Leonardo Sakamoto.
Sabe aquele moleque nerd e gordinho que era o último a ser escolhido para os times de futebol da escola? Então, esse cara era eu.
Vamos deixar as coisas em uma perspectiva mais precisa: no campeonato entre classes, os times eram divididos em A, B e C, de acordo com o nível de aptidão do sujeito. Eu era sempre o último a ser considerado para o time C. Um dia fui o penúltimo, o que – pelo que me lembro – me trouxe grande alegria.
Enfim, naquela época era chamado de ruim, perna-de-pau, inútil, entrave, incapaz, grosso, âncora. Ou recebido simplesmente com um suspiro quando sobrava para alguém. Mesmo pelos piores entre os piores.
– Pô, mas porque eu tenho que ficar com o Leo? Isso é injusto! Vamos decidir na sorte.
– Não quero nem saber. Já fiquei com ele da última vez. Agora é a sua!
– Pessoal, eu estou aqui, ouvindo tudo.
Hoje, com a globalização inserida nas relações humanas e a internacionalização de elementos simbólicos a ponte de estarem presentes no cotidiano da periferia do capital, eu seria chamado apenas de “loser” e tratado com um certo desdém hispter.
Diz a máxima do Barão de Itararé: “de onde menos se espera, daí é que não sai nada mesmo”. E isso era totalmente comprovado pelos campeonatos no ensino fundamental. Como estava acostumado a levar acachapantes goleadas, dribles desconcertantes e sofrer com o justificável riso da torcida diante de minha incapacidade técnica gritante, acabei criando uma casca emocional. Podia ser 10 a 1, feito o histórico Hungria e El Salvador na Copa de 1982, que não me abalava. Firme como uma rocha? Não. Mas perseverante como o mar. É, gente… Ser ruim me fez mais forte.
Outras coisas não contribuíram, é claro. Sou palmeirense e vivi uma infância na fila de títulos. Só no ensino médio vim descobrir o gosto de ganhar alguma coisa. “Nossa, então é assim que os sãopaulinos, os corinthianos e o pessoal da Baixada se sentem?”, pensei após o título do Campeonato Brasileiro de 1993 após 20 anos na seca.
Por isso, quando passou a época áurea alviverde na década de 90, estava mais do que preparado para aguentar qualquer coisa. Segundona? Beleza. Goleada do Grêmio? Certo. Humilhação pelo Coritiba? Faz parte. Chulapada do Mirassol? Aqui é assunto de fortes, meu amigo. Não sabe brincar, não desce pro play.
Talvez por isso me abale de uma forma diferente com retumbantes derrotas ao contrário de amigos que eram os primeiros a serem escolhidos para os times ou aqueles que vivenciaram uma trajetória de vitórias esportivas. Conversei na noite desta terça, pós-derrota da seleção, com um deles que chorou ao telefone. Consolei, disse que também estava chateado com a derrota, expliquei que aquilo era só um jogo, acalmei sua raiva. De certa forma, ele achava que sem aquilo não sobrava muita coisa para ele. O mundo ficou sem sentido de repente.
Ao desligar o telefone, não pude deixar de refletir que saber como ganhar é importante, mas aprender a perder e ficar bem com isso é mais importante ainda. Porque, a menos que você tenha um pai e uma mãe que lhe compre a felicidade a cada momento, a gente perde tanto quanto ganha na vida.
Em tempo: cresci, amadureci, tornei-me homem. Descobri, após muito esforço, que minha vocação era ser goleiro. E continuo ruim, horrível, uma calamidade.
Fonte: Blog do Sakamoto