Desde antes da queda da presidenta Dilma Rousseff, acusações vêm sendo feitas contra o governo dos Estados Unidos por seu suposto papel no recente golpe de Estado no Brasil.
O que pode ser um indício do envolvimento de Washington é a presença da USAID no País.
A United States Agency for International Development (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional) é uma agência vinculada ao Departamento de Estado dos EUA. Em seu site, a organização afirma que trabalha para “acabar com a pobreza extrema global e possibilitar que sociedades democráticas realizem o seu potencial”.
Na realidade, ela atua em diversos países ao redor do mundo, junto a governos e instituições públicas e privadas, financiando projetos e Organizações Não-Governamentais (ONGs). Como pertence ao Departamento de Estado, ela recebe verba do governo dos EUA.
A USAID também desempenhou papel fundamental na tentativa de desestabilização de vários governos nos últimos anos, como os de Venezuela e Cuba. Ela atua publicamente em países que passam por conflitos políticos, como Síria, Ucrânia, Líbia, Paquistão e Colômbia.
No Leste Europeu, por exemplo, a organização destina atualmente U$ 698,1 milhões para “conter a agressão russa”. Entre seus objetivos está o fortalecimento de economias de mercado, oportunidades comerciais, meios de comunicação, instituições democráticas e esforços anticorrupção. “Esses esforços vão ajudar Ucrânia, Geórgia, Moldávia e seus vizinhos contra o aumento da pressão da Rússia”, afirma a USAID na descrição dos destinos de seu orçamento.
No Brasil, a agência trabalha há mais de 50 anos. Seu primeiro e mais famoso acordo com o governo brasileiro foi a parceria MEC/USAID, implementada no início da ditadura militar, que submeteu o ensino brasileiro aos critérios dos EUA.
O atual diretor dessa agência no Brasil é Michael J. Eddy, que ocupa o cargo desde agosto de 2015. Ele lidera a transição da USAID no Brasil, de “Missão” para Escritório de Representação no País.
Por meio de Eddy, a entidade atua em parceria com o governo brasileiro, a sociedade civil e o setor privado na coordenação do programa de conservação da biodiversidade da Amazônia brasileira, orçado em U$ 50 milhões. A agência estadunidense considera o Brasil um país de máxima prioridade para a preservação da biodiversidade.
Bacharel em Relações Econômicas Internacionais e Ciência Política pela Universidade de Wisconsin, mestre em Relações Internacionais (Desenvolvimento e Estudos Comparativos e Regionais – América Latina) pela Universidade Americana e pós-graduado em Gestão de Desastres pela Universidade de Wisconsin, Eddy é um experiente profissional. São 26 anos de carreira com experiência em desenvolvimento internacional, incluindo 18 anos pela USAID, “especializado em governança democrática, administração pública, resposta a crises e assistência humanitária”, informa a agência em seu site.
Profissional sênior em desenvolvimento com experiência em gestão de equipes diversas e talentosas em cenários complexos de “desenvolvimento, transição, crise e resposta a desastres naturais”, é o que apresenta em um documento sobre seu perfil e experiência profissional. “Representa o governo dos EUA perante lideranças de governos estrangeiros e parcerias não governamentais, a respeito de assuntos de assistência em desenvolvimento e transição, e ligando a liderança do governo dos EUA relacionada à USAID a cenários complexos de desenvolvimento e transição.”
Antes de ser funcionário da agência, Eddy trabalhou para o Banco Mundial, para o Management Systems International (MSI, usado pela própria USAID como uma organização de fachada que implementa projetos de mudança política de forma branda, a partir de apoio a organizações da sociedade civil, treinamento de lideranças e planos de privatização) e para o National Democratic Institute (NDI), instituição ligada ao Partido Democrata dos EUA.
Michael Eddy sempre trabalhou em países envolvidos em conflitos internos: El Salvador (1992-1994), Haiti (1995-1996), Angola (1997-1998), Nicarágua (1998-00), Bolívia (2000-02), Macedônia (2003-08), Bolívia (2008-10), Sudão (2010-11), Myanmar, Tailândia e China (desde 2011) e Sri Lanka e Maldivas (fevereiro-junho, 2015).
