Por Cida de Oliveira.
São Paulo – O Brasil deixou de arrecadar R$ 9 bilhões no período de 2010 a 2017 somente com a isenção fiscal da Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (Cofins) e do PIS/Pasep para o setor de agrotóxicos. Esses tributos têm papel relevante para subsidiar a seguridade social, que inclui as áreas de sau?de, educac?a?o e assistência social.
O dado consta de auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), para avaliar a preparação do governo brasileiro para implementar e monitorar o cumprimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – Agenda 2030. Trata-se de compromisso assumido pelo Brasil com a Organização das Nações Unidas (ONU) para erradicar a pobreza e promover vida digna para todos, dentro dos limites do planeta.
Os dados são incompletos. Trata-se de estimativas calculadas a partir das informações disponíveis. Além disso, não contemplam o Imposto de Importação (II) e nem o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), já que as desonerações desses produtos não configuram gasto tributário. E o cálculo não abrange a redução na base de cálculo do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), por ser um tributo estadual.
Para os auditores, as desonerações não são acompanhadas nem avaliadas pelo governo federal “devido às falhas de governança” e são concedidas independentemente de seu nível de toxicidade à saúde e de periculosidade ambiental.
“O dado é a ponta do iceberg. Só no estado de São Paulo, o governo abriu mão de R$ 1,2 bilhão em 2015. Então, para chegar mais perto da realidade, a estimativa do TCU deveria ser multiplicada pelo menos por três, já que há outros grandes consumidores estaduais, como Mato Grosso, Minas Gerais e Rio Grande do Sul. Além disso, agrotóxicos são considerados insumos agrícolas e, nessa condição, a despesa é abatida integralmente na declaração de rendimentos do imposto de renda pessoa física (IRPF) e pessoa jurídica (IRPJ) e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL)”, disse o defensor público Marcelo Novaes, da Defensoria Pública do Estado de São Paulo em Santo André, no ABC paulista, e integrante do Fórum Paulista de Combate aos Impactos dos Agrotóxicos e Transgênicos.
“Importante lembrar que além da carga de tributos federais baixíssima, é enorme a desoneração de ICMS. Uma perda tributária absurda em razão da integral dedutibilidade nos impostos sobre a renda. Uma desoneração sem nenhuma seletividade. Produtos mais perigosos à saúde têm tratamento tributário idêntico ao menos agressivo.”
Os R$ 9 bilhões estimados da renúncia fiscal correspondem à receita que municípios como Macaé (RJ) levam quatro anos para arrecadar. Com 244 mil habitantes, tem em seu território empresas da cadeia do petróleo. O montante é suficiente para adquirir 130 mil unidades habitacionais do programa Minha Casa, Minha Vida em Curitiba.
Pacote do Veneno
A concessão de benefícios tributários à indústria dos agrotóxicos foi um dos principais temas discutidos em seminário realizado ao longo desta sexta-feira (29) no Sindicato dos Químicos de São Paulo. Realizado pela Campanha Permanente contra os Agrotóxicos e pela Vida, o encontro integra a agenda de fortalecimento da articulação dos movimentos sociais para a resistência ao avanço de políticas que pretendem ampliar o uso de agrotóxicos no país.
Na segunda-feira (25), o Pacote do Veneno foi aprovado em comissão especial da Câmara. Agora está nas mãos do presidente da casa, o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que deverá estudar o momento mais estratégico para colocar em votação.
“Vivemos uma conjuntura difícil, e os trabalhadores são a parte mais frágil, os que vão sofrer mais com mais agrotóxicos. Aqueles que vivem na cidade e, principalmente, os que vivem no meio rural. Vamos fortalecer a nossa rede”, disse a agrônoma Carla Bueno, da coordenação da Campanha Permanente.
O apoio ao Projeto de Lei 6.670/2016, que estabelece a Política Nacional de Redução de Agrotóxicos (Pnara), é outra frente de combate ao avanço Pacote do Veneno. A comissão especial já está instalada. O presidente é o deputado Alessandro Molon (PSB-RJ) e o relator, Nilto Tatto (PT-SP).
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Participaram ainda da mesa de debates Kelli Mafort, da coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais sem Terra (MST), a pesquisadora e professora do Departamento de Geografia da Universidade de São Paulo (USP) Larissa Mies Bombardi, autora do atlas Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia, e Susana Prizendt, coordenadora da campanha contra os agrotóxicos no estado de São Paulo. Na plateia, estiveram agricultores, ativistas, estudantes, cozinheiros, professores e parlamentares.