Por Rapha Cruz.
Posso não ser muito alegre,mas triste também não sou. A alegria e a tristeza são vizinhas. Não sou de vestir máscaras,nem nada disso, mas gosto de ver as pessoas dançando. (Cesária Evóra)
Cabo Verde, situado no meio do Atlântico, entre a beleza rara de ilhotas esparsas no azul do oceano, é um dos pontos geográficos de destaque entre a América e Europa. O país insular africano, que se estende de Cabo Branco às Ilhas Bigajós, é um arquipélago de origem vulcânica, constituído por dez ilhas, localizado a oeste de Senegal e próximas de outros vizinhos como Mauritânia e Guiné Bissau, todos, países da faixa costeira ocidental da África.
Dentro da cena artística e da riqueza cultural que o país apresenta é possível perceber um novo direcionamento em relação à arte cabo verdiana, sobretudo a sua música em vigência. Escutar a música da ilha é sentir a mistura do Kriolu com a leveza ressonante da língua portuguesa, onde a miscigenação destaca o charme deste povo. A cena sonora é um dos grandes atrativos do país onde se destacam ritmos como: a morna, quizomba, funaná e a coladeira.
Não faltam exemplos de boas opções musicais. Um dos primeiros grandes destaques surgiu na década de 70, os Tubarões, um groove malicioso da terra, com pitadas dos ritmos cabo-verdianos e que traz uma configuração estética própria e original. Ildo Lobo, um dos fundadores do grupo, também conhecido por seu trabalho solo, representa muito bem a ilha: ambos caminhando potencialmente entre a variabilidade e a suavidade.
Assim como os Tubarões, a eterna Cesária Évora não pode escapar da nossa mente. Conhecida como rainha da morna, sua música nos lembra tardes alegres de domingo em casa de vó. Uma figura de renome que surge como marco inicial da difusão da música de Cabo Verde para o mundo.
E se Cesária está para a rainha da morna, o rei é o talentoso Bana, artista versátil, que tem uma composição mais cadenciada e conhecida pelas nossas terras sul americanas como a famosa balada romântica. O cantor, um referencial do som no país e no mundo, foi carinhosamente apelidado como o “grande embaixador“ da música de cabo-verdiana.
No meio do caminho entre jovens artistas e outros já consagrados, podem ser mencionados Tito Paris e Orlando Pantera. O primeiro despende uma voz potente com um swing peculiar, valendo o destaque para o álbum “Dança Ma Mi Criola”, em que a marca registrada do artista flui por meio de uma guitarra que faz um diálogo com suas composições, reforçando na melodia a sua virtuosidade. Já Orlando Pantera, morto precocemente aos 33 anos, foi uma das maiores revelações do país. Além de compositor, Pantera traz consigo a marcante poesia do campo. Sua música faz uma combinação única entre a lírica rural e o uso de peculiares instrumentos de batuque como: pilon,pau de colêxa, búzios e shelafon.
A ilha parece ressoar em nossos ouvidos. A miscelânea estética é fascinante nos cantores cabo-verdianos. O time é de primeira linha, na qual podem ser ainda escalados: Bilan , Mayra Andrade, Sara Tavares e Lura, que, cada um de sua maneira, apresentam rara sintonia entre os ritmos africanos e outros gêneros como o funk, jazz, bossa nova, blues e tango.
Bilan é um músico inovador, residente no norte de Portugal, é bem conhecido entre os artistas locais e segue com um trabalho que promete para o ano de 2014. Com atuações em diferentes festivais de músicas do mundo, o cantor tem uma produção singular cantada em kriolu, com uma poesia própria que se adequa com a realidade cosmopolita urbana. A particularidade vem de uma grande influência de Gilberto Gil, entretanto sempre reforçando sua própria criação e identidade. Realce para as músicas: Selva , Arrependimento e Dia d’ Manhã.
Mayra Andrade com sua voz rouca e levemente doce personifica uma viagem entre o simples e o melódico combinando cadências nativas como a funaná, quizomba e o batuque, onde busca elementos do jazz e da bossa nova, proporcionando assim um trabalho diferenciado e suavemente agradável. A artista, reconhecida internacionalmente, conta já com três álbuns de sucesso no currículo, com destaque para as músicas “Tununka , Dispidida e We used to call it love”, que conquistaram inúmeros ouvidos pelo mundo.
Na representação do Funaná, Lura vem com uma pegada swingada que facilmente coloca o público para levantar e dançar. O ritmo e a tradição levam nosso corpo ao encontro de nossos ancestrais, lembrando cadências conhecidas dos tupiniquins como o calypso e a lambada. A cantora também procura através de outras referências, como o jazz e o tango, criar um diálogo entre a música nativa e a contemporânea.
Numa aproximação mais intimista Sara Tavares desfila sua voz elegantemente entre tons de graves e agudos em uma contagiante alegria que eleva a potência da alma. Sua música cria uma relação entre as influências da ilha e a música pop. Lura,Sara Tavares e Mayra Andrade podem ser consideradas filhas da terra cabo-verdiana, pois apesar de terem nascido em países distintos, carregam e representam a ilha com esplendor através de composições e músicas de sonoridade ímpar.
A África através de Cabo Verde nos presenteia. Um dos cartões de visita é a nova arte cabo-verdiana que vem atraindo e mostrando uma elevada qualidade. Na Ilha entre o mar e sol há a boa música que é contada de uma maneira charmosa, elegante e vigorante. Para velhos e novos artistas o ritmo do país corre na veia, os olhos brilham, o corpo pede dança e o desejo de conhecer a ilha aumenta. Cabo Verde já não é uma epígrafe africana é uma realidade sonora mundial.
A carta de uma nação se apresenta na letra da música de Lura:
“Há uma morna que me encanta
Tem sorriso e magia
Cabo Verde tu és a manta
que cobre a dor e dá alegria”
Fonte: Afreaka.