Por Rafael Tatemoto.
A bancada ruralista da Câmara dos Deputados tem reiteradamente se posicionado contra a participação de órgãos públicos de saúde e meio ambiente na Comissão Especial que debate o Projeto de Lei (PL) 6.299 de 2002, que altera as regras para a liberação de novos agrotóxicos no Brasil, tornando as regras para a concessão de autorização mais brandas.
Parlamentares da oposição tem requerido que instituições como o Instituto Nacional do Câncer, o Ibama, a Anvisa e a Fundação Oswaldo Cruz (FioCruz) possam ser ouvidas pelos integrantes da Comissão. Algumas dessas instituições já se manifestaram de forma contrária ao PL, apontando a relação entre agrotóxicos e doenças cancerígenas. Além delas, mais de 200 organizações da sociedade civil lançaram manifesto contra as alterações.
A atual legislação impede que substâncias cujo o uso isolado comprovadamente cause câncer ou mutações sejam liberadas. O chamado “Pacote do Veneno” pretende permitir o uso de todos, instituindo apenas a distinção entre o que é uso “seguro” ou “inseguro” de tais produtos. Marina Lacorte, especialista da Campanha de Agricultura e Alimentação do Greenpeace, afirma que a atuação dos ruralistas despreza os alertas da comunidade científica e se pauta por “interesses próprios”.
“A aprovação desse PL vai ser um verdadeiro desastre, tanto para saúde da população como para o meio ambiente. Vai desmontar completamente a lei atual em benefício da indústria. Nós já somos o campeão no uso dessas substâncias. Pela proposta, seria permitido a aprovação para uso de produtos que já se comprovam cancerígenas. Hoje, com a lei que temos, não pode seguir adiante e ser aprovada”, critica.
Carla Bueno, engenheira agrônoma e integrante da Campanha Permanente Contra os Agrotóxicos e em Defesa da Vida, defende que um dos elementos para compreender os interesses da bancada ruralista é o contexto das regras eleitorais em 2014, em que ainda eram possíveis doações empresariais.
“É uma bancada de muito poder. A votação do ‘Pacote do Veneno’ é um indicador do predomínio dos interesses contrários à maioria da população no Congresso. O número de ruralistas no Parlamento tem que ser entendido pela perspectiva de quem financiou as campanhas eleitorais desse setor. O povo sabe bem que quem paga a banda escolhe a música. Os interesses econômicos estão ligados à indústria do veneno”, diz.
Os ruralistas são quase 40% do Congresso Nacional, segundo dados da Agência Pública. Na Comissão Especial, a proporção é ainda maior: 37 de 50. Apesar dos intensos esforços para aprovação do parecer do PL no colegiado, têm enfrentado forte oposição de parlamentares críticos ao projeto, o que levou a diversos adiamentos da votação da matéria.