Por Paulo Moreira Leite.
A mobilização dos brasileiros e brasileiras em defesa de seus direitos na hora da aposentadoria vive um grande momento, de avanço e ampliação, que terá um ponto culminante na greve geral de 28 de abril. Mas a batalha está longe de terminada.
Depois que um levantamento do Estado de S. Paulo junto ao Congresso mostrou que apenas 11 parlamentares num total de 513 são favoráveis ao projeto de reforma tal como foi anunciado — apenas 2% do plenário, é bom sublinhar — é óbvio que o Planalto teria que tomar providências para dourar a pílula. Foi assim que nasceu o espetáculo do dia, que cabe batizar como a Farsa dos 5 pontos.
Não se trata de abrir mão dos pontos substanciais da reforma — exatamente aqueles que justificam o repúdio integral a um projeto que está longe de ser uma somatória de filigranas.
Ouvido sobre eventuais mudanças no plano original, Henrique Meirelles, que é quem manda nessa matéria, dirigiu-se ao mercado financeiro quando esclareceu que não será possível abrir mão das medidas que preservem “os ganhos fiscais com a reforma.” Traduzindo para trabalhadores e trabalhadoras: será preciso preservar as perdas previstas — em qualquer caso.
Em situação desesperadora, pois as chances de uma derrota são reais, o Planalto procura manter a calma pela construção de um atalho. Quer criar um ambiente de incertezas e confusão política para esconder o debate real, que envolve uma traição aberta ao futuro de várias gerações de brasileiros — tanto os próprios aposentados, como aqueles filhos, netos e bisnetos que utilizam pensões dos mais velhos para amenizar as dores da sobrevivência. Neste ambiente, a publicidade mistificadora cumpre um papel indispensável.
Remando contra uma rejeição que é uma unanimidade nacional, o Planalto aposta na criação — artificial — de um ambiente de Fla x Flu. O esforço é dar a impressão de que o país está dividido a respeito, que existem dois pontos de vista em debate, que ambos são legítimos — e assim permitir que, às escondidas, a bancada governista possa crescer e engordar até atingir o mínimo indispensável (308 votos) para a vitória. O objetivo, aqui, é claro. Abrir passagem para a cooptação de lideranças do movimento popular e sindical, dispostas a fazer um teatrinho conhecido: mudar de lado, declarar que conseguiram “alguma coisa” e abrir passagem para reforma.
Considerando a péssima reputação do Congresso aos olhos da população — e por que será? — já estão sendo mobilizados lobistas de impecável linhagem conservadora para ajudar. Com fantasia de “filósofos”, “economistas”, “escritores”, irão mostrar o rosto para defender o corte aos vencimentos dos velhinhos, o ataque aos direitos das mulheres, a aposentadoria integral com 49 anos de serviço, sem nenhum remorso pela preservação do verdadeiro poço sem fundo das “aposentadorias especiais”, que preservam privilégios inaceitáveis sob qualquer critério baseado no princípio ético que preserva a igualdade entre todos.
Sempre alerta, a presidente do STF Carmen Lucia derrubou uma liminar aprovada em duas instâncias pela Justiça gaúcha, que proibia a publicidade do Planalto, para garantir, sem remorsos anti-bolivarianos, a veiculação de anúncios a favor da reforma. Todo este empenho enfrenta um obstáculo da vida real, porém.
Na baderna institucional criada após o golpe parlamentar que derrubou Dilma, Temer e Meirelles tiveram uma relativa facilidade para aprovar projetos monstruosos para o país, a começar pelo Teto de Gastos. Naquele momento, a derrota política do Partido dos Trabalhadores e seus aliados, confirmada na eleição municipal, criou um ambiente desfavorável a toda postura de resistência, dificultando a exposição de argumentos contrários e impedia um debate sensato e equilibrado.
No Brasil de 2017, em particular depois do dia 15 de março, a situação é outra. A reforma da Previdência não é um debate de números e gráficos abstratos, nem uma conversinha onde atrizes iniciantes pronunciam um texto decorado que trata a população como uma massa de ignorantes.
Conquista social consolidada, a Previdência é um regime auto-sustentável, como esclarecem economistas sérios, sem falar em entidades comprometidas com o equilíbrio de contas do país, como os auditores fiscais, como já lembrei aqui neste espaço (http://www.brasil247.com/pt/blog/paulomoreiraleite/277615/Embuste-contra-aposentadorias.htm)
Na vida cotidiana, os brasileiros sabem que a Previdência gera benefícios reais há décadas. Existem famílias onde a avó se aposentou, o pai também, as vezes o neto. A população sabe que cada Real que for retirado de seu benefício irá engordar o cofre do setor financeiro, sem gerar nenhum benefício para o país.
Esta é a questão. Sem argumentos argumentos legítimos, Temer tentará mudar o debate com armadilhas e fantasias.
Fonte: Brasil 247.