Estagnação econômica, destruição de direitos e a greve histórica dos petroleiros
Ao longo de 2019 os chamados “formadores de opinião” do mercado, vinham afirmando que a economia estaria retomando, após a gravíssima recessão de 2015/2016. Segundo essa versão, o capital externo estaria retornando, o emprego formal estaria se recuperando, o que tenderia a reanimar demais indicadores econômicos, especialmente os de crescimento do produto. Os dados do Índice de Atividade Econômica (IBC-Br), divulgados pelo Banco Central em 14.02.20, novamente desmascara essa tese de recuperação da economia, que na realidade visa blindar a política neoliberal agressiva de Paulo Guedes. O IBC-BR, que é considerado um antecipador dos números do PIB, aponta um crescimento do produto em 0,89% em 2019, em relação ao ano anterior. Este número (deve se confirmar nos números das Contas Nacionais algo próximo) representa uma desaceleração frente ao já ridículo crescimento do último ano do governo Temer, de 1,3%.
Os economistas dos bancos, que se empenham em vender a ideia de que o governo Bolsonaro está “dando certo” na economia, estão sendo forçados a reajustar seguidamente as projeções para 2020, para baixo. A expectativa inicial de crescimento de 2% do PIB para este ano, por exemplo, ficou “exagerada” e está sob revisão contínua – e cadente – a partir de novos dados que vão sendo divulgados. Um detalhe importante é que o crescimento do ano passado, além de ser muito baixo, desacelerou no último trimestre, o que revela que a estagnação econômica adentrou 2020. Ou seja, a curva do produto é descendente, não por acaso os economistas dos bancos atualizam os números para baixo.
O drama da indústria é outro indicador de que a “retomada” não passa de fumaça. A produção industrial no Brasil diminuiu 1,1% em 2019, em relação a 2018, segundo informações do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Das 24 atividades pesquisadas pelo IBGE, 16 apresentaram queda no ano. Nos últimos dois meses do ano passado a queda acumulada chegou a 2,4%, sendo que o resultado de dezembro (-0,7%) é pior resultado no mês, desde 2015. O patamar de produção de 2019 é semelhante ao de 2009; é como se o país tivesse regredido, em termos de produção industrial, em dez anos. Os resultados da indústria, que atingiram tanto a indústria extrativa quanto a de transformação, significaram um banho de água fria nas análises de que o setor estaria se recuperando de forma consistente. O IEDI (Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial), afirma em publicação recente (Destaque IEDI, 04/02/20), que a década que se encerra em 2020, poderá ser considerada perdida para indústria. Segundo o estudo a perda acumulada é de 15% na indústria. Após muito anos, o Brasil caminha para sair do ranking dos 10 maiores países industriais do mundo. Decorrência direta de um processo mais profundo de desindustrialização, mas que foi acelerado pelas políticas do golpe a partir de 2016.
Uma outra amostra que revela o tipo de “retomada” que está ocorrendo são os dados impressionantes do mercado de trabalho. São 27,585 milhões de trabalhadores subutilizados (desempregados, subocupados, desalentados ou na inatividade por falta condições) e 12,575 milhões de trabalhadores desempregados. Segundo o DIEESE, com base nos dados do CAGED, quase a totalidade dos empregos gerados no ano passado estão na faixa de renda até 1,5 salário mínimo. A esperança do governo Bolsonaro de ter alguma estabilidade política, para continuar com o programa econômico de guerra contra o povo, seria a recuperação econômica, que poderia iludir os incautos por mais algum tempo.
Mas o problema é agravado pela crise mundial. Além do mundo crescer a percentuais baixos, há no horizonte o risco de uma grande crise financeira, fatores que dificultam ainda mais uma recuperação da economia brasileira, via comércio externo. Uma crise financeira agora, de grandes proporções, pegaria o Brasil no contrapé, pois a partir do golpe em 2016, o pais aumentou muito sua fragilidade externa. Por exemplo, o governo está queimando as reservas internacionais, na tentativa de deter o aumento do câmbio. Outro risco não desprezível é a possibilidade da elevação da inflação, em função da pressão do câmbio. A desvalorização do real (o dólar estava em R$ 4,32 ontem) arrisca contaminar os preços internos, via importações de insumos e outros, e haver uma elevação significativa da inflação. Um aumento da inflação em meio a uma estagnação econômica monstruosa como a atual, poderia significar o fim do governo Bolsonaro.
Está no centro da conjuntura nacional a greve histórica dos trabalhadores da Petrobrás. São 20 estados, 120 unidades mobilizadas, com mais de cerca de 21 mil trabalhadores mobilizados. É o maior movimento grevista da categoria, desde a greve histórica de 1995, com possibilidades de ultrapassar esses números. Conforme informações dos petroleiros, neste momento, somente as bases operacionais estão mobilizadas, mas há a perspectiva de envolver as bases administrativas também. Estão fazendo uma greve contra tudo e contra todo o poder do capital. Em decisão do início do mês o Tribunal Superior do Trabalho (TST), determinou uma multa diária de R$ 500 mil aos sindicatos que não cessarem a greve petroleira, iniciada em 1º de março. Na prática, este é o fim do direito constitucional de greve, que os trabalhadores conseguiram a duríssimas penas, em lutas seculares.
Como uma categoria irá realizar a greve, para enfrentar ataques ferocíssimos por parte da direção da empresa, se 90% do quadro tem que se manter trabalhando? Como a decisão do TST não conseguiu amedrontar os petroleiros, no dia 17 de fevereiro o ministro Ives Gandra, atendeu a direção da Petrobrás e publicou decisão que coloca a greve dos petroleiros na ilegalidade. Na decisão o ministro estabelece multa diária que pode chegar a R$ 500 mil e possibilita a demissão de grevistas. Os petroleiros, que estão no centro dos acontecimentos nacionais mostram o caminho para conter a destruição dos direitos e a entrega das riquezas do país.
José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico do DIEESE em Santa Catarina.
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