O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), não assinou ofício que o notifica sobre decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) determinando seu afastamento. A liminar expedida na segunda-feira (5) pelo ministro Marco Aurélio Mello acatou ação movida pela Rede, argumentando que ao ser tornado réu pelo plenário da mais alta corte do país, na semana passada, Renan não poderia permanecer no posto de presidente do Congresso e, portanto, na linha sucessória da presidência da República. A decisão do senador teve o aval de toda a mesa diretora do Senado Federal (que é composta por 11 senadores) de forma oficial.
O posicionamento que contrariou a expectativa de que Renan receberia a notificação do STF ontem (6) às 11h, começou a ser construído na noite de ontem, a partir de reunião de lideranças da base de Temer e também da oposição. Um dos articuladores desse entendimento foi o senador Roberto Requião (PMDB-PR), que falou rapidamente com jornalistas durante uma pausa nas conversas. Extraoficialmente, no entanto, o vice-presidente do Senado, Jorge Viana (PT-AC), já assumiu o comando dos trabalhos na Casa, com o apoio do próprio Renan, e cancelou a sessão de hoje.
O fato de os entendimentos sobre o caso envolverem parlamentares aliados e desafetos do alagoano vem da interpretação de que Marco Aurélio Mello teria tomado uma decisão considerada unilateral e abusiva, que agravará a crise entre os poderes Legislativo e Judiciário.
Ao falar sobre o assunto, após a reunião, Renan Calheiros demonstrou incômodo, usou um tom de ironia, sem conseguir disfarçar a irritação. “Se eu gritar, saio do tom”, disse aos jornalistas, para que se reunissem de forma que conseguissem escutar sua fala. Ao mesmo tempo, dando a entender que este é o método que pretende adotar em relação à polêmica com o STF.
O presidente do Senado afirmou que a decisão da mesa diretora teve como base a questão da separação e independência dos poderes, prevista pela Constituição Federal. Motivo pelo qual os senadores chegaram ao entendimento de que não podem aceitar uma decisão de afastamento do presidente de um poder, tomada de forma isolada por um único representante de outro poder. Renan ainda lembrou que está próximo dos trabalhos do Legislativo este ano e que, no início de 2017, haverá eleição para escolha de nova presidência da Casa.
“Estamos há nove dias do término dos nossos trabalhos e a decisão (do afastamento) foi tomada por um único ministro. Nenhuma democracia merece isso”, reclamou.
Na única vez em quem mencionou o ministro Marco Aurélio Mello, Renan disse que depois que acabou com os supersalários no Senado, o tema passou a ter repercussão nos outros poderes (uma comissão de parlamentares analisa proposta legislativa a respeito) e isso, a seu ver, pode ter incomodado o ministro. “Toda vez que se fala em acabar com super salários, ele (Marco Aurélio Mello) treme na alma.”
Versão mais polida
A fala de Renan Calheiros refletiu o dia inteiro de reuniões entre várias bancadas e setores parlamentares, sem filtros. Oficialmente, o Senado tentou passar uma versão um pouco mais polida da decisão anunciada. Pouco tempo antes de o presidente dar entrevista, assessores da mesa diretora passaram a versão de que não há interesse, por parte da Casa, em descumprir propriamente a decisão da mais alta corte do país. E, sim, no sentido de ouvir todo o colegiado do STF a respeito do caso antes de afastar o presidente.
Desde o início da tarde, líderes partidários de todas as legendas se reuniram com Renan Calheiros e políticos expressivos, como o ex-senador José Sarney, para tratar a questão, observada pela primeira vez na história do país. Os senadores ainda estão discutindo a situação dos trabalhos legislativos, daqui por diante.
A expectativa agora é saber se haverá mudança na pauta de votações definida para a próxima semana e se, no caso de a decisão a respeito de Renan vir a ser confirmada pelo STF, os senadores terão ou não de votar sobre o afastamento do atual presidente do Senado no plenário da Casa para referendá-la.
O senador, que é alvo de investigação em 11 ações, foi transformado em réu num processo, na última quinta-feira (1º), pelo STF. No início da manhã, seus advogados apresentaram recurso contra a decisão do ministro de afastá-lo da presidência do Senado.
Preocupação com Vianna
A ascensão do petista Jorge Vianna tem sido vista como fenômeno no mínimo curioso. Integrantes do PMDB e do PSDB, no Parlamento e no Planalto, reconhecem o caráter conciliador do acreano, sua afinidade com Renan e disposição para o diálogo. Mas não deixa de ser um petista – temerosamente “mordido” com a forma arbitrária com que se se deu o golpe que derrubou Dilma.
Do lado da oposição, Vianna é visto com um integrante fiel do PT, que estaria longe de ser um “traíra como Delcídio (do Amaral)”, mas que não deixa de ser um conciliador capaz de frustrar as expectativas dos petistas. Com poderes de presidir o Congresso até 1º de fevereiro do ano que vem, Vianna poderia, ao menos momentaneamente, frear o trator do golpe no Parlamento.
A oposição apela para que a PEC 55 – que congela os gastos públicos – seja retirada de votação. A direção nacional da CUT, reunida em Florianópolis, enviou hoje documento a Jorge Vianna em que pede o adiamento da votação – prevista para a próxima terça-feira (13). E até mesmo a base de Temer, diante da crise anunciada, sinaliza concordar com tirar o pé do acelerador, diante dos últimos acontecimentos. O consenso em relação à paralisação dos trabalhos no dia hoje, que já impõe um atraso ao cronograma de votação da PEC, já foi um indicador disso.
Como disse o senador Lindbergh Farias, em entrevista a Paulo Henrique Amorim, no Conversa Afiada, empurrar a PEC 55 para fevereiro já seria uma vitória: “Estamos em uma situação em que uma semana vale por dez anos. Fevereiro a gente nem sabe como vai estar, se vai existir governo Temer, porque a crise é muito grande”.
—
Fonte: Sul21