Por Elaine Tavares.
O tempo das redes é o tempo dos influencers, ou, no bom português, influenciadores. Essa é uma categoria de pessoa que apareceu nas plataformas sociais tendo como objetivo vender coisas. Roupas, bolsas, joias, panelas, o que seja. O negócio deu certo e há gente que vende coisas com milhões de seguidores. Aí começaram a aparecer influenciadores de ideias, no geral coisa rala, mas que pega direto na pleura. Então, sem maiores explicações ou conhecimento alguém pode falar dos temas mais complexos e angariar milhões de seguidores, mesmo que só tenha lido as orelhas do tema em questão. Isso quando não inventam teorias mirabolantes sobre a realidade. É uma matilha que cresce na internet de maneira vertiginosa.
A coisa é tão doida que sindicatos, movimentos sociais e partidos políticos procuram seguir o exemplo fazendo o jogo das grandes empresas que controlam essas plataformas. Ou seja, em vez de informar ou formar, desinformam e alienam. Há uma corrida desesperada para entender os algorítmos, para disputar espaço com esse povo que vende coisas, que chega a ser assustador.
Claro, o quadro social não é tão simples. Há influenciadores que só vendem coisas, há os que mentem descaradamente, há outros que vendem coisas e um modo de vida, uma ideia, há outros que verdadeiramente estão tentando passar informações relevantes para que os seguidores entendam a realidade. Mas, no geral, quem sai da lógica da dancinha, do vídeo engraçadinho e se aventura a divulgar temas que realmente tocam nas questões estruturais da sociedade, tá lascado. Não tem seguidores. Ou tem poucos, considerados irrelevantes para o sistema.
Bom, se formos lembrar os tempos em que não havia a rede, a coisa não era muito diferente. Pessoas com pensamento crítico pouco eram chamadas para entrevistas na TV, no rádio ou no jornal. Quem dominava a cena midiática eram os apoiadores do capital. Apenas a plataforma tecnológica era outra. Claro que nos tempos atuais a coisa assusta pela proporção. Uma bobagem dita na rede tem alcance mundial. Mas, a realidade de fundo pouco mudou. Os que recebem mais visibilidade nas plataformas são os “sacerdotes do capital”, para usar uma expressão de Álvaro Vieira Pinto que, aliás, tem uma obra imprescindível para a gente entender a tal da tecnologia.
Agora, estamos nessa de discutir, muito velozmente, o lance da regulamentação das chamadas “grandes plataformas” ou como preferem os fãs da língua inglesa, as Big Techs. Nas redes da ultra direita a mentira rola solta. Falam em censura, em cerceamento da liberdade e toda essa pataquada que foi hegemônica no governo do militar. Um discurso que pega na massa.
Ora, regular não é censurar. Por isso há regras no trânsito, regras para o convívio social etc… São regras para que a coisa possa fluir com segurança. Como as grandes plataformas permitem o festival de mentiras, injúrias, preconceitos, e outros crimes contra a pessoa e a sociedade, é óbvio que precisam de regulamentação.
Ocorre que as grandes plataformas são os “bispos” do capital. São o braço armado do sistema que se articula em escala global e elas não querem ser reguladas por ninguém. Consideram-se acima da lei e de todas as regras. Vendem os dados das pessoas, espionam, inoculam veneno e tudo bem, é isso mesmo. Existem para isso.
Agora é ver como se comportam os outros sacerdotes do capital, deputados e senadores, conhecidíssimos por sua lealdade à classe dominante, aos interesses do capital. Alguém arrisca um palpite?
Enquanto isso, nós, da esquerda, temos uma comunicação ineficaz e o governo dito progressista tampouco se esforça para verdadeiramente informar a população. Não há um projeto para comunicar e o discurso da direita é o que prolifera em velocidade estonteante.
O que vamos ver então é um tema dessa importância ser votado de maneira veloz, sem debate com a sociedade. Assim, seja lá o que for decidido lá no Congresso vai permanecer incompreensível para a maioria da população, para os trabalhadores. Alguns, capturados pela direita, seguirão acreditando que querem censurar e cercear o direito de cada um dizer o que quer, e o pessoal da esquerda vai acreditar que com essa lei as grandes empresas internacionais vão deixar de divulgar a mentira.
Difícil demais isso aí. Porque nem é censura, nem as tais plataformas vão deixar de disseminar sua ideologia. Pode dar uma travadinha sim, mas será temporário.
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Foto: criação de Justin Metz.
Elaine Tavares é jornalista e escritora. Trabalha no IELA/UFSC e é jornalista em Pobres&Nojentas e Rádio Campeche.