Revista Caros Amigos demite equipe de redação em greve

Por Michelle Amaral.

A equipe de redação da Revista Caros Amigos, que realizava uma greve desde a última sexta-feira (8), foi demitida. Em reunião nesta segunda-feira (11) com os editores, jornalistas e designers gráficos, o diretor-geral da publicação Wagner Nabuco argumentou “quebra de confiança” nos profissionais em greve.

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A jornalista Gabriela Moncau afirma que os integrantes da redação foram convocados por Nabuco através de um e-mail, no domingo (10), para a reunião desta segunda. “A gente tinha a perspectiva de que fosse uma reunião para conversar sobre a situação da revista, mas não foi isso que aconteceu, ele demitiu a todos”, conta.

A paralisação foi iniciada após o anúncio de um corte de 50% na folha de pagamento da redação, que passaria de R$ 32 mil para R$ 16 mil. Segundo a jornalista, o anúncio foi uma surpresa para todos da equipe. “Foi um comunicado, não foi um convite à conversa para falar sobre a situação financeira da revista e ver como coletivamente a gente podia resolver essa situação”, afirma.

Conforme Gabriela, a decisão pela greve foi tomada devido à falta de diálogo da administração com os trabalhadores após o anúncio do corte na folha de pagamento. “A gente achou que a greve era a única forma de pressionarmos para uma conversa para evitar que boa parte da revista fosse demitida sumariamente”, explica.

De acordo com nota divulgada pelos jornalistas, o diretor-geral justificou o corte na folha de pagamento “devido ao pagamento de dívidas fiscais acumuladas desde o ano 2000 e ao déficit operacional entre receitas da editora e custos fixos, incluindo os nossos (baixos) salários”.

Gabriela disse que a equipe de redação nunca teve acesso às contas da revista, que é mantida principalmente por anúncios, além da venda em bancas e assinaturas. Apesar disso, a jornalista afirma que, no último período, os profissionais se prontificaram a tentar ajudar a melhorar as condições financeiras da revista com a realização de mais edições especiais para serem vendidas nas bancas. “Existem uma série de alternativas para a gente tentar melhorar a situação financeira da revista”, completa.

Ela relata que desde a divulgação da nota sobre a greve na sexta-feira (8), a equipe recebeu diversas manifestações de solidariedade. Nesse sentido, acredita que alternativas como a publicização da crise financeira e a criação de uma campanha para ajudar a revista poderiam ser tomadas para que não fossem necessárias as demissões dos profissionais. “A gente compreende que existem dificuldades financeiras na Revista Caros Amigos, como existem dificuldades financeiras em uma série de outras publicações. Mas isso não justifica que as condições de trabalho sejam cada vez mais precarizadas”, argumenta.

Precarização
Na nota divulgada na sexta-feira (8), os integrantes da equipe denunciaram “a crescente precarização das nossas condições de trabalho, seja pela ausência de registro na carteira profissional, o não recolhimento das contribuições do FGTS e do INSS, e, agora, o agravamento da situação pela ameaça concreta de corte da folha salarial em 50%, com a demissão de boa parte da equipe”.

No entanto, conforme ela, a redação mantinha um diálogo permanente com a administração da Caros Amigos a fim de melhorar as condições de trabalho, com alguns pequenos avanços no que diz respeito ao salário –  ainda assim pago abaixo do piso da categoria de R$ 3.504,29 para 7 horas diárias. “Desde 2009, que foi quando essa equipe que há na redação hoje começou a ser montada, a gente tem se organizado para conversar com o diretor-geral da revista para ir gradativamente melhorando as nossas condições de trabalho”, conta.

Segundo a jornalista, a equipe de redação sempre teve dificuldades com relação a essas questões trabalhistas. “A gente nunca chegou a ganhar acima do piso ou teve perspectivas de registro [em carteira]”, afirma.

Veja nota sobre a demissão em massa divulgada pelos trabalhadores:

DIRETOR DA CAROS AMIGOS DEMITE EQUIPE DA REDAÇÃO EM GREVE

O diretor-geral da revista Caros Amigos, Wagner Nabuco, chamou hoje (11/03/2013) a equipe de redação e anunciou que a empresa está demitindo todos os trabalhadores que se encontravam em greve desde sexta-feira, dia 08/03, alegando “quebra de confiança”.

Nós, integrantes da equipe de redação da revista Caros Amigos – responsáveis diretos pela publicação da edição mensal, o site Caros Amigos, as edições especiais e encartes da Editora Casa Amarela – lamentamos a decisão da Direção. Consideramos a precarização do trabalho e a atitude unilateral como passos para trás no fortalecimento do projeto editorial da revista, que sempre se colocou como uma publicação independente, de jornalismo crítico e de qualidade, apoiando por diversas vezes, inclusive, a luta de trabalhadores de outras áreas contra a precarização no mercado de trabalho.

