Senado aprova Lei Antiterrorismo que dá brecha à criminalização dos movimentos sociais

Por Najla Passos.

Funcionou a estratégia adotada pelo governo de indicar um tucano, o senador Aloysio Nunes (PSDB-SP), para ser o relator no Senado do polêmico projeto de lei que tipifica o crime de terrorismo no país. Na noite desta quarta (28), após 4 horas de discussões, o plenário do Senado aprovou a polêmica Lei Antiterrorismo por 38 votos a 18. E a aprovou na sua versão mais dura.

No texto enviado ao Senado pela Câmara, a pressão das organizações sociais conseguiu incorporar uma emenda que isentava os movimentos sociais dos efeitos da lei. Nunes, entretanto, não aceitou mantê-la em seu substitutivo, apesar das críticas dos senadores mais progressistas – especialmente do PT, PSB, PC do B e Rede – que alertavam para o perigo da legislação ser utilizada para criminalizar movimentos reivindicatórios legítimos.

O texto da Câmara fazia a ressalva de que a lei não poderia ser aplicada à “conduta individual ou coletiva de pessoas em manifestações políticas, movimentos sociais, sindicais, religiosos, de classe ou categoria profissional”. O senador tucano não só suprimiu o parágrafo, como ainda fez questão de acrescentar a expressão “extremismo político” na sua definição do que venha a ser ato terrorista.

Ele justificou que, a partir da sua definição, a caracterização do ato terrorista se tornará rigorosa, porque exige quatro elementos diferentes: a execução de um ato que atente contra a pessoa, mediante violência ou grave ameaça, motivado por extremismo político, intolerância religiosa ou preconceito racial, étnico, de gênero ou xenófobo, com o objetivo de provocar pânico generalizado .

“Se depois de passar por todas essas instâncias a pessoa for considerada terrorista, terrorista será. E aí não adiantará se eximir dizendo que pertence a determinado movimento social. Todos estão submetidos ao império da lei”, afirmou. Nunes alegou que ninguém admite que pratica ato terrorista por pura crueldade. “Não existe ato terrorista que não reivindique uma causa nobre”, justificou.

O líder do governo, senador Delcídio Amaral (PT-MS), manteve o apoio ao projeto e indicou que a base do governo deveria lhe ser favorável. Segundo ele a versão foi amplamente discutida com o governo e o senador Aloysio Nunes fez todos os esforços possíveis para fechá-lo no melhor termo possível. Não foi atendido nem mesmo por petistas.

Líder do PT na Câmara, o senador Humberto Costa (PE) contestou o substitutivo. “Nossa preocupação, como dissemos, é de que qualquer subjetividade no tratamento de um tema como este pode permitir a criminalização das lutas sociais, dos movimentos sociais e a restrição à liberdade de expressão e de organização”, acrescentou o líder.

Também se manifestaram contra o substitutivo os senadores Lindberg Farias (PT-RJ), Crsitovam Buarque (PDT-DF), João Capiberibe (PSB-AM), Randolfe Rodrigues (Rede-AP), Antonio Carlos Valadares (PSB-PE), Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), Lídice da Mata (PSB-BA), e Telmário Mota (PDT-RR), entre outros.

Todos eles rechaçaram as ambiguidades da proposta, que poderão penalizar os movimentos sociais legítimos. Capiberibe e Randolfe insistiram que sequer há demanda no país para a aprovação de uma lei antiterrorismo, especialmente esta que tramitou em regime de urgência, o que impediu que o texto fosse apreciado pelas comissões e amplamente debatido na casa.

Ode à parceria inusitada

No discurso que fez em defesa do seu substitutivo, Aloysio Nunes fez questão de destacar o apoio que recebeu do governo, especialmente da Casa Civil, do Ministério da Justiça (MJ) e do Ministério da Fazenda (MF). Não sem usar e abusar da ironia, claro, para desqualificar as intervenções contrárias, inclusive de petistas.

Segundo ele, Casa Civil e MJ foram fundamentais para auxiliá-lo a equilibrar melhor a dosimetria das penas prevista na primeira versão do projeto, apresentada na semana passada. “Eles propuseram penas mais benignas do que as previstas para o crime de apologia ao terrorismo”, explicou.

Já o MF se envolveu na discussão da matéria com o objetivo de garantir que o projeto atendesse às exigências do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo (Gafi), o organismo internacional que vem pressionando o Brasil a adotar uma legislação específica sobre o tema, sob a ameaça de incluí-lo em uma espécie de lista negra, que sinaliza para os outros países que o Brasil não é um bom lugar para se investir.

Nunes agradeceu nominalmente ao MF que, segundo ele, “ainda ontem contribuiu com mais uma alteração de modo a tornar muito preciso o tipo penal de financiamento do terrorismo”. Lindberg Farias contestou os esforços exagerados para atender aos organismos internacionais. Conforme ele, o Brasil já possui legislação que possibilita a punição do crime de terrorismo e não precisa validar outra que prejudique os movimentos sociais

Dosimetria de Nunes

Conforme o texto aprovado no Sendo, o crime de terrorismo no Brasil passa a ser punido com pena de prisão de 16 a 24 anos, que pode subir para de 24 a 30 anos, se o ato causar morte. As penas ainda podem ser agravadas se o crime contar com ajuda de governo estrangeiro ou organização criminosa. E ainda se colocar em risco as principais autoridades públicas do país, como o presidente da república.

Para o crime de financiamento do terrorismo, a grande preocupação do Ministério da Fazenda, a pena de reclusão proposta é de 10 a 20 anos e multa. Já para apologia de ato de terrorismo ou de autor de ato terrorista, de 3 a 8 anos de prisão. O recrutamento de indivíduos para a prática é púnico com pena de dez a 16 anos.

O projeto retorna agora à Câmara, já que os senadores alteraram o texto enviado por aquela casa.

Fonte: Carta Maior.

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