O desprezo do desgoverno de Jair Bolsonaro pelas camadas mais pobres da população mantém em alta a inflação dos alimentos, principal gasto das famílias das classes D e E. Segundo divulgou nesta quarta (23) o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice de Preços ao Consumidor Amplo – 15 (IPCA-15) ficou em 0,45% em setembro – a maior para o mês desde 2012, quando ficou em 0,48%.
A alta foi pressionada justamente pelos preços dos alimentos e bebidas, que subiram 1,48% no período. O maior impacto foi causado pelas altas das carnes, tomate, óleo de soja e arroz. As carnes ficaram 3,42% mais caras, e tiveram o maior impacto dentro do grupo. Também ficaram mais caros o tomate (22,53%), o óleo de soja (20,33%), o arroz (9,96%) e o leite longa vida (5,59%). Os três últimos itens acumularam altas de 34,94%, 28,05% e 27,33% no ano, respectivamente.
Os transportes, com alta de 3,19%, também pesaram, puxados pela gasolina, que ficou 3,19% mais cara. O óleo diesel (2,93%) e o etanol (1,98%) também apresentaram alta. Apenas o gás veicular registrou queda de 2,58%.
O indicador – que é considerado uma prévia da inflação oficial do país – mostrou aceleração em relação ao índice de agosto, quando ficou em 0,23%. No ano, a prévia da inflação acumulou alta de 1,35% e, em 12 meses, atingiu 2,65%.
O IPCA-E, que é o IPCA-15 acumulado no trimestre, foi para 0,98%, acima da taxa de 0,26% registrada no mesmo período de 2019.
Todas as regiões pesquisadas tiveram alta de preços em setembro. O maior resultado foi registrado em Goiânia (1,10%), devido às altas nos preços da gasolina (8,19%) e do arroz (32,75%). Já a menor variação foi registrada na região metropolitana de Salvador (0,18%).
Enquanto o ministro-banqueiro da Economia, Paulo Guedes, se submete à humilhação pública pelos colegas de ministério, a expectativa de inflação do mercado para este ano chega a 1,99%, segundo o relatório Focus, divulgado nesta segunda (21) pelo Banco Central. Já para o Produto Interno Bruto (PIB), a projeção dos analistas é de um tombo de 5,05% em 2020.
Em meio à alta de alimentos da cesta básica, os estoques públicos de alimentos sofreram redução de 96% na média anual, em uma década, considerando seis diferentes tipos de grãos. O arroz está entre os que mais puxaram a queda na armazenagem. Além dele, o feijão sumiu dos estoques públicos há mais de três anos, e a soja, um dos principais produtos nacionais, não é armazenada desde 2013.
Segundo reportagem do portal ‘UOl’, a decisão deliberada do governo de manter os estoques baixos deixa os preços dos produtos à mercê da oferta e da procura do mercado e da oscilação no valor do dólar, sem interferência do Estado. “Em 2010, havia armazenadas quase 1 milhão de toneladas do grão, volume que despencou para 21 mil toneladas —patamar mantido desde fevereiro do ano passado a até agora”, destaca a matéria.
Renda do trabalhador cai 20%
Ao mesmo tempo, a renda do trabalhador brasileiro caiu, em média, 20,1%, segundo a pesquisa ‘Efeitos da pandemia sobre o mercado de trabalho brasileiro’, publicada pela Centro de Políticas Sociais da Fundação Getúlio Vargas (FGV Social), que mediu pela primeira vez os efeitos da pandemia da Covid-19 em um trimestre fechado. No cálculo, consideram-se mercados formal e informal e também a parcela de trabalhadores sem emprego.
No segundo trimestre desde ano, período de abril a junho, a renda teve queda de R$ 1.118 para R$ 893, em comparação com o trimestre anterior. Ainda de acordo com o estudo, a comparação entre esses dois períodos também mostra que a desigualdade, medida pelo índice de Gini, aumentou 2,82%. Tanto a queda média na renda como o índice Gini atingiram nível recorde quando analisadas variações da série histórica, iniciada em 2012.
Os grupos que mais perderam foram os indígenas (-28,6%), analfabetos (-27,4%) e jovens entre 20 e 24 anos (-26%). O impacto da pandemia na renda da população mais pobre foi ainda maior do que na dos mais ricos. A metade mais pobre da população brasileira perdeu 27,9% da renda, em média, passando de R$ 199 para R$ 144. Enquanto isso, os 10% mais ricos perderam 17,5%, indo de R$ 5.428 para R$ 4.476.
“Trata-se de uma recessão excludente, onde o bolo de rendimentos cai para todos, mas com mais força entre os mais pobres”, diz o estudo. Ainda segundo a pesquisa, a queda na renda de 20,1% foi impulsionada pela redução na jornada de trabalho, que foi de 14,34%, em média, e a outros fatores, como a própria diminuição na oferta de vagas. Ao mesmo tempo, a taxa de ocupação, que mede o nível de emprego no país, caiu 9,9%, mas poderia ter caído 22,8% se não houvesse a redução das jornadas.
Bilionários ficam mais ricos
Enquanto cai a renda dos trabalhadores, os bilionários aumentaram suas fortunas durante o período de pandemia, tanto na América Latina como no mundo. Os dados são de relatório divulgado nesta quarta (23) pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). E informam que a redução de horas trabalhadas em todo o mundo levou a uma “drástica” diminuição do rendimento.
Segundo a OIT, apenas nos três primeiros meses do ano, os rendimentos provenientes do trabalho diminuíram em torno de 10,7% em relação ao mesmo período de 2019. Isso equivale a aproximadamente US$ 3,5 bilhões (perto de R$ 19,6 bilhões, no câmbio de hoje). “Essa cifra não inclui os efeitos das medidas adotadas pelos governos para sustentar o nível de renda”, pondera a entidade. A renda do trabalho caiu principalmente em países de renda menor. Segundo a OIT, a América foi a região mais atingida, com queda de 12,1%.
“Ao mesmo tempo em que redobramos esforços para vencer o vírus, devemos adotar medidas para mitigar seus efeitos nos aspectos econômico, social e de trabalho”, diz o diretor geral da OIT, Guy Ryder. “Principalmente, fomentar o emprego e a atividade empresarial, e assegurar a renda.”
O relatório ‘Quem Paga a Conta? – Taxar a Riqueza para Enfrentar a Crise da Covid na América Latina e Caribe’, publicado pela Oxfam Brasil, segue a mesma linha. Segundo o estudo, 73 bilionários da América Latina e do Caribe aumentaram suas fortunas em US$ 48,2 bilhões (R$ 265,5 bilhões), apenas entre março e junho deste ano. No Brasil, os 42 bilionários do país aumentaram suas fortunas em US$ 34 bilhões (R$ 187,3 bilhões) no mesmo período.
“A Covid-19 não é igual para todos. Enquanto a maioria da população se arrisca a ser contaminada para não perder emprego, os bilionários não têm com o que se preocupar”, diz Katia Maia, diretora executiva da Oxfam Brasil.
A entidade está revendo suas estimativas, considerando perdas maiores que as previstas inicialmente. Do quarto trimestre de 2019 para o segundo deste ano, por exemplo, calcula-se redução de 17,3% nas horas trabalhadas. É o equivalente a 495 milhões de empregos de jornada completa (48 horas semanais). Antes, previa-se retração de 14% (400 milhões).
Também se preveem quedas nos terceiro e quarto trimestres. “Um dos motivos (sobre a nova estimativa de retração) é que os trabalhadores nas economias em desenvolvimento e emergentes, em particular no setor informal, têm sido muito mais atingidos do que em crises anteriores”, afirma a entidade.