Por Clarinha Glock
O médico intensivista Joel Andrade, coordenador de transplantes de Santa Catarina (SC), está otimista: o número de doações de órgãos dos últimos seis meses colocou o estado em um patamar superior ao do período anterior à pandemia da covid-19.
De agosto de 2021 a janeiro de 2022 foram 181 doadores em 180 dias, o que representa, em média, uma doação por dia. Projetando para o período de um ano, equivaleria a 50 doadores por milhão de população (pmp), cifra só alcançada pela Espanha, que é referência em transplantes no mundo. A razão do sucesso foi a retomada da educação e da organização do sistema, diz o médico.
Santa Catarina recupera, assim, o primeiro lugar em doação de órgãos para transplantes, posição em que vinha se revezando com o estado do Paraná. Em 2019, SC se destacou com 47.4 doadores pmp. Em 2020, devido à covid-19, fechou o ano com 39.4 doadores pmp.
Os dados comparativos de todo país referentes a 2021 só serão divulgados em março pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO).
No entanto, em novembro do ano passado, a então coordenadora do Sistema Nacional de Transplantes (SNT), Arlene Badoch, se adiantou: em sua passagem por Florianópolis cumprimentou Andrade e sua equipe pela retomada da liderança, com 41 doadores pmp.
Formação em áreas estratégicas
O coordenador de transplantes de Santa Catarina explica que, desde junho de 2021, com a maior liberdade para deslocamentos e utilizando todas as medidas de proteção, foram retomadas atividades educacionais presenciais, como cursos para determinação de morte encefálica e de comunicação de más notícias.
Ele reconhece que os encontros virtuais seguem sendo importantes, porém acredita que não têm o mesmo impacto das reuniões in loco. “Voltamos a nos reunir em hospitais estratégicos e, desta forma, fomos rearticulando o sistema”, conta. As notificações de potenciais doadores e as taxas de conversão começaram então a subir.
Finalmente, em novembro de 2021, a Coordenação de Transplantes de SC organizou um curso em Florianópolis com cerca de 300 participantes. Foi o primeiro encontro presencial do sistema de transplantes depois de dois anos.
Na abertura, o médico carioca Lúcio Pacheco, que havia transplantado 1,2 mil pessoas, contou como desenvolveu um tumor de fígado e teve de ir para a fila de transplante, passando a ver o processo sob outra perspectiva. No encerramento, a coordenadora do SNT entregou diplomas a todos os hospitais doadores do Estado em reconhecimento pelo seu trabalho. “Isto estimulou muito as pessoas”, afirma.
Lista de espera
O desafio ainda é diminuir a espera por órgãos. Em SC, não havia lista de espera para córnea no pré-pandemia, e agora há 500 pacientes aguardando transplante.
Andrade ressalta que, neste momento, é imprescindível reforçar os processos de educação e gestão do sistema para avançar. Um dos problemas enfrentados durante a pandemia foi justamente a substituição de muitos coordenadores hospitalares de transplantes. Em várias regiões do Estado mais da metade deles foram substituídos.
“Portanto, o programa educacional que estamos aplicando agora é o mesmo que vínhamos fazendo, mas está dirigido principalmente a quem teve pouco treinamento, em função de terem sido cancelados os eventos presenciais”, enfatiza.