Por Sâmia Gabriela Teixeira
Desde o dia 12 de junho, data do sequestro de três colonos israelenses, ativistas e organizações de direitos humanos na Cisjordânia e na Faixa de Gaza têm relatado a escalada de violência contra palestinos, em uma dura campanha de busca pelos desaparecidos.
O primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, acusou o Hamas de ser o responsável pelo sequestro, embora o grupo tenha negado a ação.
A repressão militar ganhou mais peso depois de os corpos dos israelenses serem encontrados na Cisjordânia, próximo a Hebron, no final do mês de junho.
Desde então, 830 palestinos foram presos, vilas foram invadidas durante incursões noturnas do exército israelense e o ódio de colonos israelenses foi manifestado em passeatas espontâneas que tomaram as ruas de Jerusalém Ocidental, com a participação de jovens que pediam “morte aos árabes”.
Segundo a imprensa local, a polícia teve de impedir oito tentativas de linchamentos de palestinos.
Embora a situação tenha ganhado os olhares da comunidade internacional, a tensão vivida na Cisjordânia e na Faixa de Gaza não é de hoje e é cotidiana. Agora, com a repercussão do caso, fica evidente também a situação dos palestinos que vivem nos territórios de 1948, com a expansão constante dos assentamentos israelenses e a crescente presença de civis israelenses armados.
Para o ativista palestino Hasan Zarif, do Movimento Palestina Para Todos, de São Paulo, é recorrente, tanto na imprensa quando na opinião pública, a incompreensão ou o desinteresse sobre o cotidiano dos palestinos que vivem nesses territórios, especialmente em Hebron.
“Nada justifica o sequestro e as mortes dos três israelenses, mas é necessário abrir o debate para tentar entender o que motivou o ocorrido. Os palestinos desta região são hostilizados e humilhados diariamente. Além dos residentes dos assentamentos ilegais, há os colonos israelenses que agem como milícias, e que andam fortemente armados aterrorizando os palestinos”, exemplifica.
Das mortes de hoje
Desde a descoberta dos corpos dos três colonos israelenses, nove pessoas morreram vítimas de bombardeio aéreo em Gaza. Segundo autoridades israelenses, no dia 2/7, o jovem Mohammad Abu Khdeir (16) foi sequestrado em Israel por seis judeus. O adolescente foi queimado vivo e seu cadáver foi encontrado em um bosque horas depois de seu desaparecimento.
A causa da morte foi confirmada em autópsia, que revelou sinais de carbonização nas vias respiratórias, indicando que o garoto estava vivo no momento em que atearam fogo em seu corpo.
Até o momento, seis suspeitos do assassinato foram detidos, e as investigações seguem em curso, assim como a revolta popular na Cisjordânia e em Israel.
“A situação levanta uma questão política importante que é o fracasso dos Acordos de Paz. A Autoridade Nacional Palestina tem sido cada vez mais questionada e a percepção dos que vivem sob o governo de Mahmoud Abbas é a de que não se fala sobre a violência e os crimes da ocupação, de que o governo palestino é omisso e cúmplice”, salienta Zarif.
Das mortes da última década
Apesar de o assassinato do adolescente palestino ser tratado como ato de vingança pela morte dos três israelenses, os dados de organizações de direitos humanos sobre o número de mortes de crianças palestinas são alarmantes. Zarif frisa que “segundo informações da Associação Internacional Palestina em Defesa das Crianças, a cada três dias morre uma criança palestina vítima da ocupação militar. Esta é a estimativa rotineira”.
O primo do mártir nas garras da ocupação
Durante o funeral de Khdeir, ocorrido no dia 7/7 em Jerusalém Oriental, enquanto milhares de palestinos marchavam carregando o corpo para o local do enterro, o primo da vítima, Tariq Abu Khdeir, foi detido e espancado por soldados israelenses. A ação foi supostamente filmada e divulgada amplamente nas redes sociais, e ganhou maior proporção ao constatar que Tariq (15) possuí nacionalidade norte-americana.
Diante deste constrangimento, Netanyahu chegou a declarar posição enérgica para punir qualquer terrorista, “esteja ele do lado que estiver”. Mas, a história revela que a atitude demonstra muito mais uma preocupação de relações com os Estados Unidos do que uma posição sincera e comprometida. “Este garoto não é o primeiro. Teve sorte de ser americano. Na última década a ocupação prendeu cerca de sete mil crianças. Todas elas sofrem tortura, agressão física, psicológica. Este caso isolado ganhou atenção, gera atrito diplomático, mas o fato é que as violações são constantes”, ressalta Zarif.
A mãe de Tariq, Suha Tariq, em entrevista ao Washington Post, declarou estar “revoltada e pronta para tomar providências legais”, porque o que aconteceu com seu filho acontece todos os dias com os palestinos. “Ele teve a oportunidade de estar na mídia do mundo inteiro, mas os outros palestinos nunca tiveram esta chance. Nunca tiveram voz”, concluiu.
Novos olhares sobre o tema
Com espaço na mídia internacional, sobretudo em veículos norte-americanos de grande influência, como o New York Times e Washington Post, é notável a abertura para um novo debate sobre a questão Israel x Palestina, principalmente nos Estados Unidos, onde a opinião pública tende a ser mais favorável ao lado israelense do que ao palestino. “É importante aproveitar a atenção que se dá para estes casos de violência e aprofundar as discussões sobre direitos humanos na Palestina ocupada. Os jovens gritam nas manifestações que o que virá é uma nova Intifada. Este limite merece um olhar mais crítico e aberto da sociedade, e também da imprensa”, finaliza.
Fonte: Brasil de Fato
Foto: AnnaFerensowicz/Pacific/Barcroft