Por Natália Gil.
(texto publicado originalmente no perfil do Facebook da autora)
A deputada Tabata Amaral pensa que pensa por si, mas estou convencida de que ela serve de marionete para grupos fortes detentores de poder e serve de ilustração do pensamento hegemônico.
Moça branca, de origem pobre, destacou-se pelo desempenho em escola pública, tornou-se bolsista em escola privada e acabou ingressando em prestigiosa universidade dos Estados Unidos. Modelo perfeito para as propagandas em defesa da meritocracia, mais ainda porque divulga em entrevistas o quanto foi duro seu percurso, o quanto teve que se esforçar (sinceramente, disso não duvido). Percurso de exceção que confirma a regra da exclusão social. É o exemplo de pobre bem sucedido que as elites querem divulgar. Pobre agraciado pela “bondade” dos ricos. Estética de classe média, engajada em uma causa por todos considerada legítima – a educação – e “bem comportada”. É inegável que a divulgação de sua imagem de defensora da educação serve bem para abafar e deslegitimar outras formas de luta por educação para todos – como, por exemplo, as do movimento estudantil e do movimento negro, frequentemente apresentados pela mídia como “exaltados”, “ingratos”, “mal comportados”. Ora, a deputada acaba mesmo servindo como marionete. Afinal, e há ampla literatura para me ajudar no argumento, se a educação não for diversa, se não atender à diversidade de pautas sociais, penso que não será nunca verdadeiramente para todos.
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Quando ela surgiu na cena pública em defesa da educação, fiquei intrigada. Discurso bem formulado, como não defender o que ela diz? Colegas melhor informados do que eu já haviam me alertado sobre o engodo. Certeza me veio quando soube que a deputada votou a favor do fim da seguridade social no Brasil (eufemisticamente chamado por aí de “Reforma da Previdência”). Isso porque é impossível defender educação para todos no Brasil dissociado do combate à desigualdade social. Uma quantidade avassaladora de pesquisas no Brasil e em outros contextos nacionais evidenciam que as desigualdades de desempenho escolar estão diretamente relacionadas às desigualdades sociais. Não há “esforço” e boa vontade do aluno que garanta aprendizagem em contextos onde não há renda, não há emprego, onde falta alimento, onde faltam remédios, onde há violência cotidiana. Logo, defender o fim da seguridade social é impedir uma mínima equalização das condições de vida da população. Sem isso, chega a ser criminoso falar em meritocracia – conceito que certamente a deputada aprecia – e torna-se discurso vazio a defesa da educação. Só sobra fala artificial de marionete que, quando deixado de lado por seu manipulador, não passa de matéria inerte, boneco sem tônus jogado em um canto.
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Natália de Lacerda Gil é professora do Departamento de Estudos Básicos (FACED/UFRGS). Pedagoga, Mestra e Doutora em Educação pela FEUSP.
A opinião do autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.