A greve é um instrumento legal, previsto na Constituição brasileira e direito de todos os trabalhadores. Foi adotada como medida para tentar melhorar as condições de trabalho na revista e foi precedida por uma série de incansáveis diálogos por parte desta equipe, desde que ela começou a ser montada em 2009. As tentativas foram sempre no sentido de atingir o piso salarial para todos os profissionais, encerrar os atrasos no pagamento dos salários e direitos como férias e 13º, que nos atingiram por mais de uma vez, de conquistar o registro dos funcionários fixos e uma melhor relação com colaboradores freelancers, que também convivem e conviveram com baixas remunerações e atrasos nos pagamentos.

Diante de alegações por parte da direção sobre dificuldades financeiras vividas pela empresa por se tratar de uma publicação alternativa, convivemos com salários mais baixos que os pisos e os praticados pelo mercado, e também com a inexistência de muitos direitos trabalhistas. Aceitamos negociar gradativamente a correção desses problemas de forma a fazer com que a Caros Amigos, “a primeira à esquerda”, não se tornasse agente de exploração de seus funcionários e avançasse nessa frente conforme suas possibilidades. Trabalhamos para ampliar a receita da empresa, seja pelo prestígio do trabalho realizado, muitas vezes premiado, seja pelo aumento do trabalho em forma de outras publicações como especiais e encartes.

Em todos os anos entre 2009 e 2013, mantivemos o diálogo salutar com a Direção, buscando negociar melhores condições para desenvolvermos o trabalho com o qual estávamos comprometidos. Isso foi feito por meio de cartas de toda a redação à direção, conversas de comissões da redação com a direção e inúmeras negociações entre o editor-chefe e diretor-geral.

Apesar de todos nossos esforços em construir uma boa relação interna, fomos pegos de surpresa com o anúncio de corte da folha salarial em 50%, com a demissão de boa parte da equipe ou redução do salário dos 11 funcionários de 32 mil pra 16 mil ao todo, conforme relatado em nota divulgada na data de anúncio da greve e que segue novamente ao final desta.

O anúncio de medida drástica que atinge diretamente os trabalhadores foi feito em forma de comunicado pelo diretor-geral, sem margem para negociação. Ainda buscamos pelo diálogo reverter o problema junto à direção por uma semana. Sem margem para conversa, recorremos à paralisação como forma de ampliarmos nossas vozes, mas fomos surpreendidos mais uma vez com o comunicado da demissão coletiva.

Nossa luta não é – e nunca foi – contra a revista Caros Amigos. Pelo contrario, reforçamos a importância de publicações contra-hegemônicas e críticas em um cenário difícil para a democratização da comunicação no Brasil, que cerceia a variedade de vozes. Nossa luta é, portanto, para o fortalecimento e a coerência de um veículo fundamental do qual sempre tivemos o maior orgulho de participar.

Vimos a público lamentar profundamente que essa crise provocada pela direção venha causar sérios prejuízos ao projeto editorial da Caros Amigos, que contou por todos esses anos com nossa dedicação.

Saímos desse espaço de forma digna diante de uma situação que tornou a greve inevitável, na esperança que nossos apelos sirvam de acúmulo para o futuro da Caros Amigos de modo que ela se torne exemplo não só no campo editorial, mas nas relações que mantém com seus funcionários e colaboradores. Esperamos que o compromisso assumido com colaboradores durante a gestão dessa equipe seja louvado e que eles recebam seus pagamentos sem atrasos. Também que sejam honrados nossos diretos trabalhistas.

Agradecemos todos que se solidarizaram com nossa situação e os que seguirão nos apoiando nessa nova etapa. Esperamos que esta experiência sirva de acúmulo e motivo de debate sobre a precarização, o achatamento de salários, a piora nas condições de trabalho e atitudes patronais – que existem tanto em empresas da grande imprensa quanto nas da contra-hegemônica – no sentido de buscarmos melhores condições para todos exercerem suas profissões. Por fim, esperamos que o exemplo comece pela imprensa contra-hegemônica com a correção de práticas como esta.

São Paulo, 11 de março de 2013.

01 – Alexandre Bazzan

02 – Caio Zinet

03 – Cecília Luedemann

04 – Débora Prado

05 – Eliane Parmezani

06 – Gabriela Moncau

07 – Gilberto Breyne

08 – Hamilton Octavio de Souza

09 – Otávio Nagoya

10 – Paula Salati

11 – Ricardo Palamartchuk

Fonte: Brasil de Fato.

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