SC: Com base no Marco Temporal, Senado aprova PDL que revoga demarcações de Terras Indígenas

O PDL de autoria do senador Esperidião Amin (PP/SC) e apoiado por nomes como Tereza Cristina (PP/MS) e Luis Carlos Heinze (PP/RS), tenta sustar artigos fundamentais do Decreto nº 1.775/1996, bem como as homologações das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, em Santa Catarina.

Por Camila Garcez.

Em mais um capítulo sombrio no desmonte da política indigenista brasileira, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, aprovou nesta terça-feira (28), o Projeto de Decreto Legislativo (PDL) nº 717/2024, que viola direitos dos povos indígenas e apaga todo um histórico de luta e reconhecimento de territórios. Em meio a uma crescente onda legislativa de retrocessos, o PDL de autoria do senador Esperidião Amin (PP/SC) e apoiado por nomes como Tereza Cristina (PP/MS) e Luis Carlos Heinze (PP/RS), tenta sustar artigos fundamentais do Decreto nº 1.775/1996, bem como as homologações das Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, em Santa Catarina.

A justificativa para esse ataque se apoia na Lei 14.701/2023, que instituiu a tese do Marco Temporal como base legal para o reconhecimento de Terras Indígenas. Uma tese já considerada inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal, mas que foi ressuscitada e transformada em Lei por um Congresso profundamente alinhado aos interesses do agronegócio.

Não se trata apenas de um ataque jurídico, é um ataque direto à vida, à história e aos direitos originários dos povos indígenas. O PDL 717/2024, ao questionar decisões já homologadas e abrir caminho para futuras revogações, ameaça o presente e o futuro de muitas comunidades. Ele mina a segurança jurídica e institucional do processo de demarcação de terras, um direito garantido com muita luta, pelo artigo 231 da Constituição Federal.

“O que o Senado aprovou hoje não é só um decreto, é uma sentença grave contra o direito originário dos povos indígenas, especialmente ao povo Guarani Mbya, da Terra Indígena Morro dos Cavalos e ao povo Kaingang, pertencente à Toldo Imbu. É abrir a porteira para mais despejos, mais violência e mais devastação dentro dos territórios, sejam eles demarcados ou não. O Marco Temporal não é um debate jurídico, é um projeto de apagamento cultural, territorial e de genocídio contra os povos originários”, afirma Grégor Daflon, porta-voz da Frente de Povos Indígenas.

Além da ameaça concreta às Terras Indígenas Toldo Imbu e Morro dos Cavalos, o PDL 717/2024 cria um precedente perigoso: se o Senado sustar homologações já formalizadas, abre-se um caminho para revisões arbitrárias de outros territórios, colocando em risco centenas de processos de demarcação em curso.

Para Dinaman Tuxá, coordenador executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), o momento exige mobilização total. “Estamos vendo um cenário de desmonte da política indigenista, da política de demarcação de Terras Indígenas. O Senado, mais uma vez, afronta o texto constitucional e tenta sustar os efeitos de homologação dos territórios Morro dos Cavalos e Toldo Imbu. Isso é mais um cenário do que essas bancadas que têm interesse sobre os territórios indígenas têm articulado, fazendo lobby dentro da política brasileira e principalmente dentro do Congresso Nacional. Esse PDL, vai refletir inclusive para as próximas homologações, se for aprovado no plenário do Senado”, frisou.

Nós continuamos denunciando que revogar demarcações é um retrocesso nos direitos indígenas. A promulgação da Lei 14.701/2023 só tem intensificado ainda mais os conflitos no campo e a violência contra os povos originários. O Marco Temporal se tornou um combustível para a supressão de direitos! Ao dar respaldo legal à narrativa de que só têm direito à terra os povos que a ocupavam em 5 de outubro de 1988, a Lei nega séculos de violência, expulsão forçada e apagamento.

Enquanto isso, a Mesa de Conciliação no Supremo Tribunal Federal, promovida como uma “solução”, continua sem protagonismo indígena e sem compromisso com os direitos constitucionais. Ainda há tempo de reconhecer essas falhas e equívocos e de fazer as devidas correções de rota.

No Congresso, o Pacote Anti-Indígena continua avançando dia após dia. Projetos que visam criminalizar lideranças, liberar mineração e restringir demarcações evidenciam a institucionalização da política do conflito, da grilagem, da destruição ambiental e dos territórios.

Estamos diante de um Congresso em modo “Vale Tudo”, que atropela sistematicamente a Constituição como parte de uma estratégia política deliberada. Eles insistem em legislar em sentido oposto, tentando reverter direitos assegurados pela Constituição. Esse comportamento revela um preocupante desrespeito à separação dos poderes e ao próprio Estado Democrático de Direito. Quando decisões judiciais e garantias constitucionais se tornam obstáculos a serem ignorados, e não limites a serem respeitados, abre-se um precedente perigoso. É preciso dar um basta no “vale tudo legislativo” que ameaça os direitos indígenas e os direitos constitucionais do Brasil.

“Terras Indígenas são comprovadamente essenciais no enfrentamento à crise climática. Em tempos de maior ocorrência e intensidade dos eventos climáticos extremos no Brasil, o Senado Federal deveria estar discutindo maneiras de proteger e ampliar esses territórios, e não rifá-los como moeda de troca!”, destaca Grégor.

Sem demarcação, não há democracia. Defender os direitos indígenas é defender a Constituição, a soberania popular e o futuro das próximas gerações e essa luta é coletiva. Assine a petição Marco Temporal Não! E nos ajude a chegar a 150 mil depessoas que exigem justiça e respeito aos povos originários.

Camila Garcez é jornalista amazônida, artista, mãe e ativista pela floresta viva e pelos direitos das mulheres.


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