Em agosto de 2015, mesmo mês do terceiro grande protesto antigovernamental contra Dilma Rousseff, organizado por movimentos financiados por instituições estadunidenses, ele desembarcou em Brasília para dirigir a USAID.
Grupo Mais Unidos
Assim como nos outros países em que atua, a agência financia projetos e organizações no Brasil. A principal é o Grupo Mais Unidos, seu intermediador em vários projetos. Criado há dez anos, o +Unidos é uma parceria entre a Missão Diplomática dos EUA por meio da USAID e empresas estadunidenses estabelecidas em território brasileiro, como informado em seu site.
O co-presidente do Conselho Diretivo do Grupo Mais Unidos é o empresário Gilberto Peralta. Desde janeiro de 2014, ele é presidente e CEO da General Eletric do Brasil. Peralta também faz parte do Conselho Superior Estratégico e do Conselho Superior de Inovação e Competitividade da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP). Além disso, ele é vice-presidente do Conselho de Administração e membro do Comitê de Indústria da Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústrias de Base (ABDIB) e membro do Conselho Estratégico da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (ABIMAQ).
Experiências de Michael J. Eddy na Bolívia e no Sri Lanka
Na Bolívia, após sua primeira passagem entre 2000 e 2002, que coincidiu com o período de instabilidades causadas pela submissão de governos neoliberais ao Banco Mundial, acarretando na Guerra da Água em 2000, Eddy voltou para trabalhar no escritório de La Paz da USAID durante os primeiros anos do governo de Evo Morales.
Ele foi diretor do Escritório para Democracia e Administração Pública da agência a partir de 2008. Neste mesmo ano, o governo boliviano expulsou o embaixador dos Estados Unidos e a DEA (agência antidroga dos EUA), acusando-os de estarem na Bolívia com objetivos políticos e de desestabilização. Em 2013, a própria USAID foi expulsa do país, acusada de ingerência nos assuntos internos da Bolívia durante anos.
Antes de assumir o cargo no Brasil, Michael Eddy foi diretor da USAID no Sri Lanka entre fevereiro e junho de 2015. Ele foi enviado ao país asiático logo após as eleições presidenciais de janeiro, quando o então presidente Mahinda Rajapakse foi derrotado por Maithripala Sirisena, na eleição mais acirrada das últimas décadas no país, segundo a AFP.
O presidente eleito teve 51,28% dos votos, contra 47,58% do derrotado. “Foi uma reviravolta surpreendente, já que Rajapakse, depois de uma década no poder e dois mandatos, era o grande favorito”, noticiou a agência na época. Prontamente, o presidente dos EUA, Barack Obama, e o secretário de Estado, John Kerry, parabenizaram o resultado das eleições.
A USAID considerou esses acontecimentos no Sri Lanka “positivos e pró-democráticos”, motivo que levou à cooperação da agência por meio de Eddy, para dar assistência governamental e desenvolver o crescimento econômico do país. Ele foi um dos intermediadores da visita de John Kerry à nação asiática, a primeira de um secretário de Estado dos EUA em 40 anos àquele país.
Ao contrário das outras missões de Michael Eddy pelo mundo, sua estadia como diretor da USAID no Sri Lanka e nas Maldivas durou muito pouco tempo. Apenas quatro meses se passaram até que ele fosse retirado de sua missão para ser encaminhado ao Brasil.
O Diário Liberdade entrou em contato com Eddy por e-mail, perguntando o orçamento destinado à USAID no Brasil e se ele mantém alguma relação com autoridades do governo brasileiro. Ele disse que está fora de seu escritório e não comentou o assunto. Sua assessoria respondeu que esses questionamentos devem ser realizados através do Escritório da Lei de Liberdade de Informação (FOIA, na sigla em inglês). No entanto, até o fechamento desta reportagem, o Diário Liberdade não recebeu nenhuma resposta através do FOIA.
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Fonte: Diário Liberdade.