encrencas que os dois cachorros fazem juntos, com Monique sempre a acudir as artes do Preto aqui e ali, encantadora Monique que há pouco fez 9 anos, e que, além dos luminosos olhos azuis e tantas outras qualidades de criança que se sabe muito amada e muito querida, ainda usa fascinantes pantufas peludas nas manhãs frias, que me encantam a ponto de me por a fotografá-la. E Monique é apenas uma das tantas crianças que brincam ao lado da nossa casinha e na nossa varanda, trazendo todo um colorido às nossas vidas.
Urda Alice Klueger é escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR.