Por Diego Sartorato
Uma resolução da Secretaria de Administração Penitenciária (SAP), assinada pelo secretário Lourival Gomes em 31 de janeiro, instituiu a possibilidade de criar alas especiais para detentos e detentas transsexuais e travestis nas penitenciárias de São Paulo, desde que haja consulta preliminar à população assistida. O estado é o quinto no país a adotar medida semelhante, após experiências bem-sucedidas em Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Paraíba e Mato Grosso.
“Essa é uma atitude muito importante para impedir que travestis e transsexuais que adentram o sistema prisional sejam punidas duas vezes: a primeira, com a restrição à liberdade. A segunda, pelo abuso físico e psicológico a que estão sujeitas em um sistema violento”, resume Keila Simpsom, vice-presidenta da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Travestis e Transsexuais (ABLGT). Nos presídios paulistas, assim como na Paraíba, travestis e transsexuais serão consultados antes que as alas especiais sejam criadas.
De acordo com Keila, essa parcela da população carcerária sofre com o tratamento recebido tanto dos agentes do estado quanto dos demais presidiários. De um lado, a obrigação de cortar o cabelo e usar sempre o nome de batismo, além da proibição a maquiagem, unhas compridas e roupas íntimas femininas, é fonte de abalo psicológico. “Não há respeito à identidade de gênero quando as meninas chegam à prisão e é como se dissessem: ‘você é homem e vai ter de agir como homem’”, diz Keila. De outro, são comuns os estupros coletivos por parte dos detentos, assim como relacionamentos forçados com lideranças do crime organizado e a colocação de gays, bissexuais, travestis e transsexuais como linha de frente no confronto com a polícia durante rebeliões.
Algumas dessas questões também constam da resolução da SAP. De acordo com o texto, os presídios terão de utilizar os nomes sociais de travestis e transsexuais no contato pessoal com as detentas e na documentação relativa a elas, e será permitido cabelo na altura dos ombros e roupa íntima feminina. Transsexuais que tiverem passado pela cirurgia de readequação sexual poderão ainda solicitar transferência para presídios do seu gênero, além de poder exigir revista apenas por agente do mesmo sexo. A regra para as revistas vale também para visitantes trans, que acumulam ainda o direito de serem sempre tratados ou tratadas pelo nome social.
O ponto frágil da regulamentação ainda é a saúde. Apesar de a resolução apontar obrigatoriedade de que os tratamentos de saúde específicos para trans e travestis sejam fornecidos, deixa a especificação dessas ações em aberto, ainda a serem decididas pela coordenadoria de saúde da SAP. “O mais importante é garantirmos a entrada de preservativos. Hoje, em muitas unidades, eles são proibidos porque argumenta-se que são usados para esconder drogas e celulares pelos detentos, mas não deixam de ser fundamentais para evitar a proliferação de DSTs”, aponta Fernanda Benvenutty da Silva, conselheira de saúde da ABGLT e integrante do Conselho Nacional de Segurança Pública. “Além disso, é imprescindível que o tratamento hormonal e a reposição de silicone sejam garantidas gratuitamente, pelo SUS, como já acontece para trans em liberdade.”
Fonte: Sul 21 com informações da Rede Brasil Atual
Foto: Ilustração