Composta pelos jornalistas Elaine Borges, Celso Martins, Leonel Camasão e Paulo Lehmkuhl Vieira e pelo advogado Prudente Mello, a Comissão da Memória, Verdade e Justiça dos jornalistas foi instalada pelo SJSC, em audiência pública realizada no dia 5 de dezembro, no Plenarinho Paulo Stuart Wright, na Assembleia Legislativa de Santa Catarina (Alesc). A comissão levantará informações e documentos de crimes praticados contra jornalistas pela ditadura militar.
Presente na audiência, o coordenador do projeto Direito à Memória e à Verdade da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e ex-preso político, Gilney Viana, elogiou a iniciativa do Sindicato, que serve de exemplo para a população. “Esse é o espírito democrático. Viabilizar a recuperação da memória e da verdade dos que sofreram nesse período é uma questão ideológica. Temos que conquistar a parcela da população que ainda está alheia à verdade do que foi o regime militar”, ressaltou.
Segundo Viana, as tentativas de minimizar a ação da ditadura são repugnantes. “Um jornal de circulação nacional chamar em editorial a ditadura de ditabranda é um achincalhe com o que ocorreu, um desrespeito ao povo brasileiro. Além de outros tipos de agressões, milhares de pessoas foram mortas sob o argumento de que eram comunistas”, lembrou.
Também compôs a mesa de audiência o jornalista e escritor Paulo Markun, que vivenciou a tortura e as mazelas da ditadura. Ele relatou algumas de suas tristes lembranças. Entre elas o episódio da morte de seu colega, o jornalista Vladimir Herzog, no DOI CODI em São Paulo, caso que o inspirou a escrever o livro “Meu querido Vlado”.
O jornalista ressaltou, ainda, que este é o melhor momento para revelar os casos, aproveitando a liberação do Arquivo Nacional, antes mantido em sigilo. “A criação desta Comissão é o primeiro passo para que a brutalidade do regime ditatorial não se repita. O processo de investigação deve ser público”. Ele lamenta o atual descrédito social com relação às representações políticas. “Infelizmente essa frustração leva a população a acreditar que na época da ditadura tudo era melhor. Isso não é verdade e precisa ser esclarecido e revelado”, destaca.
Já o assessor jurídico do SJSC e membro da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, Prudente Melo, lembrou que quando a Comissão foi constituída, em 2005, estimava-se que surgiriam uns 10 mil processos para análise. “Já temos mais de 71 mil processos e certamente muitos outros surgirão”, registrou.
Para Prudente Melo, o processo de investigação sobre o que realmente ocorreu naquele período deve se pautar pela garantia de reparação, respeito à memória e, principalmente, por trazer a verdade à tona. Lembrando que os atos de exceção atingiram toda a sociedade brasileira, Prudente defende a necessidade de identificar os criminosos e colocá-los no rol de culpados. “Foram interrompidos projetos de vida, e mais, foi interrompido um projeto de país, com consequências sentidas até hoje”, protestou.
De acordo com o presidente do Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina, Valmor Fritsche, a categoria tem sua trajetória marcada pelos momentos de opressão e violência. “Os jornalistas foram, juntamente com sindicalistas, professores, artistas e estudantes, a categoria que mais sentiu com o autoritarismo do regime ditatorial”, considera. Ele informou que a Comissão Nacional da Memória, Verdade e Justiça dos Jornalistas, criada pela FENAJ durante o 35º Congresso Nacional da categoria, trabalha com a perspectiva de que os levantamentos nos estados ocorra até 31 de março do ano que vem, para posterior compilação e envio do relatório à Comissão Nacional da Verdade, criada pela Lei 12.528/2011.
No final do evento, foi comunicado o falecimento, minutos antes, do arquiteto e militante histórico do Partido Comunista Brasileiro, Oscar Niemeyer. A sessão foi encerrada com um minuto de silêncio em homenagem a Niemeyer.
Comissão Catarinense
Na audiência, coordenada pelo Deputado Amauri Soares (PDT/SC), foi entregue a Gilney Viana o Projeto de Resolução 4/2012 de autoria da deputada Angela Albino (PCdoB), que propõe a criação da Comissão da Verdade do Estado de Santa Catarina para colaborar com a Comissão Nacional da Verdade na apuração das violações dos direitos humanos ocorridas no período de 1964 a 1985. A aprovação da proposta vem sofrendo resistências de alguns parlamentares, o que surpreendeu o membro da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República. “É estranho, uma vez que já existe uma Comissão Nacional e várias outras Assembleias Legislativas já aprovaram. Pra mim quem é contra esta proposta é contra a democracia”, disse.
Quem participou, aprovou
O jornalista Mauro Ferreira esteve presente na audiência de lançamento da Comissão Memória, Verdade e Justiça. Ele acredita que a partir desta consolidação os jornalistas irão encontrar histórias marcantes ainda ocultas na vida de cada um. “Eu, por exemplo, tenho relatos na família. Meu pai, Mário Ferreira, era jornalista e foi perseguido na época. Tenho muitos amigos que tiveram seus direitos alijados, histórias que não vieram à tona ainda para conhecimento da sociedade”, conta.
A jornalista Ludmilla Gadotti, que fazia a cobertura do evento pela Alesc, também aproveitou para expressar a sua opinião em favor da instalação da Comissão. Ela fez alusão ao fato da audiência acontecer na sede do Plenarinho. “Estamos assistindo ao lançamento nas instalações do Plenarinho Paulo Stuart, representante político desaparecido, também vítima do regime militar. Foi uma época de muita brutalidade e que precisa ser esclarecida”, destaca.
Os estudantes de jornalismo também marcaram presença no evento. Daniel Giovanaz, do Centro Acadêmico de Jornalismo da UFSC, disse que levantar essas informações da história é um compromisso dos jornalistas que atuam hoje no país. “Esse resgate da memória é imprescindível para que isso não se repita jamais”, diz.
Kalyne Carvalho
Jornalista Profissional – 0004107SC
Assessora de Imprensa – Sindicato dos Jornalistas de Santa Catarina
(48) 3228-2500
Foto: Solon Soares – Agencia AL
Autor: SJSC