Por Guigo Ribeiro, para Desacato.info.
As mãos seguram firme o ferro
É cedo e o corpo ainda não acordou direito
Tanto que balança de um lado pro outro como bem quer o coletivo
Diz que é normal mesmo
Que em todo canto é assim com o corpo das pessoas
Levantam cedo pra acordar, de fato, só bem depois
Vai saber
Não se sabe muito das coisas quando não se pode pensar sobre elas
É todo dia assim e nem dá pra reclamar
Dá pra saber que o coletivo vai pelas ruas guiado
Por um corpo que também levantou sem ter acordado
Ah… quem dera essa janela fosse vista pro azul que é tão lindo, tão lindo
Que mal dá vontade de parar pra olhar
Se fosse, descia logo dessa máquina e se jogava nos braços de mamãe
E por lá ficava
Quem dera essa janela fosse vista pra um dia bom e noite de estrelas
Que nascem devagar
Um pontinho brilhando
Depois outro e outro
Até tomar o infinito inteiro
Quem dera
Ou esse caminho tão silencioso
Invadido por vozes em coro
Cantando a alegria de um destino próximo feliz
A gente aqui, sem vontade, dá bom dia pro cara da catraca
Que inferno, não?
Aqui a gente só vai pelos dias
2 anos atrás, acho, foi diferente
Deu pra ir sentado
E foi diferente porque o corpo sentiu diferente o próximo e o outro próximo
São 3
E se todo dia fossem 3, mas sentado?
É muito?
Ah… a janela
É bom voltar a falar da janela porque o tempo passa e a alma acalma
Porque não sai da cabeça a ideia que lá poderia ser o azul mais lindo
E que ia pular nesse azul mais lindo e se acalmar nos braços de mamãe
Ela diria baixinho no ouvido pra ter força
Pra seguir
E que dessa vida não se leva nada, mas que se deixa muita coisa
Se deixa um absurdo de coisa
E que o grande desafio é atravessar o tempo nessa vida
Sem explodir alguém ou se explodir
Mamãe diria coisas boas
E falaria de chás e banhos
Sabe o que queria?
Que essa janela fosse vista
Tudo bem que depois vem a vida e sua dificuldade
Mas poder ver mamãe todo dia seria cura
Mandaria um beijo todo dia
Que fosse… um beijo e uma prece
Mas…não dá
Bom… o coletivo chegou ao destino
Faltam 2
2 em pé
E é seguir
Deixe! Deixe de sonho
É começar esse dia que parece ser longo
Vai ver que é melhor
Se sofre menos assim
E produz mais.
Imagem tomada de: viatrolebus.com.br
Guigo Ribeiro é ator, músico e escritor, autor do livro “O Dia e o Dia Que o Mundo Acabou”, disponível em Edfross.