Quais os cálculos de Trump ao atacar a Síria

Por João Paulo Charleaux.

O presidente dos EUA, Donald Trump, ordenou um ataque com uma bateria de 59 mísseis Tomahawk lançados a partir de navios de guerra americanos estacionados no Mediterrâneo contra a base aérea de Al Shayrat, na Síria, nesta quinta-feira (6). Essa foi a primeira vez que forças americanas conduziram operações militares contra forças do governo do presidente sírio, Bashar al-Assad. Desde 2011, ele enfrenta a oposição de grupos rebeldes armados no que se transformou numa guerra civil. Assad tem o apoio da Rússia e do Irã, mas é criticado pelos EUA, França e Reino Unido. O ataque americano ocorreu após um incidente não esclarecido ter provocado a morte por asfixia e exposição a substâncias químicas na região noroeste da Síria. Os americanos acusam forças sírias de terem conduzido um ataque com armas químicas na região.

Os russos culpam grupos rebeldes. A ação ordenada por Trump tem pelo menos três significados políticos, além do evidente impacto humanitário num país exposto às consequências de um conflito armado que já se arrasta há seis anos: Negação do multilateralismo O Conselho de Segurança das Nações Unidas é o único órgão do mundo capaz de autorizar uma ação militar legal contra um de seus Estados-membros – e a Síria é um deles. O órgão, no entanto, estava bloqueado pelo veto russo a qualquer iniciativa que ameaçasse a sobrevivência do atual governo sírio. No Conselho de Segurança, as resoluções só podem ser adotadas se não houver veto de um de seus cinco membros permanentes: EUA, Rússia, China, França e Reino Unido. Ao passar por cima do grupo, Trump repete o gesto de outro presidente americano, o também republicano George W. Bush que, em 2003, agiu unilateralmente contra o então presidente do Iraque Saddam Hussein, que acabaria deposto e morto. Rompimento da inação A ação militar de Trump tem um forte significado interno. Ele rompeu o imobilismo da administração anterior, do democrata Barack Obama, que durante todo seu mandato, fez ameaças contra Assad, mas não as cumpriu.

Assim como ocorrido nesta terça-feira (4), Assad também foi acusado de usar armas químicas contra a população civil em ocasiões anteriores, durante a administração Obama. O então presidente dos EUA declarou que o líder sírio havia ultrapassado todos os limites, mas a reação ficou restrita à retórica. Ao agir agora, Trump reforça a imagem de presidente durão, que, além de falar, é capaz de agir. A atitude vem recobrada de maior força moral ao se dar logo após a divulgação de imagens chocantes de crianças morrendo por exposição a agentes químicos. Ligação de Trump com os russos Trump estava acuado por diversas acusações de que ele mesmo e diversos membros do primeiro escalão de seu governo mantiveram ligações indevidas com agentes russos.

O secretário de Justiça, Jeff Sessions, admitiu ter se reunido duas vezes durante a campanha presidencial de 2016 com o embaixador da Rússia no EUA, Sergei Kislyak. A informação havia sido negada por Sessions na sabatina pela qual ele passou no Senado americano, antes de ser aprovado para o cargo. “Não mantive comunicações com os russos”, é o que ele havia dito aos senadores anteriormente. No dia 10 de janeiro, o site americano de notícias BuzzFeed publicou um texto com o seguinte título: “Estes relatórios alegam que Trump tem profunda ligação com a Rússia.” O material trazia 35 páginas do original de um documento até então apócrifo, mas que em seguida passou a ser atribuído a um espião privado que havia recolhido informações comprometedoras a respeito de Trump, sob encomenda de rivais democratas.

A maior revelação do espião, de acordo com o BuzzFeed, era a suposta existência de vídeos com conteúdo sexual envolvendo Trump. Esses vídeos, além de outras informações comprometedoras, estariam em poder dos russos que, sob ameaça de divulgá-los, mantinham o presidente eleito sob controle. Com a ordem de atacar alvos de Assad, contrariando interesses russos, Trump pode afastar, mesmo que momentaneamente, as críticas dos que o acusam de manter ligações indevidas com Moscou.

Fonte: Nexo. 

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