Por Amílcar Neves.
Divulgada há cinco meses, saiu em junho o resultado de uma pesquisa intitulada O Sonho Brasileiro. Diga-se antes de qualquer coisa, a bem da verdade, que dela não participou qualquer órgão governamental nem empresa pública de espécie alguma. Como se define a realizadora do trabalho, “a Box 1824 é uma empresa de pesquisa global focada no mapeamento de tendências”. Patrocinaram o minucioso e abrangente estudo um dos maiores bancos privados nacionais e uma das maiores empresas multinacionais de refrigerantes. O apoio foi dado pela maior rede de televisão do Brasil.
Considerando o despreparo do jovem brasileiro, o descaso que a juventude nutre pela sua comunidade, a sua falta de comprometimento com as grandes causas e os grandes problemas nacionais, o desprezo pelos estudos e pelo trabalho, a sua mórbida malandragem, o seu apego às drogas e a tudo o que é errado, a sua histórica aversão à leitura (nossos bisavós já diziam, de seus filhos, que “é uma lástima, uma perdição, mas a nova geração já não lê tanto quanto a nossa”) e a futilidade a que todo jovem se entrega, a pergunta que se faz aqui é: conhecemos de fato o Brasil? Sabemos mesmo o que pensa e faz a nossa gente?
A pesquisa saiu em campo para ouvir e procurar entender quem é esse povo 1824 que anda por aí; essa gente que compõe “a atual geração 18-24 anos (faixa etária mais influente na criação e disseminação de novas ideias)”; esses 26 milhões de brasileiros das classes A, B, C, D e E. É uma pena, uma lástima, mas não dá para resumir aqui as 384 belíssimas páginas da publicação. Mas dá para informar que está tudo disponível na Internet, no endereço www.osonhobrasileiro.com.br.
E dá para adiantar que 89% dos jovens têm orgulho de ser brasileiro (11% têm vergonha), 76% acreditam que o Brasil está mudando para melhor (9%, para pior) e 87% acham que o Brasil é importante no mundo hoje (3%: pouco importante; 1%: nada importante). Melhor: eles, esses jovens conectados, ligados ao mundo, estão promovendo uma fantástica mudança no país através do que chamam de minirrevoluções, a revolução dentro do possível, do que lhes está ao alcance das mãos – a começar pelo comportamento ético nas atitudes cotidianas e pelo envolvimento em projetos coletivos de melhorias comunitárias. Gente de altíssimo nível de participação e de aguda consciência sobre o que quer para si, para os outros e para o Brasil.
A publicação da pesquisa tem outra virtude: as belas fotos que a ilustram, reais, são de gente como gente é, sem maquiagem, holofote, roupa de marca nem photoshop, captadas nos cenários onde a vida se desenrola; são imagens nítidas da nossa gente brasileira.
Conhecemos de fato o Brasil? Sabemos o que pensam e fazem esses jovens ou só nos movemos por preconceitos e pseudoverdades estratificadas? Imaginaremos talvez que – felizmente! – todos os discursos sobre religião, família, política e dinheiro estão sendo pacífica e inexoravelmente reescritos?
Se conhecêssemos, soubéssemos ou imaginássemos algo disso tudo, não debocharíamos, por conta agora de um câncer, de um presidente que foi escolhido duas vezes pelo povo em eleições democráticas e saiu do poder, apesar das imperfeições que ficaram pelo caminho, sob aplausos majoritários dos brasileiros e do mundo, e que ajudou a trazer o Brasil de volta ao lugar em que estávamos no fim dos anos 1950 e início dos 1960 quando, por medo do povo e para manter privilégios, um golpe de Estado nos atrasou por mais de meio século.
A título de informação, apenas: as empresas referidas na crônica abaixo são o Itaú, a Pepsi e a Globo.
Amílcar Neves é escritor com oito livros de ficção publicados.
Em 26.09.2011 foi eleito em primeiro turno, com 24 votos de 29 possíveis, para a Cadeira nº 32 da Academia Catarinense de Letras.
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