Sobre a crise do capitalismo e a confiança. Por Douglas Kovaleski

 

No texto dessa semana, abordarei a crise estrutural do capitalismo no contexto da confiança e da necessária desconfiança, que precisamos ter no sistema. Em momentos de crise, salvar o sistema ou não é o que está em pauta. A confiança é elemento fundamental para o andamento do sistema. Ainda mais em tempos de capital financeiro, onde todo o sistema de crédito e juros que remuneram os investimentos das pessoas físicas ou dos juros que  remuneram os bancos quando estes socorrem as pessoas de suas necessidades, só se estabelecem por meio de promessas de pagamento.

Essas promessas firmadas em contratos e reconhecidas em cartório, não passam de profissão de fé caso o sistema venha a ruir. E a ruína da economia decorre da impossibilidade das pessoas físicas ou as empresas cumprirem suas promessas. Essa ruína a que me refiro é a materialização da crise no seu auge. Crise que acontece de maneira muito injusta, pois caso os pequenos investidores não paguem suas dívidas, seus bens são alienados e podem até serem presos. Já no caso de os bancos não conseguirem pagar suas dívidas, rapidamente o governo virá em seu socorro.

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Numa economia financeirizada, o que não faltam são as promessas sem lastro enquanto a ruína do sistema se aproxima, de acordo com Mészaros. Mas o mais interessante é que a ruína do sistema é antecedida por um discurso liberal, onde o maior pecado chama-se intervenção estatal. Nesse momento, o maior pecado aos olhos do mercado é a ação e o investimento do Estado. Há que se perceber, entretanto, que logo que vem a quebra de um grande banco, o discurso muda e o Estado passa a ter a “obrigação” de salvar os bancos, pois, se isso não for feito, a sociedade pode entrar em colapso, um verdadeiro caos, onde o reino da fome e do desemprego passariam a tomar conta do cenário. Enquanto isso, os banqueiros continuam impávidos no conforto de suas moradias luxuosas.

Essa prontidão dos governos em salvar o sistema com o uso de somas astronômicas dos contribuintes se dá em cima da fome, da miséria e da morte da imensa maioria da população na crise estrutural. Há uma incrível desproporção das somas dispensadas rapidamente para salvar um banco, se comparadas às humildes necessidades de bilhões de seres humanos. E o contrassenso maior está na “urgência” defendida pelos poderosos em salvar este sistema desumano e destrutivo. É intangível o montante de bilhões desperdiçados para salvar o sistema ao compararmos com os investimentos em saúde, educação, infraestrutura.

O auge da crise do sistema também é um divisor de águas no discurso da globalização, pois até a bancarrota, todo o discurso da burguesia valoriza a globalização dos mercados, das tecnologias, da livre concorrência e do consumo; com a quebra do sistema, a globalização não é mais importante e quem paga a conta são os Estados nacionais.

Toda essa argumentação deve servir de alerta para que a classe trabalhadora não caia nas mentiras do capitalismo que muda o seu discurso conforme lhe convém. Essa guerra declarada contra o funcionalismo público no Brasil, somada à austeridade no gasto público não passam de mentiras veiculadas pela mídia para convencer a população.

Imagem de capa: Projeção de prova do Titanica sobre um iceberg no Pólo Norte de Gerry Hofstetter.

Douglas Francisco Kovaleski é professor da Universidade Federal de Santa Catarina na área de Saúde Coletiva e militante dos movimentos sociais.

 

 

A opinião do/a autor/a não necessariamente representa a opinião de Desacato.info.

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