Por Cristiane Sampaio.
O Brasil encerra esta semana com novos números alarmantes da pandemia: depois de registrar 3.769 óbitos entre quarta (31) e quinta (1º), o país atingiu, pela primeira vez, uma média móvel de mais de 3 mil mortes.
Na última sexta (2), esse número chegou a 3.013 mortes. Esse é o segundo maior número já registrado desde o início da pandemia, em março do ano passado. A média móvel só foi maior na última quinta (1º), com 3.117 óbitos em média a cada dia.
O dado, mensurado pelo Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), considera as notificações ocorridas nos sete dias anteriores a esse período.
No total, já são 328.206 óbitos em decorrência da covid-19 e um contingente de mais de 12,9 milhões de infectados pela doença.
Outros números divulgados pelas autoridades de saúde também ajudam a evidenciar que a crescente piora da pandemia no Brasil vem se consolidando. O último boletim da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), publicado na quarta (31), identifica que, atualmente, somente os estados de Roraima e Amazonas têm ocupação de leitos de UTI para covid abaixo dos 80%. A situação do Distrito Federal e de outros 17 estados é de uma lotação acima de 90%.
O estado de São Paulo, por exemplo, está com índice de 92%. Como a unidade federativa tem uma das redes de saúde mais estruturadas do cenário nacional, o dado que evidencia o atual contexto paulista acendeu mais um alerta entre os tantos que hoje chamam a atenção do país.
Medidas urgentes
Os especialistas seguem reforçando o coro sobre a necessidade de um sério lockddown nacional. Não só a medida tem sido constantemente negada pelo governo Bolsonaro, como o presidente da República segue criticando as políticas de isolamento.
Por conta disso, na quinta (1º), mais de 30 pesquisadores, cientistas e economistas enviaram uma carta a Bolsonaro, prefeitos e governadores pedindo que seja adotado um lockdown de três semanas no país.
Segundo o grupo, a iniciativa, nomeada de “Abril pela Vida”, teria o potencial de poupar 22 mil vidas, evitando que o Brasil chegue em breve a um patamar de 5 mil óbitos por dia, porque reduziria a média móvel de mortes. Também daria tempo para se obter a vacinação de quase todos os idosos acima de 60 anos.
A médica de família e comunidade Nathalia Neiva dos Santos, da Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares, reforça que, para o atual momento do país, não há saída em termos de respostas de curto prazo que não passe por uma séria política de lockdown.
“Quando se olha pra outros países, [se vê que] os que tiveram formas eficazes de controle da pandemia passaram justamente pela restrição na circulação de pessoas. É uma forma dura, traz consequências, não é livre de impactos negativos, mas, para o enfrentamento da pandemia, não se tem outra solução”.
Ela acrescenta que é necessário adotar esse tipo de medida mesmo com a imunização já em andamento: “Você olha para os países que estão avançando nas suas vacinações e todos eles conjugam a imunização com restrição de circulações, com lockdown. Não é uma invenção: é olhar para o exemplo deles, ver como estão fazendo esse enfrentamento, ver quais as taxas de eficiência e de sucesso no controle da pandemia”.
Disputa
Paralelamente a isso, o país discute também a possibilidade de empresas comprarem vacinas contra a covid neste período atual e iniciarem a imunização dos seus funcionários antes do fim da vacinação de grupos prioritários.
Após muita controvérsia, a permissão para a aquisição de lotes pelo setor já foi dada – e convertida em lei no último dia 10 –, depois de receber aprovação do Congresso Nacional. Mas a norma que entrou em vigor prevê que o empresário deve adquirir a carga e encaminhá-la para o Sistema Único de Saúde (SUS) enquanto durar a vacinação das categorias prioritárias.
Ao fim desse processo, os empregadores podem, então, utilizar 50% das vacinas e devem doar o restante para a rede pública. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tenta agora aprovar a queda dessa norma.
A proposta é criticada pela Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares porque, na prática, a iniciativa privada teria o poder de decidir quem vai passar na frente dos grupos prioritários.
“Isso é construir uma grande desorganização do cronograma vacinal, que vai ser regido de uma forma exclusiva, pra se voltar a anos anteriores à existência do SUS, quando se tinha coisas essenciais pra saúde, como bolsas de sangue, sendo vendidas como se fosse um produto comercializável, e não é assim que funciona a organização da saúde”, diz Nathalia Neiva dos Santos.
O regramento adotado hoje pela rede de saúde segue o Programa Nacional de Imunização (PNI), tema no qual o Brasil se consolidou historicamente como uma referência internacional. O país se destacou, por exemplo, como pioneiro na inserção de diferentes imunizantes no calendário do SUS.
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